À frente da UE, Orbán pede cessar-fogo a Zelenski em Kiev

Húngaro é visto como o líder europeu mais próximo de Putin e busca agenda própria

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São Paulo

Em seu segundo dia à frente da presidência rotativa de seis meses da UE (União Europeia), o premiê húngaro, Viktor Orbán, fez uma visita surpresa a Kiev nesta terça (2) e pediu que os ucranianos considerem um cessar-fogo para tentar iniciar negociações de paz com a Rússia.

Foi a primeira vez que Orbán, o líder europeu mais próximo de Vladimir Putin, visitou seu vizinho invadido pelos russos em fevereiro de 2022. Ele conversou com Volodimir Zelenski. "Pedi ao presidente que considere a possibilidade de um cessar-fogo rapidamente, limitado no tempo para permitir acelerar negociações", afirmou a repórteres.

Homem de terno e gravata escuros, de cabelo branco, cumprimenta outro mais jovem, de barba escura e usando malha preta. Ao fundo, as bandeiras amarela e azul da Ucrânia e verde, vermelha e branca da Hungria
Orbán e Zelenski se cumprimentam após entrevista coletiva em Kiev - Valentin Ogirenko/Reuters

"O objetivo da Presidência húngara é contribuir para solucionar os desafios à frente da UE. Por isso minha primeira viagem foi a Kiev", disse o premiê.

Zelenski não comentou a oferta. Ele falou da ideia de uma segunda conferência internacional de paz, apesar de a primeira, realizada mês passado na Suíça, ter sido basicamente um encontro de seus apoiadores —e mesmo assim, sem consenso sobre termos do documento final. Mas lembrou que a Hungria assinou o papel.

Antes do fim do encontro, o Kremlin minimizou a viagem. "Ele está apenas cumprindo seu papel", disse o porta-voz Dmitri Peskov acerca de Orbán e negando ter havido qualquer contato entre o húngaro e Putin antes da visita.

A declaração visa a servir de vacina para os políticos ucranianos e europeus que verão na iniciativa de Orbán uma missão dada por Putin. O que ele e Zelenski conversaram em privado, em torno de uma mesa pequena de madeira, não se sabe ainda.

Também em junho, o russo desenhou pela primeira vez de forma clara seus termos para encerrar o conflito. Putin quer abocanhar as quatro regiões que anexou ilegalmente, além de manter a Crimeia absorvida em 2014. Pede também a desmilitarização e neutralidade ucranianas.

Por óbvio, Kiev e seus aliados ocidentais disseram não, mas não passou despercebido o movimento de abertura pública do Kremlin. Se pede 10, Putin pode se contentar com 5, nesse cálculo, embora todos temam que qualquer acomodação fará ele buscar 20 na rodada seguinte.

O movimento de Orbán deverá gerar crítica na Europa, já temerosa de seu papel à frente da UE. A presidência temporária do bloco de 27 países não tem poderes reais, mas serve usualmente para quem a ocupa fazer avançar a agenda particular de sua nação.

E a agenda húngara é de confronto: Budapeste é crítica do poder que considera excessivo do bloco, sofre sanções internas por ter tolhido a liberdade do Judiciário local sob Orbán e tem no premiê um adversário da ajuda a Kiev na guerra, o que considera "uma missão suicida" que pode levar à Terceira Guerra Mundial.

Pesam nesse contexto os laços econômicos fortes com Moscou, aumentando seus negócios energéticos na área nuclear e de gás, na mão inversa das sanções ocidentais. Orbán é contra a ampliação do veto à compra de gás para a variante liquefeita do produto, alternativa à qual o Kremlin tem recorrido.

Ainda assim, Orbán é conhecido por se fazer de difícil. Ele demorou mais de um ano para levantar o veto à entrada da Suécia na Otan (aliança militar ocidental), recebendo no caminho caças do país nórdico. Para abrir caminho ao novo secretário-geral do clube, o holandês Mark Rutte, exigiu que ele se comprometesse a não forçar Budapeste a aderir ao apoio a Kiev.

Ele e Zelenski também falaram sobre a minoria étnica húngara na Ucrânia (0,3% dos 44 milhões de habitantes pré-guerra). É um tema espinhoso, e uma das justificativas de Putin para a guerra, embora as minorias russas somassem quase 20% da população ucraniana antes da invasão.

Ainda nesta terça, o serviço secreto ucraniano afirmou ter prendido quatro pessoas acusadas de planejar um golpe contra Zelenski a partir de uma revolta em Kiev, que ocorreria no dia 30 de junho. O órgão não acusou diretamente a Rússia pela suposta movimentação, mas disse que o objetivo iria favorecer Moscou, algo óbvio. Duas pessoas ainda estão detidas e podem pegar até dez anos de cadeia.

Do lado russo, Putin irá encontrar-se com o líder chinês Xi Jinping e com o presidente turco, Recep Tayyp Erdogan, nesta quarta (3). Eles participarão de encontro da Organização de Cooperação de Xangai, um ente liderado por Pequim e Moscou que reúne outros sete países, com a Turquia como convidada, em Astana (Cazaquistão).

Xi é o principal aliado de Putin, e Erdogan mantém boa relação com o russo, apesar de ser integrante da Otan.

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