Liminar para Lula tem peculiaridades, mas STF já concedeu salvo-conduto antes

Cármen Lúcia disse que julgamento foi interrompido para respeitar os limites físicos dos ministros

Letícia Casado Reynaldo Turollo Jr.
Brasília

A decisão de conceder um salvo-conduto para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em meio ao julgamento do habeas corpus preventivo tem semelhanças com outros casos já analisados pelo plenário do STF (Supremo Tribunal Federal).

Ex-presidente Lula visita propriedade rural de agricultores familiares nesta sexta (23) em Ronda Alta, no RS
Ex-presidente Lula visita propriedade rural de agricultores familiares nesta sexta (23) em Ronda Alta, no RS - Marlene Bergamo/Folhapress

No entanto, a situação de Lula também tem peculiaridades: pedido de habeas corpus preventivo (por alguém que não está preso) cujo julgamento foi suspenso por causa de questões pessoais dos ministros e com o deferimento de uma liminar que vai contra a jurisprudência do tribunal.

Marco Aurélio argumentou que tinha viagem marcada à noite e pediu para Cármen Lúcia suspender a sessão —ele chegou a mostrar o tíquete do voo aos colegas. Em entrevista à rádio Jovem Pan, Cármen Lúcia disse nesta sexta (23) que o julgamento precisou ser interrompido para respeitar os limites físicos dos ministros.

Por 6 a 5, os ministros concederam uma liminar ao petista e destacaram que há precedentes no tribunal para evitar com que a pessoa fique em risco, mas não citaram casos específicos. 

Rosa Weber, Dias Toffoli, Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Celso de Mello votaram pela concessão da liminar. 

Rosa e Gilmar disseram no plenário que o Supremo tem precedentes sobre o tema, mas não deram exemplos. A reportagem procurou os respectivos gabinetes sobre os precedentes mencionados por eles durante a sessão, mas ainda não obteve resposta.

Os que negaram a liminar ao petista afirmaram que não se deve conceder cautelar contra a jurisprudência do tribunal: Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.

Ou seja, se posicionaram contra suspender uma eventual decisão do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) de mandar prender Lula após o julgamento dos embargos de declaração no processo da Lava Jato em que ele foi condenado a 12 anos e um mês de prisão no caso do tríplex do Guarujá.

TRÁFICO DE DROGAS

Em novembro de 2005, o STF concedeu salvo-conduto para uma mulher aguardar em liberdade um julgamento de habeas corpus porque um ministro pediu vista (mais tempo para analisar o caso). 

Os magistrados julgavam um habeas corpus de uma mulher de 68 anos que cumpria pena de três anos em regime fechado por tráfico de drogas por tentar levar “considerável quantidade de cocaína” para a delegacia onde seu filho estava preso. 

Ela tentava junto à corte o direito de substituir a pena privativa de liberdade por uma restritiva de direitos. 

A defesa alegou que ela sofria de problemas no coração, diabetes e hérnia e que, por causa de sua idade, o cumprimento da pena na prisão inviabilizaria tratamento médico.

O pedido já havia sido negado pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e pelo  STJ (Superior Tribunal de Justiça), e a defesa foi ao Supremo.

O caso caiu com Gilmar Mendes, que votou a favor da concessão do habeas corpus. Seu voto foi seguido por três colegas: Eros Grau, Cezar Peluso e Marco Aurélio. Já Joaquim Barbosa, Carlos Velloso e Celso de Mello foram contra.

O placar estava 4 a 3 e o ministro Carlos Britto pediu vista. Os ministros concederam uma liminar para que ela aguardasse em liberdade.

Algumas características diferenciam os casos: a mulher estava presa e, portanto, sem a liminar ela continuaria detida enquanto o julgamento estivesse suspenso, enquanto Lula não tem ordem de prisão expedida contra ele.
 
Além disso, pedidos de vista podem demorar anos para voltar à pauta: no caso em questão, o julgamento foi finalizado apenas em abril de 2007. Já no caso de Lula, o tribunal prevê retomar a análise do habeas corpus em 4 de abril. 

OUTROS CASOS

Em abril de 1984, o plenário do Supremo concedeu, por unanimidade, salvo conduto ao então senador por Goiás Henrique Santillo até o julgamento final de um habeas corpus pedido por sua defesa.

Os advogados informaram ao STF que Santillo fora detido pela extinta Guarnição Mista Policial Militar quando ia de Anápolis (GO) para Brasília, com base em um decreto presidencial que impunha medidas de emergência em áreas de Goiás e do Distrito Federal.

A corte entendeu que o senador só poderia ser detido em flagrante, como diz a Constituição, e, no dia seguinte ao reporte dos advogados, deu o salvo-conduto antes de julgar o mérito do habeas corpus.

Diferentemente do caso de Lula, o salvo-conduto não foi concedido devido a uma interrupção do julgamento do habeas corpus, embora tenha finalidade semelhante —garantir a liberdade até a análise final.

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