Descrição de chapéu

Os R$ 200 fora do lugar

Nova cédula gera ruído em cenário de declínio do dinheiro em espécie

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

O lobo-guará, que estampará nota de R$ 200
O lobo-guará, que estampará nota de R$ 200 - BBC News/Ricardo Boulhosa

O Plano Real legou ao país o período de inflação mais baixa desde os anos 1940 —mas não exatamente uma inflação baixa.

Ao longo de 26 anos, de julho de 1994 a junho último, o IPCA, índice de preços ao consumidor que serve de referência para a política monetária, acumulou alta de 521%. Dito de outro modo, registrou média anual de 7,28%, ainda elevada para os padrões internacionais.

Trata-se de variação mais do que suficiente para desfazer as percepções iniciais do valor da moeda. Custa crer, por exemplo, que a maior cédula do real, a de R$ 100, tinha quando passou a circular poder de compra correspondente a mais de R$ 600 em valores atuais.

Diante dos números, não deveria causar maior estranheza a recente decisão do Banco Central de lançar uma cédula de R$ 200. A cifra, afinal, está longe de representar algum ponto fora da curva da experiência brasileira ou global.

Pelas cotações desta quinta-feira (6), a nova nota valerá menos que as de US$ 50, US$ 100, € 50, € 100 e € 200, para citar apenas as divisas mais importantes.

Ademais, o Brasil e o mundo vivem um momento de maior demanda por papel-moeda, devido às incertezas decorrentes da Covid-19. Aqui, o volume de cédulas e moedas em poder da população saltou de R$ 214 bilhões para R$ 270 bilhões entre março e junho.

Entretanto o que seria uma simples medida administrativa em outros tempos não deixa de produzir certo ruído no contexto atual.

Em primeiro lugar, porque o lançamento de notas remete à era da inflação descontrolada, o que absolutamente não é o caso agora. Pelo contrário, este 2020 fechará o quadriênio de preços mais comportados desde o advento do real.

Mais importante, existe ampla concordância em torno das vantagens de substituir o dinheiro em espécie por cartões ou mesmo aparelhos celulares. A despeito do aumento circunstancial da procura por cédulas, a tendência de longo prazo é claramente a oposta em países ricos e emergentes.

Fora a praticidade e a redução de custos, a opção por transações eletrônicas registradas dificulta sobremaneira a corrupção, a lavagem de dinheiro, a evasão fiscal e outras práticas criminosas.

Esse entendimento precisa prevalecer, e as autoridades, a começar pelo BC, devem trabalhar pela universalização dos meios de pagamento digitais. Enquanto isso, a nota cinzenta de R$ 200 ilustrada pelo lobo-guará permanecerá uma curiosidade extemporânea.

editoriais@grupofolha.com.br

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.