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réveillon

Ano Novo

Esse ano, daqui do outro lado do mundo, a entrada foi silenciosa

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Becky S. Korich

Advogada, escritora e dramaturga

Nada combinou mais com o meu início de ano. Não vesti roupa branca, não pulei ondinhas, não vi fogos, não escolhi a cor do lingerie, não teve espumante à meia noite.

Esse ano, daqui do outro lado do mundo, no hemisfério norte, a entrada foi silenciosa. Estrelas no lugar dos fogos de artifício; a festa foi interna, íntima, só nós e o universo.

Cheguei em 2023 algumas horas antes do Brasil e, já com um pé no novo ano, dei o spoiler para meus amigos brasileiros: o cenário é lindo. Pelo menos de onde estou, no meio do nada - literalmente, num deserto. Daqui só vejo areia e céu.

E dentro desse nada cabe tudo. Dentro desse silêncio tudo pode ser ouvido junto com o barulho do vento que não se cansa de se renovar. Assim como pode caber tudo no ano que nasce, que por enquanto é também um quase nada, um estranho que a gente ainda não conhece, mas sabe que vai acabar ficando íntimo.

Tudo pode acontecer nesse mistério chamado futuro, nesse espaço em branco a ser preenchido por nós. Muitos planos que não couberam nos anos passados, e também coisas que a gente nem imagina e nunca planejou: pessoas novas, ideias novas, decepções, surpresas. Dá um medinho, mas a vontade de pegar o pincel e colorir os dias é maior. Parafraseando Gil, mistérios sempre haverão de ser pintados por aí.

E vem aquele ímpeto sem explicação que surge em todos os inícios, quando a gente tem a permissão para sonhar mais alto. Vem a vontade de começar logo a matemática inexata dos 365, com arranjos e combinações infinitas, sabendo que cada dia é o próprio recomeço, tanto faz se no primeiro ou se no último dia do ano.

E somos invadidos por uma vontade boba de acreditar que tudo vai dar certo: a dieta que ainda não começou, mas também a fome que não terminou; o aumento merecido, mas também o trabalho digno para os que não têm a quem pedir aumento; o sol, mas também a chuva, que irriga e dá frutos; o bom governo, o bom juízo, para que caiba também a diversão.

Do deserto daqui do outro lado do mundo, não precisei gritar no primeiro ponteiro do ano, não precisei desejar, a festa e os rojões eram internos. E esse espaço que eu enxergo, que parece vazio, me diz que o que a gente deixar entrar vai caber nessa moldura chamada tempo. Feliz 365 dias.

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