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Luiz Guilherme Piva

Uma alternativa à desoneração da folha de salários

Cálculo precisa considerar valor agregado e folha de salários formalizada

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Luiz Guilherme Piva

Economista (UFJF), mestre (UFMG) e doutor (USP) em ciência política e autor de “Ladrilhadores e Semeadores” (Editora 34) e “A Miséria da Economia e da Política” (Manole)

Procurar colaborações tributárias nos bolsos dos setores mais ricos, mesmo para as causas mais justas (financiar uma parte da Previdência, por exemplo), é como fagulha no palheiro. Sua reação negativa —talvez porque já foram avisados de que não vão mesmo para o reino dos céus— incendeia o ambiente e às vezes vira fogo de Planalto acima. É o caso da desoneração da contribuição dos empregadores sobre a folha de salários, que, pela norma decorrente do artigo 195 da CF, é de 20%.

Todas as tentativas de acabar com a desoneração, que hoje beneficia 17 setores, têm sido rechaçadas sob o argumento de que a alíquota é excessiva e de que a alternativa adotada (de 1,0% a 4,5% sobre a receita bruta) tem incentivado a geração de empregos.

O Ipea, com dados da Pnad Contínua/IBGE, contesta e mostra que os setores desonerados não são os maiores empregadores nem os que mais geraram emprego desde o início da desoneração. Ao contrário, alguns deles são os que mais desempregaram. A participação no total de ocupados que contribuem para a Previdência caiu de 17,9% para 16,2% nos 17 setores. E mais: empresas não desoneradas aumentaram em 6,3% (1,7 milhão) os empregos com carteira assinada; as desoneradas os reduziram em 13% (960 mil). E há a perda de arrecadação anual, que varia, conforme a conta, de R$ 10 bilhões a mais de R$ 20 bilhões.


A última tentativa do governo de compensar a diminuição da arrecadação, com a restrição de compensações de créditos do PIS/Cofins, crepitou na Esplanada, ainda mais com o cerrado tomado pela seca e por alguns piromaníacos.

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Fachada do Edifício Santo Ermelino, sede da Previdência Social em São Paulo - Rafaela Araújo/Folhapress

Não há como negar, porém, que a contribuição do empregador sobre a folha não é o melhor método de arrecadação para a Previdência, ainda mais se considerarmos a geração de empregos formais e as grandes diferenças entre os setores econômicos. É preciso pensar em outras possibilidades. A reforma tributária em curso é boa porque deu centralidade ao valor agregado em lugar de receitas, preços e folhas de pagamento.


Este pode ser o mesmo caminho da contribuição dos empregadores para a Previdência. Uma sugestão é estabelecer sua contribuição previdenciária com base não no tamanho da folha de salários nem no tamanho da receita, mas numa razão (R) entre valor agregado no numerador e folha de salários formalizada no denominador.


Quanto maior o R, maior a alíquota, numa curva discreta, com degraus suaves, a incidir sobre o valor agregado. Com isso, incentiva-se a substituição do emprego informal pelo emprego formal (uma vez que o denominador aumenta, reduzindo o R). A formalização dos empregos aumenta a arrecadação da Previdência advinda da contribuição dos empregados.


E diferenciam-se, na contribuição, os setores intensivos em capital dos intensivos em mão de obra. Há, hoje, setores e segmentos que ganham bilhões com pouquíssima mão de obra, em grande parte informal ou pejotizada, pagando quase nada para a Previdência. Enquanto outros ganham muito menos com enormes folhas de salários (sendo, portanto, geradoras de emprego formal) e contribuem muito mais.


Talvez essa proposta produza reação menos incandescente. E, embora complexa, não parece ser uma alternativa cuja fórmula de cálculo seja tão impossível quanto um dia ver um camelo passando pelo buraco de uma agulha.

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