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O pequeno Jair teria adorado 'Aparelho Sexual e Cia.', diz autora de livro citado por Bolsonaro

Obra quer educar jovens e protegê-los de abuso, segundo francesa

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São Paulo

Se para Jair Bolsonaro (PSL-RJ) o livro infantojuvenil "Aparelho Sexual e Cia." é uma "porta aberta para a pedofilia" e "uma coletânea de absurdos", para sua coautora, a francesa Hélène Bruller, o título não é sobre sexualidade, e sim sobre "o medo de se tornar adulto".

"O assunto não é dizer às crianças que a sexualidade lhes diz respeito hoje, mas dizer a elas que a sexualidade fará parte de suas vidas adultas e que aprendê-la de uma maneira serena é a melhor forma de vivê-la de um jeito saudável", afirmou Bruller à Folha

A autora francesa Hélène Bruller em sessão de autógrafos no Salão do Livro de Paris, em 2008
A autora francesa Hélène Bruller em sessão de autógrafos no Salão do Livro de Paris, em 2008 - Georges Seguin/Wikimedia Commons

O presidenciável tentou exibir o título na TV, durante sua entrevista ao Jornal Nacional na terça-feira (28). Apresentou a publicação como parte do "kit gay", distribuído pelo governo federal em bibliotecas escolares. O Ministério da Educação afirma que jamais encomendou o título. O Ministério da Cultura adquiriu 28 exemplares para bibliotecas públicas, não para escolas.

Bruller escreveu os textos de "Aparelho Sexual e Cia.", que foi ilustrado pelo quadrinista Zep e editado no Brasil pela Companhia das Letras. 

 

A sra. sabia da recepção do livro do Brasil ou sobre o processo eleitoral no país?
 

Descobri hoje. Tenho muito orgulho de ter sido editada no Brasil. O resto é resultado do sofrimento humano. Pessoas como o senhor Bolsonaro têm uma imensa frustração e um grande sofrimento que os empurra a destruir aqueles que encontraram o equilíbrio, um pouco de felicidade. Para um homem que, onde quer que vá, que não se deve falar de sexualidade... Ele só fala disso! Se há um obcecado nessa história, é ele.
 

Bolsonaro e seus apoiadores criticam a uso como material didático do livro, que foi comprado pelo governo para ser distribuído em bibliotecas públicas. Eles afirmam que o livro é uma "porta aberta à pedofilia" e que se trata de uma reunião de "absurdos que incitam todas as crianças a se interessar por sexo". Como responde às críticas?

Acho que dentro dele há um garotinho, o pequeno Jair, que teria adorado que seus pais tivessem lhe dado de presente "Aparelho Sexual e Cia", em vez gritar com ele com o rosto deformado e com baba no canto da boca: "Jair! Se você se masturbar, vai para o inferno!".

Por que a sra. acredita que haja políticos e pessoas do público em geral que criticam no livro nesses termos?

Um livro só tem detratores quando ele desperta interesse. Se meu livro provoca tanto a ira dos extremistas —o que considero pessoalmente muito inquietante—, significa que ele é bem-sucedido.

Qual era o seu objetivo ao escrever o livro?

É o livro que eu queria ter quando eu era pequena. Não faltam no mundo respostas sobre a sexualidade e, infelizmente, com a internet e a magistral abertura da informação, as crianças têm acesso também à pornografia. Esse livro queria lhes dizer que a sexualidade que eles viverão um dia pode ser bela e saudável, em oposição à pornografia. Que ela [sexualidade] está ligada intimamente ao amor, que amar o outro é o caminho para uma sexualidade sem estresse, e que para amar o outro é preciso começar amando a si mesmo, respeitando-se, para se fazer respeitar.

Acho que informar os jovens permite que eles se protejam melhor de abusos diversos. Acredito que as pessoas que desejam manter a juventude na ignorância o fazem para melhor controlá-la, submetê-la. É muito inquietante. Não posso imaginar que o senhor Bolsonaro seja eleito. Quais são as motivações para eleger uma pessoa como ele, há sempre uma dúvida que ele seja um louco perigoso. E nessa dúvida, é sempre melhor votar em um candidato menos inquietante. O motor dessa pessoa é a violência. Francamente, quem quer um chefe violento para sua nação?

Como o livro foi recebido na Europa? Na França, a obra inspirou uma exposição infantil sobre sexualidade em 2007. Houve problemas com pais ou escolas?

O livro foi proibido aos menores de 18 anos em Valais, um cantão [estado] católico da Suíça. Evidentemente, essa medida teve como efeito imediato de lançar todos os jovens menores de 18 nas livrarias dos cantões vizinhos. Talvez eu devesse agradecer Valais por essa promoção involuntária do meu livro.

Eu também deveria ser igualmente grata aos extremistas religiosos que, em duas ocasiões, tentaram fazer com que fosse censurada a exposição na Cité des Sciences [em Paris], uma técnica de marketing muito eficaz que fez as vendas de ingressos duplicarem.

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