Novo PGR troca afagos com Bolsonaro, e presidente fala em amor à primeira vista

Augusto Aras foi indicado por Bolsonaro para comandar o Ministério Público Federal nos próximos dois anos

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Brasília

O novo procurador-geral da República, Augusto Aras, 60, trocou elogios nesta quarta-feira (2) com o presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), que o nomeou. Os afagos ocorreram durante solenidade de posse de Aras na sede da Procuradoria-Geral da República, em Brasília. 

Uma das atribuições do PGR é investigar e denunciar políticos com foro especial, incluindo o presidente da República.

O presidente Jair Bolsonaro cumprimenta o procurador-geral da República, Augusto Aras
O presidente Jair Bolsonaro e o procurador-geral da República, Augusto Aras - Adriano Machado/Reuters

Nesta quarta-feira, Aras prometeu um combate intransigente à criminalidade, falou de desenvolvimento econômico (uma de suas bandeiras durante a campanha para a PGR) e mencionou a defesa das minorias, tema caro aos colegas de Ministério Público.

“A sensibilidade e a experiência política de vossa excelência [Bolsonaro] sugerem, na ordem de prioridade das ações do Ministério Público, um enfrentamento intransigente à corrupção”, disse Aras.

“Cabe-me, por isso, aproveitando o acervo de nossos princípios e regras, aliado ao excelente quadro de procuradores desta instituição, fazer cumprir, senhor presidente, sua expectativa de que esta PGR seja transformada num organismo capaz de ser um dos melhores instrumentos de desenvolvimento, apto a contribuir para a economia e o combate à criminalidade.”

No discurso de Aras também não faltaram referências a valores cristãos. Ele se declara católico e conservador e, durante a disputa pelo cargo, comprometeu-se com uma carta de intenções elaborada por juristas evangélicos. “Não concebemos um Ministério Público contrário à nossa cultura judaico-cristã, omisso na defesa das nossas riquezas e da nossa gente”, afirmou.

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Augusto Aras, nomeado por Bolsonaro para o cargo de procurador-geral da República - Pedro Ladeira/Folhapress

O governo Bolsonaro compareceu em peso à cerimônia. Pelo menos 12 ministros participaram, entre eles Sergio Moro (Justiça), Onyx Lorenzoni (Casa Civil) e Marcelo Álvaro Antônio (Turismo), suspeito de ter patrocinado um esquema de candidaturas laranjas do PSL, em caso revelado pela Folha.

Os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também marcaram presença, assim como os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli, presidente da corte, Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski.

Moro foi citado no discurso de Aras como alguém que será sempre lembrado por sua coragem na condução da Lava Jato, operação que, segundo o procurador-geral, expôs as mazelas de um sistema de governança que vigora há séculos.

“O juiz Sergio Moro, ministro da Justiça aqui presente, outros magistrados do Rio, de São Paulo e de Brasília e procuradores de vários estados sempre serão lembrados pela coragem com que enfrentaram suas missões”, disse o procurador-geral.

“Expresso minha total confiança na boa condução dos destinos da nossa pátria”, finalizou Aras, dirigindo-se a Bolsonaro e aos ministros do governo.

O presidente, por sua vez, empregou mais uma vez uma de suas metáforas sobre namoro para dizer que teve “um amor à primeira vista” por Aras e voltou a comparar o procurador-geral à peça da rainha em um jogo de xadrez.

“Eu confesso, Aras, que foi, respeitosamente, um amor à primeira vista. Depois dessa gravata verde e amarela dele, só faltou ressaltar 'Selva'”, disse o presidente, em referência a uma saudação militar.

Ainda em tom de brincadeira, Bolsonaro disse que, na comparação com o jogo de xadrez, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, seria a torre, o presidente do STF, Dias Toffoli, seria o cavalo —“no bom sentido”— e os ministros do governo seriam os peões.

“A independência que as peças têm de ter para poder trabalhar é a garantia do sucesso no cumprimento da missão”, afirmou o presidente.

Ele aproveitou o discurso para fazer um pedido ao Ministério Público. Solicitou que, antes de acionarem a Justiça contra o Executivo, promotores e procuradores conversem com integrantes do governo para apontar eventuais erros administrativos, evitando ações judiciais.

“É importante investigar, mas, muitas vezes que nós estivermos em um caminho não muito certo, e muitas vezes estamos fazendo bem-intencionados, nos procure para que possamos corrigir. Corrigir é melhor do que uma possível sanção lá na frente. Todos nós erramos”, disse.

Natural de Salvador, Aras é doutor em direito constitucional pela PUC-SP (2005) e mestre em direito econômico pela UFBA (Universidade Federal da Bahia, 2000), onde foi professor. Hoje leciona na UnB (Universidade de Brasília).

Subprocurador-geral, último estágio da carreira, Aras ingressou no Ministério Público Federal em 1987. Atuou nas câmaras de matéria constitucional e de matéria penal e até recentemente coordenou a 3ª câmara (matéria econômica e do consumidor).

Também foi membro do Conselho Superior do MPF, procurador regional eleitoral na Bahia, de 1991 a 1993, e representante da Procuradoria no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), de 2008 a 2010.

Aras se lançou oficialmente à corrida pela PGR em abril deste ano, quando, em entrevista à Folha, foi o primeiro candidato a admitir publicamente que disputava o cargo por fora da lista tríplice —o que lhe rendeu críticas de colegas, que veem na eleição interna uma forma de garantir a independência da instituição em relação do Poder Executivo.

Bolsonaro desprezou a lista tríplice e escolheu Aras rompendo uma tradição que durava 16 anos, apesar de não ser uma imposição legal.

Pela primeira vez em anos a ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), que realizou a eleição interna que foi ignorada, não vai organizar a festa de posse do novo procurador-geral.

A associação contribuiu financeiramente para a festa, que será realizada na noite desta quarta-feira em um clube de Brasília, mas a organização ficou sob responsabilidade da associação dos servidores do Ministério Público Federal.

O que faz o PGR

É o chefe do Ministério Público da União (que inclui Ministério Público Federal, Ministério Público Militar, Ministério Público do Trabalho e Ministério Público do Distrito Federal e Territórios). Representa o MPF junto ao STF e ao STJ e tem atribuições administrativas ligadas às outras esferas do MPU.

PRINCIPAIS TEMAS DA GESTÃO ARAS

Inquérito das fake news A antecessora de Aras, Raquel Dodge, já pediu o arquivamento da investigação instaurada em março pelo presidente do STF, Dias Toffoli, por discordar da condução do caso pelo Supremo. O objeto da apuração não é totalmente conhecido, pois o caso está em sigilo e nem a PGR teve acesso. Há a possibilidade de que venha a atingir membros do MPF

Mensagens da Lava Jato Os diálogos entre procuradores da operação divulgados pelo site The Intercept Brasil e outros veículos de imprensa, como a Folha, também devem elevar a pressão sobre o novo PGR. Ministros do STF já cobram providências da chefia da instituição sobre a força-tarefa de Curitiba, especialmente o coordenador, Deltan Dallagnol

Projetos e decretos do governo Decretos e projetos de lei de interesse do governo Bolsonaro vão com frequência para o STF, o que deve acontecer, por exemplo, com normas que flexibilizem porte e posse de armas. Direitos fundamentais e as questões ambiental e indígena estão na pauta de julgamentos da corte na segunda metade deste semestre, quando o novo procurador-geral já tiver assumido

Caso Flávio Bolsonaro A investigação sobre o senador do PSL-RJ, filho mais velho do presidente da República, será outro teste. O STF deve discutir em novembro a decisão de Toffoli que suspendeu, temporariamente, o inquérito sobre Flávio no Ministério Público do Rio de Janeiro. A decisão terá impacto em inúmeras investigações, pois definirá como poderão ser usadas as informações produzidas sem autorização judicial por órgãos como a Receita e o Coaf (atual Unidade de Inteligência Financeira)

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