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O que a Folha pensa Acordo de Paris

A balança do clima

Emergência ambiental só será enfrentada com contabilidade transparente de perdas

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Lago seco na cidade de Ajmer (Índia) - Himanshu Sharma/AFP

O Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC, em inglês), órgão criado pela ONU em 1988, já lançou seis relatórios sobre aquecimento global e cenários de crise. Desde o primeiro, o alarme soado tornou-se cada vez mais estridente —e não foi ouvido.

Nesta semana, veio a público o sexto documento. Se em 1990 se falava na mera capacidade humana de aumentar a temperatura média do planeta, a retórica escalou para afirmar ser "inequívoco que a influência humana aqueceu a atmosfera, o oceano e a terra".

Antes, relatórios do IPCC projetavam danos futuros por prováveis eventos extremos, como enchentes, secas, ciclones e incêndios. Agora, trata-se do aumento comprovado desses desastres.

O texto se esforça por destacar boas notícias, realçando que ainda há tempo para cumprir a meta do Acordo de Paris (2015) de manter o aquecimento abaixo de 2ºC. Para tanto, seria imperioso cortar em ao menos 48%, até 2030, as emissões globais de gases do efeito estufa.

Houve queda nos custos de energia solar (85%), eólica (55%) e baterias de lítio (85%). A implantação de energia fotovoltaica aumentou mais de dez vezes, e a venda de veículos elétricos, mais de cem.

Há tecnologias para fazer a transição energética e aposentar combustíveis fósseis, decerto, mas mesmo esse ritmo acelerado de adoção fica aquém do necessário, após três décadas de procrastinação. Em paralelo, emissões de carbono nunca retrocederam, fora na pandemia, e em 2022 voltaram a crescer.

A dificuldade reside no fato de que as perdas de bens e infraestrutura são percebidas como eventos futuros, ou decorrentes de desastres tidos como naturais. Não são contabilizadas como prejuízos diretos da mudança do clima, o que daria mais clareza sobre a exposição a riscos de empresas e setores inteiros, imprimindo talvez maior senso de urgência a governos.

A empresa global de resseguros Swiss Re estima que os danos econômicos climáticos montaram a US$ 257 bilhões em 2022 (R$ 1,45 trilhão), dos quais só US$ 125 bilhões estavam cobertos por seguros.

Quando entrarem na balança as perdas em vidas, saúde e capital natural (florestas, recursos hídricos, solos férteis, ar respirável etc.), quem sabe autoridades reguladoras começarão a levantar barreiras e retirar subsídios dos setores mais dependentes de combustíveis fósseis. Pela marcha atual, porém, poderá ser demasiado tarde.

editoriais@grupofolha.com

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