Descrição de chapéu

Como deveria ter sido o artigo de Lula ao NYT

Lamento quaisquer erros que eu ou meu partido possamos ter cometido

Brian Winter

"Dezesseis anos atrás, o Brasil estava em crise; seu futuro era incerto. Os mercados estavam despencando porque temiam que eu fosse eleito presidente. Mas minhas posições —no passado radicais— haviam evoluído e eu tinha o sonho de transformar o Brasil em um dos países mais prósperos e democráticos do planeta.

Depois que triunfei nas urnas, minha Presidência foi no geral bem-sucedida. Reduzimos a pobreza a menos da metade, em apenas oito anos. O salário mínimo subiu em 50%. As receitas dos bancos e outras empresas dispararam. Ainda que haja quem o negue agora, a verdade é que quase todos os brasileiros prosperaram. Deixei o cargo com aprovação de quase 90%.

E então esse progresso foi interrompido. Como a maioria dos países, tivemos dificuldades para responder à crise financeira de 2007-8. A sucessora que escolhi, Dilma Rousseff, piorou as coisas. Ela não só era terrível na política como sabotou o 'tripé econômico' que trabalhei com tanto afinco para manter, lançando o Brasil a uma profunda recessão. Por sua gestão enganosa de nossas contas orçamentárias, o Congresso votou pelo impeachment de Rousseff em 2016. Embora isso fosse legal sob a nossa constituição, acredito que tenha solapado a estabilidade democrática, sem nada fazer para resolver nossos principais males.

Havia também o problema da corrupção. Embora meus advogados tenham me aconselhado a não comentar sobre as acusações específicas contra mim, posso afirmar que a corrupção é endêmica no Brasil desde que este foi colonizado, há mais de 500 anos. Assumimos com metas ambiciosas —a saber— reduzir o terrível legado de miséria e desigualdade em nosso país. Atingir esses objetivos requeria trabalhar com o sistema existente em Brasília. Não foi um sistema que eu tenha criado; dezenas de políticos e executivos foram indiciados ou encarcerados por suas ações.

Lamento quaisquer erros que eu ou meu partido possamos ter cometido.

Ainda assim, peço à comunidade internacional e aos meus compatriotas brasileiros que nos julguem pela totalidade de nossas ações. Foi nosso Partido dos Trabalhadores que aprovou muitas das reformas legais —a exemplo da lei de 2013 que expandiu o uso de delações premiadas— que tornaram possível detectar casos recentes de corrupção. Meu governo não foi uma história de sucesso apenas na economia. Também registrou sucesso incontestável quanto ao desflorestamento, educação, justiça racial e mais.

O governo que nos sucedeu também sofre de extensa corrupção —o que inclui acusações contra o presidente Michel Temer, que pode ir a julgamento depois que deixar o posto. Enquanto isso, muitos dos indicadores quanto aos quais havíamos feito progresso —mortalidade infantil, desemprego e fome— estão em recuo, sob a gestão dele. Isso é muito doloroso para mim.

Em outubro, o Brasil enfrenta uma escolha grave. Porque minha condenação me desqualifica como candidato à presidência, sob uma lei que assinei quando presidente, o líder nas pesquisas agora é Jair Bolsonaro, um capitão reformado do exército que insulta as mulheres, as minorias e os pobres. Acredito que ele nos levará de volta a uma era em que só a elite colhia os frutos do crescimento econômico. Seu plano de elevar o número de juízes do Supremo Tribunal Federal reflete um desrespeito mais amplo pelas instituições que sucessivos presidentes brasileiros trabalharam para construir desde 1985.

Nosso partido em breve nomeará um de nossos líderes mais jovens e mais moderados, um ex-prefeito de São Paulo, para me substituir como candidato. Mas a coisa mais importante é que o próximo presidente do Brasil, quem quer que seja, retome o progresso igualitário e democrático de que nosso país desfrutava não muito tempo atrás. Que os brasileiros decidam. Tenho fé em que a justiça prevalecerá, mas o tempo joga contra a democracia."

Brian Winter é editor-chefe da revista Americas Quarterly

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