Dirigido pelo realizador negro Gabriel Martins, com um elenco e equipe técnica majoritariamente negros, "Marte Um" é o escolhido do Brasil para concorrer a uma vaga na disputa dos indicados a melhor filme internacional na 95ª edição do Oscar, em 12 de março.

Mas tal conquista, que aumentou exponencialmente os holofotes sobre essa produção mineira—e que pode inscrevê-la definitivamente na história se for selecionada, e bem-sucedida, entre as candidatas—, não é a mais importante. O enorme feito de "Marte Um", entre as muitas camadas de interpretação que permite, é sustentar em todas elas a firme defesa do direito de sonhar.

Financiada por um edital federal de ação afirmativa de baixo orçamento, lançado em 2016, a trama acompanha o cotidiano de um lar mineiro de contados recursos.

Nele, o garoto Deivinho é a esperança financeira da família devido aos seus dotes futebolísticos, mas o menino perde o sono mesmo é se imaginando como parte de uma missão espacial (que dá título ao filme).
Conflitos, cumplicidade, transgressões, alegria e dor perpassam existências de frágil equilíbrio, à mercê de desigualdades diárias, naturalizadas e desafiadas, e onde a permanente necessidade de se equilibrar na corda bamba se mistura a uma indomável luta por dias melhores.

"Personagens negros podem ser complexos e ocupar um lugar que historicamente foi condicionado a eles de forma marginal. Podemos, sim, ser também o centro da questão", disse Martins em conversa com a Folha, enquanto prepara a campanha de difusão do filme nos EUA.

"Quando uma pessoa negra está em tela, ela não está representando somente um grupo e falando só para aquele grupo, essa pessoa pode falar para todo o mundo."

Também do sonho de que isso deixe de ser excepcional no cinema brasileiro vive "Marte Um", em busca ativa de uma nova odisseia no espaço do imaginário nacional.