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Tiago Cavalcanti

Contradições da bitcoin e blockchain

Ainda limitada, moeda digital tem espaço para crescer

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Moedas simbolizando bitcoins - Benoit Tessier - 8.dez.17/Reuters
Tiago Cavalcanti

Uma atribuição essencial da economia de mercado é sua necessidade de realizar pagamentos. Tivemos várias mudanças de como esses pagamentos se realizaram, que se confundem com o nosso desenvolvimento econômico e tecnológico: escambo, moedas, notas, cheques, cartão de crédito e de débito são alguns exemplos de como esses pagamentos se processaram ao longo de nossa história.

Há séculos que o Estado emite moedas e notas, que podem ser guardadas ou usadas pelos cidadãos em diferentes transações. O principal mecanismo capaz de permitir às pessoas aceitarem o dinheiro como meio de troca é a confiança que as demais terão ao receber tal forma de pagamento em suas próximas transações.

Da mesma forma, o fato de os agentes econômicos receberem cheques assinados por outros indivíduos está na confiança de que os bancos aceitarão como depósitos bancários esses mesmos cheques emitidos por bancos diversos. Pagamentos com cartão de crédito ou débito seguem a mesma lógica, tendo como base a confiança dos agentes econômicos nesses meios de pagamentos.

Existem diferentes opiniões sobre as moedas digitais. Alguns afirmam que, por não terem lastro, essas moedas são difíceis de serem precificadas e que seus preços refletem uma bolha de expectativas. Corroborando essa visão está o fato, por exemplo, de a bitcoin ter atualmente um valor cinco vezes menor do observado um ano atrás.

As moedas digitais, contudo, têm algumas propriedades que podem gerar valor intrínseco. Uma dessas características é permitir pagamentos anônimos, o que é importante no mercado informal. O papel-moeda também permite o anonimato nas transações, mas algumas sociedades, como a Suécia, caminham para uma economia sem dinheiro físico. O anonimato permite também escapar da falta de confiança na moeda legal e no sistema bancário local, o que explica o sucesso da bitcoin na Venezuela.

Entretanto a forma descentralizada como a bitcoin foi criada --não se sabe a real identidade de Satoshi Nakamoto, criador da bitcoin-- gera flutuações absurdas no seu valor, criando assim uma barreira para o uso como estoque de valor. Mas isso não implica que uma nova moeda digital global não possa surgir com algum lastro e menor flutuação no seu preço.

Uma inovação importante que a bitcoin tem como base é a ideia de blockchain, uma lista crescente de registros (chamados de blocks) permanentes de transações. De forma até contraditória, essa tecnologia permite manter registros de transações de forma segura e robusta, evitando fraudes e evasão; e podem ser importantes para o monitoramento das transações e em decisões judiciais.

Assim, no contexto atual, as moedas digitais parecem não passar de uma bolha de expectativas, mas as mudanças tecnológicas associadas com a bitcoin têm potencial para revolucionar os sistemas de pagamentos e os registros de transações e de direito de propriedade.

Tiago Cavalcanti

Professor da Faculdade de Economia da Universidade de Cambridge (Reino Unido) e da FGV-SP

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