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Farsa populista

Presidente do México ataca órgão eleitoral, como Bolsonaro faz à sua maneira

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O presidente mexicano, Andrés Manuel López Obrador - Francisco Cañedo/Xinhua

À primeira vista, os mais de 90% de votos conquistados pelo presidente do México, Andrés Manuel López Obrador, no referendo que decidiu sobre a continuidade de seu governo, poderiam parecer uma inequívoca e impressionante demonstração de força do mandatário, no poder desde 2018.

Inserida na Constituição mexicana em 2019 e realizada agora pela primeira vez, tal consulta popular constava das promessas de AMLO, acrônimo pelo qual o presidente esquerdista é conhecido.

Basta uma segunda olhadela, porém, para que o êxito seja matizado e as coisas ganhem sua real dimensão. Com participação pífia de cerca de 18% do eleitorado, o comparecimento ficou bastante longe do mínimo de 40% para que a votação fosse considerada válida.

Trata-se de resultado que não chega a surpreender. Boicotado pela oposição e visto como desnecessário pela maioria dos mexicanos, o referendo se converteu num exercício vazio de autopromoção presidencial, voltado à militância de seu partido, o Morena.

O expediente, conduzido de modo populista, não é novo, e tem sido usado pelo líder mexicano nas mais diversas ocasiões, como para fortalecer suas decisões ou contestar derrotas no Congresso. Com resultados favoráveis a AMLO e presença baixíssima, as votações acabam servindo apenas para criar a imagem de um governante que ouve o povo e é guiado por ele.

Se se limitasse a isso, Obrador talvez pudesse ser considerado só mais um nome na longa história de líderes pitorescos do continente. Mas o mexicano parece ter outros —e mais perigosos— planos.

Com o fracassado referendo, AMLO deu novo fôlego à sua campanha para desacreditar o Instituto Nacional Eleitoral, o órgão incumbido de organizar as votações do país e zelar por sua lisura.

O presidente culpou o instituto pela baixa participação popular, acusando-o de, em conluio com a oposição, ter reduzido a divulgação do pleito. Como se não bastasse, promete reforma eleitoral e mudança da composição do órgão.

Ataques dessa natureza fazem parte da estratégia do neoautoritarismo em voga em algumas partes do mundo, na qual os candidatos a caudilho buscam carcomer a democracia por dentro, espalhando suspeitas sobre instituições independentes. É o que faz, à sua maneira, Jair Bolsonaro (PL) no Brasil.

editoriais@grupofolha.com.br

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