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Maria Inês Fornazaro

Ouvidoria da Polícia é uma conquista da sociedade democrática

Extinção do órgão em SP, como propõe deputado, seria um retrocesso inimaginável

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Primeiramente, pensei ter me equivocado ao ler que um projeto de lei complementar pretendia acabar com a Ouvidoria da Polícia do estado de São Paulo.

Reli as matérias e, infelizmente, o tal projeto havia sido publicado no Diário Oficial da Assembleia Legislativa paulista no dia 12 de abril, sexta-feira.

Procurei, então, o argumento. Seria para “reduzir gastos públicos” e, segundo o autor do projeto, “corrigir injustiça imposta unicamente para desfavorecer o trabalho das polícias do estado”.

Na verdade, se há algo pelo qual uma ouvidoria trabalha, é pela justiça às pessoas que a ela recorrem e aos que são alvo das reclamações. O ouvidor (a) recebe demandas da população e averigua, com as áreas vinculadas ao caso, se elas procedem ou não. Se procederem, cobra respostas plausíveis e adequadas às manifestações. Assim que as recebes, envia-as às pessoas que recorreram à ouvidoria.

Que injustiça haveria neste passo a passo? Vejamos o que diz a Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º: todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Ou seja, o cidadão que se queixa de determinado aspecto da segurança pública tem os mesmos direitos que os policiais civis e militares.

O papel do ouvidor é identificar se houve transgressão à lei ou às normas nas ações policiais, a fim de satisfazer outro direito constitucional estabelecido no artigo 5º, XIV: é assegurado a todos o acesso à informação.

A Ouvidoria da Polícia é um instrumento, portanto, constitucional, que amplia a transparência e, desculpem-me o trocadilho, dá mais segurança aos cidadãos em relação às práticas policiais.

Policiais militares durante ação no centro paulistano
Policiais militares durante ação no centro paulistano - Danilo Verpa - 27.mar.14/Folhapress

Não acredito que tal projeto prospere, pois seria um retrocesso inimaginável. Mas o simples fato de alguém ter pensado nisso já é preocupante, ainda mais quando se trata de um parlamentar eleito pelo voto popular. A improvável exclusão da ouvidoria não eliminaria insatisfações, mas apenas fecharia este canal de manifestação às pessoas que votam, pagam impostos e mantêm o estado de São Paulo em pleno funcionamento.

É lamentável, também, que outras organizações públicas e privadas tenham excluído a ouvidoria de seus organogramas, provavelmente por não compreender o que seja um verdadeiro estado democrático de direito e de fato.

Lembro que as ouvidorias chegaram ao Brasil em meio ao processo de redemocratização da década de 1980. A primeira ouvidoria pública foi criada pela prefeitura de Curitiba, em 1986. Na área privada, por exemplo, temos o caso da Folha, que há 30 anos tem estrutura de ombudsman a serviço da sociedade.

A Ouvidoria da Polícia de São Paulo é pioneira na área de segurança pública a e completou 24 anos em janeiro. Serviu de modelo, portanto, a iniciativas semelhantes. Hoje, há ouvidorias de polícia em 24 estados do país.

Deveríamos nos orgulhar desse pioneirismo e fortalecê-la sempre. Tenho certeza, portanto, de que o infeliz projeto que pretende encerrar as atividades deste canal de comunicação com a cidadania será relegado aos escaninhos em que estão ideias similares.

Maria Inês Fornazaro

Presidente da Associação Brasileira de Ouvidores/Ombudsman (ABO Nacional)

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