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Réu confesso

STF julga atuação do governo na área ambiental, onde devastar é meta declarada

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A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal - Pedro Ladeira/ Folhapress

O governo de Jair Bolsonaro (PL) está sentado num metafórico banco dos réus do Supremo Tribunal Federal (STF), que decidirá se a política antiambiental do Planalto se inscreve nos limites aceitáveis de uma atuação estatal incompetente ou se extrapola essa fronteira para se tornar inconstitucional.

Não é difícil entender como se chegou a essa situação, em que o governo Bolsonaro responde a 6 de 7 ações reunidas sob o apelido de "pacote verde" —o outro caso remete a resolução de 2018, na administração de Michel Temer (MDB).

Desde o primeiro dia, o atual presidente deixou claro o quanto despreza não só os órgãos de proteção ambiental, mas a própria ideia de preservar fauna e flora.

Só isso explica por que nomeou Ricardo Salles para a pasta do Meio Ambiente, um ministro que se segurou tempo demais no cargo e que deixou como herança exatamente o que seu chefe esperava: a sabotagem dos órgãos de fiscalização e controle sob seu comando.

Sua saída pouco alterou a prática de desmantelar o aparelho estatal destinado a defender o ambiente. A destruição continuou de acordo com o mesmo roteiro que Salles, orgulhoso de seus malefícios, enunciou na famigerada reunião ministerial de 22 de abril de 2020.

Ali estava, sem meias palavras, a confissão escancarada de que a frente de devastação registrada sob Bolsonaro nada teve de fortuita. Era, por incrível que pareça, uma política pública deliberada.

Pois muito do que o atual governo fez ou deixou de fazer na seara ambiental será agora avaliado no STF à luz da Constituição.

Inúmeros partidos políticos que assinam as ações argumentam que o país atingiu, nessa frente, o chamado estado de coisas inconstitucional, isto é, uma situação em que as falhas são estruturais e resultam em violação grave e contínua de direitos fundamentais.

Dois artigos da Constituição tratam expressamente do meio ambiente, e ambos deixam claro que o dever do poder público é defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

De modo que a ministra Cármen Lúcia não enfrentou dificuldades ao elaborar seu voto em sentido contrário aos interesses do Planalto. Ciente da importância desse julgamento, ela fez questão de compor uma argumentação sólida, com coerência interna e claro embasamento na doutrina jurídica e nas decisões recentes do tribunal.

Não menos importante, Cármen Lúcia restringiu-se a determinar que o governo federal apresente um plano de ação capaz de atender o mandamento constitucional, sem pretender que a corte o faça no lugar de Jair Bolsonaro.

Esse é o papel do STF. Deve zelar pelo cumprimento da Constituição, mas sem invadir a competência dos outros Poderes.

editoriais@grupofolha.com.br

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