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Decisão sobre Lula abala estratégia petista, mas mensagem do STF sobre prisões é dúbia

A controvérsia em torno da jurisprudência do tribunal continuará assombrando os ministros do Supremo

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São Paulo

Ao negar habeas corpus ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o Supremo Tribunal Federal deixou-o mais perto da prisão e enfraqueceu muito a estratégia adotada pelos petistas para tentar romper o cerco da Operação Lava Jato.

Com Lula condenado em duas instâncias do sistema judiciário, pelo juiz Sergio Moro e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, e recursos rejeitados pelas duas mais altas cortes do país, ficou difícil levar adiante as pretensões eleitorais do ex-presidente e desafiar a barreira imposta à sua candidatura pela Lei da Ficha Limpa.

Mesmo os ministros que defenderam o habeas corpus de Lula na quarta-feira (4) o fizeram sem se referir ao caso específico, mas em nome de suas convicções pessoais sobre a controvérsia em torno das prisões de condenados em segunda instância

Ricardo Lewandowski, que é contra o entendimento estabelecido pelo STF sobre o assunto em 2016 e votou a favor do habeas corpus, indicou que considera mal fundamentadas as duas decisões que condenaram Lula, mas foi vago a respeito do assunto.

Luís Roberto Barroso, que votou contra Lula, fez questão de dizer que nem sequer leu essas decisões. Explicou que lhe cabia analisar a legalidade da decisão do Superior Tribunal de Justiça que negou habeas corpus a Lula em março, e não os detalhes do caso em que o ex-presidente foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro.

O Supremo também deu uma resposta incisiva às manifestações do general Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército, que na véspera do julgamento do habeas corpus disparou um tuíte de festim para expressar nas redes sociais seu repúdio à impunidade.

A presidente do STF, Cármen Lúcia, abriu a sessão de quarta observando que a corte tem a missão de zelar pelo respeito à Constituição, num lembrete para o caso de o comandante do Exército ter esquecido o papel de cada instituição. Perto do fim, o decano do tribunal, Celso de Mello, lembrou que o tempo das “intervenções pretorianas” na política já passou.

Apesar disso, a sessão do Supremo contribuiu pouco para fortalecer a corte no papel de árbitro do jogo político que passou a exercer nos últimos anos. Em vez de abraçar o espírito de colegialidade defendido pela ministra Rosa Weber no voto que definiu o resultado do julgamento, os ministros continuaram se comportando como indivíduos preocupados em reafirmar posições pessoais, refratários aos argumentos contrários.

Ao tratar das prisões em segunda instância, o STF deixou uma mensagem dúbia. Ficou claro que a maioria dos integrantes do tribunal é contra o atual entendimento sobre o tema e está disposta a revê-lo quando forem julgadas as duas ações que questionam a jurisprudência estabelecida em 2016. 

A própria Rosa Weber indicou que seu voto seria diferente se essas ações estivessem em discussão. Como se tratava do caso específico de Lula, explicou, ela não se sentiu confortável para contrariar a orientação da corte, apesar de ter sido encorajada a fazê-lo por vários colegas, de maneiras às vezes sutis, às vezes agressivas

Ao reafirmar a jurisprudência a favor das prisões e negar alívio a Lula, o Supremo ficou livre do risco de ser acusado de optar por um casuísmo para beneficiar o líder petista. Como a controvérsia em torno das prisões não foi pacificada, esse risco continuará assombrando os ministros do tribunal.

Quase no fim da sessão, Marco Aurélio Mello, um dos que defendem a revisão da orientação da corte, avisou que continuará tomando decisões em sentido contrário ao da jurisprudência nos habeas corpus que for sorteado para analisar. Ele tem feito isso de maneira sistemática desde 2016, mas suas decisões são derrubadas depois pelos colegas.

Tudo indica que Cármen Lúcia continuará firme na decisão de não colocar em julgamento as ações que podem levar a uma nova guinada na orientação do STF, o que adia a solução do problema para depois de setembro, quando ela será substituída pelo ministro Dias Toffoli na presidência do tribunal.

A poucas semanas da eleição presidencial, poderá ser tarde demais para resolver os problemas de Lula e do PT, mas não será tarde demais para alargar o horizonte do presidente Michel Temer e de outros políticos que estão sob investigação.

Alvo de dois inquéritos conduzidos pelo STF, o presidente perderá o foro especial quando deixar o poder, em janeiro de 2019. É possível que, antes disso, seja alvo de nova denúncia da Procuradoria-Geral da República, no caso em que suas relações com empresas do setor portuário são investigadas.

Se deixarem para resolver a questão das prisões em segunda instância às vésperas da disputa eleitoral mais imprevisível da história recente, os ministros do Supremo só contribuirão para engrossar o coro dos que veem casuísmos e favorecimentos políticos em suas decisões. 

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