Reparação da escravidão não pode ficar debaixo do tapete, diz presidente de Portugal

Rebelo de Sousa responde a críticas e afirma que país precisa liderar processo sob risco de perder diálogo com ex-colônias

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Ana Bacelar Begonha
Público

O presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, rebateu críticas à fala em que defendeu a necessidade do país de reparar crimes da escravidão e voltou a argumentar em favor da medida neste sábado (27). Rebelo afirmou que o país tem a obrigação de liderar o processo de reparação às ex-colônias, sob pena de perder capacidade de diálogo com elas.

"Não podemos meter isto debaixo do tapete ou dentro da gaveta. Temos a obrigação de pilotar, de liderar este processo. Senão vai-nos acontecer o que aconteceu a outros países que, tendo sido potências coloniais, perderam a capacidade de diálogo e entendimento com as ex-colônias e estão a ser convidados a sair, a bem ou a mal, dos países onde ainda têm alguma presença", afirmou, na inauguração do Museu Nacional da Resistência e da Liberdade, em Peniche.

O presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, durante sessão solene no Parlamento do país por ocasião dos 50 anos da Revolução dos Cravos
O presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, durante sessão solene no Parlamento do país por ocasião dos 50 anos da Revolução dos Cravos - Filipe Amorim - 25.abr.24/AFP

Rebelo procurava enquadrar as declarações que fez esta semana em um jantar com correspondentes estrangeiros, em que considerou que Portugal tem de assumir "total responsabilidade" pelos crimes coloniais cometidos e de "pagar os custos". Segundo o presidente, perguntaram-lhe se Portugal devia pedir desculpa pelo colonialismo e o próprio respondeu que não por considerar que essa é "uma solução fácil para o problema: pede-se desculpa e nunca mais se fala nisso".

Ao contrário, ele defende que o país deve assumir "a responsabilidade por aquilo que de mau e de bom houve no império". Algo que, diz o presidente, significa "retirar consequências várias": primeiro, em relação aos massacres e, em segundo lugar, à questão dos bens patrimoniais. Sobre esse assunto, o presidente defendeu que é preciso saber se há patrimônio trazido dos países colonizados.

Rebelo voltou ainda a defender a importância da reparação às ex-colônias e explicou que esse processo não passa necessariamente por pagar uma indenização. "Mas a reparação é pagar uma indenização? Não, é uma realidade que já começou há 50 anos", afirmou, dando como exemplo o perdão de dívida aos países colonizados ou o estatuto de mobilidade dos cidadãos nacionais dos países de língua oficial portuguesa.

"Toda a nossa cooperação foi, durante 50 anos, além de uma construção do presente e do futuro, uma forma de reparação", disse Rebelo, referindo-se ainda a linhas de crédito, financiamentos ou programas especiais estabelecidos com as ex-colônias.

Para o presidente, é verdade que Portugal deixou infraestruturas nos países explorados, "mas em contrapartida também retiramos proveitos de lá ao longo de muito tempo, dependendo da colônia". Razão pela qual é "importante assumir a nossa história, o nosso império colonial, no bom e no mau, o peso que tem na nossa projeção no mundo os milhões que falam português fora de Portugal", argumentou.

Rebelo admitiu que as soluções de reparação não podem ser homogêneas, tendo de ser, nas palavras dele, encontradas de acordo com as circunstâncias. E defende que também outros problemas têm de ser resolvidos, como o dos antigos combatentes, área em que diz ter o "compromisso de ir mais longe", ou a situação dos portugueses espoliados que "em poucos casos" tiveram reparação. "É uma questão que, sendo sensível, tem de ser assumida porque faz parte da nossa história, porque não a podemos omitir."

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