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Marcos Benassi

Nunca mais parei de 'Folhear'

Tornei-me um 'leitor-comentarista', o que valeu um convite para este espaço

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Marcos Benassi

Psicólogo e mestre em psicologia escolar, é leitor da Folha há mais de 40 anos

Minha história com a Folha é coisa de velho: não só porque há pouco virei a primeira metade do meu centenário, mas porque ela começou com a minha avó, dona Luísa Ribeiro Pompeu de Toledo, velhíssima na minha visão infantil: octogenária, para um pirralho de 7 ou 8 anos, tinha a idade das pirâmides.
Morávamos numa casinha com uma varanda envidraçada, que dava para a rua. A vó lá se sentava logo cedo pra traçar o jornal, entremeando textos com dedos de prosa com os passantes e vizinhos. E eu, neto querido, tinha o privilégio de sentar no chão, abrir Folhetins e Ilustradas e o que mais quisesse, ser ouvido e perguntar, compartilhar das prosas. Deu no que deu.

Nunca mais parei de "Folhear". Porque leitura, lá em casa, era comida: o jornal, o arroz com feijão; a livraiada, os petiscos e doces. Meus pais, professores do ensino médio, davam o maior valor à leitura: cresci numa casa cheia de livros. Nunca proibiram livro algum, e eu nunca me fiz de rogado, devorei o que pude. E, na casa, seguindo a dieta do jornal: por anos a fio, o exercício era manter a coesão e a ordem dos cadernos, "a mode" compartilhá-lo com pai, mãe e as duas irmãs mais velhas, que foram saindo para tocar a vida.

Dos 25 aos 30, quando fui morar por conta, também assinei em minha própria casa. Depois, já juntado com minha esposa, mantivemos, no início, a assinatura do jornal. Mas mudamos para uma roça, onde o exemplar demorava a chegar: a partir do quarto ano de casório, acabou a era do papel, ficou só o digital. Usávamos o UOL por conta da internet —que à época demandava um provedor de acesso e e-mail—, e então tínhamos disponíveis os textos eletrônicos: paramos de "assinar a Folha". De lá para cá, o texto elétrico tomou completamente o espaço —sei não se chegam a duas dúzias os jornais que comprei em papel nos últimos 15 anos...

E agora, a partir de 2018, veio minha última etapa do longo amor com o jornal, a de "leitor-comentarista". Na época da campanha eleitoral, inconformado com o monte de mentiras e o descaramento bolsonarista e de seus arredores (e roedores) políticos, vi-me compelido a assinar novamente a Folha para poder interagir com meus pares. No começo, eu até estava imbuído de um sentido de utilidade pública: a conversa com os indecisos. Até mesmo com decididos visava o desmonte do monte de falácias bozofrênicas, da falsidade crônica que veio a se mostrar essencial na eleição do estrupício. Depois, da subida do Bozo ao trono até o presente, a perspectiva de franco combate: a barbárie não pode passar em branco.

E, de quebra, arrumei uma comunidade com a qual interagir digitalmente. Como não uso "feicibúqui", "tuíter", "instagram" ou coisa alguma, filiei-me à ágora da Folha. Conversando com gente bem diversa, a maioria madura e articulada, ganhei o deleite da conversa cotidiana. Houve até um interregno de alguns meses sem assinatura, mas voltei: senti saudade das prosas.

Percebi quando dois "compadres digitais", Ayer Campos e Adonay Evans, com suas considerações sabidas e agudas, fizeram-me falta. E pouco importava que um deles fosse muito mais antipetista que eu: era sempre estimulante. Reassinei e não larguei mais o osso.

Tanto relevo tomou essa tarefa "paranoticiosa" no meu dia a dia que recebi o convite de contar uma "estorinha" —a minha história com a Folha. Taí. Valeu, seu Frias, vovó manda lembranças!

TENDÊNCIAS / DEBATES
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