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Mário Sérgio Lima e Beatriz Rey

Apetite parlamentar sobre Orçamento precisa de freio

Ideias mirabolantes se avolumam a cada ciclo

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Mario Sérgio Lima

Analista sênior da consultoria de risco político Medley Advisors

Beatriz Rey

Doutora em ciência política, é pesquisadora sênior do Núcleo de Estudos sobre o Congresso (Necon), da Uerj, e da Fundação POPVOX (EUA)

Os vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à lei orçamentária deste ano, que devem abrir uma nova frente de disputa com o Congresso Nacional, poderiam ser o pontapé inicial para uma discussão que deveria envolver a sociedade civil para o resgate do equilíbrio na relação entre o Legislativo e o Executivo.

Enquanto a cobertura da imprensa ainda foca no vaivém do embate sobre o veto, o pecado original está na aprovação, em 2015 e em 2019, das emendas orçamentárias impositivas e igualitárias. A partir de então, o Executivo se viu obrigado a empenhar todas as emendas individuais e coletivas de maneira equitativa entre os parlamentares. As mudanças abriram as portas para tentativas cada vez mais ousadas dos congressistas de se apropriar do planejamento e da execução de políticas públicas. A cada ciclo orçamentário, deputados e senadores apresentam novas ideias mirabolantes para ganhar mais poder orçamentário.

O presidente Lula, junto aos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara, Arthur Lira, durante sua cerimônia de diplomação - Ueslei Marcelino - 12.dez.22/Reuters - REUTERS

Na votação da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) deste ano, a ousadia parlamentar foi ainda maior ao tentar estabelecer um calendário de execução obrigatório das emendas. É meritório discutir um ordenamento ao toma lá dá cá estabelecido na dinâmica do relacionamento entre Executivo e Legislativo.

O governo eleva o volume de liberação das emendas nas negociações para a aprovação de pautas de interesse no Congresso, e não é razoável acreditar que os prefeitos, na ponta, tenham de estar sujeitos a essa incerteza ou ao timing de Brasília.

Contudo, o calendário de execução acaba dando mais poder sobre partes do Orçamento a deputados específicos (como o relator da LDO) e à cúpula do Congresso do que ao presidente da República. Sem contar que, na impossibilidade de o governo definir prioridades na alocação das emendas e com um Orçamento cujo espaço para despesas discricionárias gira em torno de 7% do total, a execução da política pública na ponta fica prejudicada, favorecendo apenas as lideranças locais com acesso aos legisladores de turno.

Muito se fala de o Congresso impor alguns limites ao ativismo judicial do Supremo Tribunal Federal e, apesar de os projetos ora apresentados e votados trazerem mais fumaça do que calor, a democracia ganha quando o Legislativo se fortalece. Por exemplo, a literatura em ciência política aponta que os parlamentares da coalizão em geral corrigem e aperfeiçoam proposições de lei do Executivo via emendas.

O Congresso também foi responsável pela adoção de inúmeras políticas públicas importantes. Em 2020, os parlamentares constitucionalizaram o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que financia a educação básica e pública país afora. No mesmo ano, aprovaram o Marco Legal do Saneamento Básico, política pública gestada dentro do Congresso que regulou possíveis investimentos do setor privado visando melhorar o saneamento básico.

Contudo, o ganho de poder do Legislativo não pode superar o limite do equilíbrio entre os Poderes. É salutar que o Congresso possa legislar mais por sua própria iniciativa do que ser apenas um carimbador da agenda do governo, assim como precisa estar altivo para servir seu papel no sistema de freios e contrapesos. Mas seu avanço excessivo e desordenado na área orçamentária precisa ser tolhido.

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