Fachin inclui Temer em inquérito da Odebrecht na Lava Jato

Presidente passa a ser um dos investigados sobre repasses ao MDB em 2014

Letícia Casado
Brasília


O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no STF (Supremo Tribunal Federal), autorizou a inclusão do presidente Michel Temer como um dos investigados em um inquérito aberto para apurar repasses da Odebrecht ao MDB em 2014.

Foto em perfil do presidente Michel Temer, que passa a ser um dos investigados sobre repasses ao MDB em 2014
O presidente Michel Temer, que passa a ser um dos investigados sobre repasses ao MDB em 2014 - Beto Barata/PR

O caso se refere a um jantar no Palácio do Jaburu em maio daquele ano em que teria sido acertado o repasse ilícito de R$ 10 milhões.  Na época do jantar, Temer era vice-presidente.  

Fachin também prorrogou em 60 dias o prazo para a Polícia Federal fazer diligências necessárias às apurações. A decisão foi assinada na quinta (1º), mas se tornou pública na tarde de sexta (2).

"Defiro o pedido da Procuradora-Geral da República para determinar a inclusão de Michel Miguel Elias Temer Lulia, atual Presidente da República, como investigado nestes autos de Inquérito, sem prejuízo algum das investigações até então realizadas e daquelas que se encontram em curso", escreveu o ministro no despacho.

Já são alvos desse inquérito os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência), ambos do MDB. Na época de abertura da investigação, o então procurador-geral, Rodrigo Janot, entendeu que a Constituição proibia investigar o presidente por supostos crimes anteriores ao mandato.

O ministro Fachin destaca que a investigação aponta supostos fatos no sentido de que integrantes do grupo político liderado por eles teriam recebido propina da Odebrecht em 2014 “como contrapartida ao atendimento de interesses” pela Secretaria de Aviação Civil da Presidência.

O ex-vice presidente de Relações Institucionais da Odebrecht afirmou em delação premiada que Padilha era encarregado de centralizar as arrecadações financeiras do grupo. “Ele teria deixado claro que falava em nome do vice-presidente [Temer] e que utilizaria o peso político dele para obter êxito em suas solicitações”, contou.

Em 2017, quando pediu a abertura de inquérito contra os ministros, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, entendeu que a Constituição proibia investigar o presidente por supostos crimes anteriores ao mandato. 


No entanto, a atual chefe do Ministério Público Federal, Raquel Dodge, faz outra interpretação. Para ela, o presidente pode ser investigado, mas não denunciado no cargo. 

A divergência entre Janot e Dodge se deve à interpretação de um dos trechos do artigo 86 da Constituição, que determina: “O presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”.

Ao pedir para incluir Temer no rol dos investigados, Dodge disse que a medida é necessária para tocar o inquérito e evitar que provas desapareçam ou testemunhas morram. 

Ela citou um caso de 1992, que envolvia o então presidente Fernando Collor. Na ocasião, o ministro Celso de Mello afirmou que “a imunidade constitucional em questão somente incide sobre os atos inerentes” à persecução penal. “Não impede, portanto, que, por iniciativa do Ministério Público, [...] sejam ordenadas e praticadas, na fase pré-processual do procedimento investigatório, diligências de caráter instrutório”.

Thomaz Pereira, professor da Fundação Getulio Vargas Direito Rio, destaca que o ministro Teori Zavascki, morto em 2017, havia tido entendimento semelhante ao apreciar, enquanto relator da Lava Jato, um caso que envolvia Dilma Rousseff. 

Em maio de 2015, Teori decidiu não incluir Dilma em uma investigação por falta de indícios, mas não porque ela ocupava o cargo de presidente. “Não se nega que há entendimento desta Suprema Corte no sentido de que a cláusula de exclusão de responsabilidade [...] não inviabiliza, se for o caso, a instauração de procedimento meramente investigatório”, escreveu Teori.

“Nessa linha de entendimento e não obstante a inibição da propositura da própria ação penal, nada impede, quando for o caso, a instauração de procedimentos investigatórios.” Naquela decisão, Teori também citou o precedente de Collor, usado por Dodge no caso de Temer.

Ao incluir Temer no inquérito da Odebrecht, Fachin teve o mesmo entendimento dos colegas Teori e Celso de Mello, além de Dodge. Para ele, investigar o presidente “não afronta a Carta Magna”.

“Com efeito, a imunidade temporária vertida no texto constitucional se alça a obstar a responsabilização do presidente da República por atos estranhos aos exercícios das funções; mesmo nessa hipótese, [...] caberia proceder a investigação a fim de, por exemplo, evitar dissipação de provas”, escreveu o ministro.

“É importante lembrar que é raro abrir um inquérito contra presidente da República. Só tem uma autoridade no país que pode pedir isso: o PGR, procurador de carreira e nomeado pelo presidente, uma pessoa insuspeita”, destaca Pereira, da FGV. “Quem nomeou a Dodge foi o Temer”, acrescentou.

Temer é alvo de outro inquérito que tramita no STF e apura se houve irregularidade em um decreto da área portuária que beneficiou a empresa Rodrimar, assinado em maio de 2017, quando já comandava o país.
O presidente já foi alvo de duas denúncias feitas pela PGR. A Câmara barrou as acusações, que ficam paradas até ele deixar o cargo. 

 
A assessoria do presidente Temer informa que o Planalto não irá comentar o assunto.

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