TJ de SP mudou argumento ao beneficiar Paulo Preto, suposto operador do PSDB

Pedido de bloqueio de bens, feito pelo Ministério Público de SP, também atingiria filhas e ex-mulher de suspeito

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

O Tribunal de Justiça de São Paulo, por meio de uma câmara interna de desembargadores, usou argumentos inversos de outras recentes decisões em temas semelhantes para negar o bloqueio de bens de Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, ex-diretor da Dersa (estatal paulista de rodovias) e suspeito de ser operador do PSDB no estado.

Paulo Vieira de Souza, mais conhecido como Paulo Preto
Paulo Vieira de Souza, mais conhecido como Paulo Preto - Marivaldo Oliveira/Código19/Folhapress

Quem liderou o argumento que beneficiou Paulo Preto foi o desembargador Sidney Romano dos Reis, relator de um recurso apresentado pelo Ministério Público de São Paulo que pedia o bloqueio e a quebra de sigilo bancário de Paulo Preto, de sua ex-mulher, de duas filhas e de uma empresa que pertence aos quatro. 

No pedido da Promotoria, não havia a quantidade de valores a serem bloqueados.

Na 6ª Câmara de Direito Público do TJ, Reis votou contra o bloqueio e foi seguido pelos outros dois membros do grupo. Entre as suas justificativas, o magistrado afirmou que não existiam elementos que apontavam suposta dilapidação de patrimônio. Em outros processos, porém, ele afirmou que esses elementos não eram necessários para que o bloqueio de bens fosse determinado.

Em sua fundamentação a favor de Paulo Preto, Reis afirmou que medidas como o bloqueio bens têm que ser aplicadas “com parcimônia, sendo necessária a subsistência de elementos indicativos de dilapidação de patrimônio por parte dos réus”.

“Não é o caso dos autos", acrescentou o desembargador. "Ora, a indisponibilidade de bens não tem cunho compulsório, cuidando-se, a bem da verdade de medida excepcional, a qual exige a presença bem demonstrada do fumus boni juris [quando há indícios de crimes] e do periculum in mora [decisão urgente].”

A decisão sobre Paulo Preto foi publicada em 25 de novembro. No entanto, em ao menos outras três decisões no mesmo mês, publicadas antes e depois da que julgou o caso do ex-diretor da Dersa, o desembargador e essa mesma câmara do TJ tiveram entendimentos diferentes.

Uma delas é de 12 de novembro, a respeito de um caso do município de Iguape, e as outras duas do dia 27, relativos a casos que tramitam em Carapicuíba e na capital.

Nesses três casos, a primeira instância decidiu pelo bloqueio de bens dos envolvidos, e as defesas recorreram. Quando os casos chegaram ao Tribunal de Justiça, Reis e os demais desembargadores mantiveram os bloqueios de bens, total ou parcialmente. 

Ao justificar a manutenção desses bloqueios, Reis refutou os argumentos das defesas que sustentavam que o bloqueio não era possível, já que "não houve prova de que os réus estejam dilapidando seus bens". Isso porque, segundo ele, "tal demonstração in concreto não tem sido exigida pelos tribunais superiores”.

“Com efeito, em se tratando de erário público, de nítido interesse coletivo, há de se ter cautela redobrada para sua proteção, não se mostrando excessivo o deferimento do pedido de indisponibilidade de bens."

Procurado, o desembargador Reis disse que não poderia se manifestar por causa de recomendação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e da Lei Orgânica da Magistratura, segundo a qual é vetado “manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças”.

O pedido de bloqueio de bens de Paulo Preto e de sua família foi feito pelo promotor Ricardo Manuel Castro no âmbito de dois inquéritos civis. Em março, o bloqueio foi negado em primeira instância, pela juíza Maria Fernanda Rodovalho, da 16ª Vara da Fazenda Pública. A Promotoria recorreu.

O primeiro inquérito civil apura relatos da delação da Odebrecht, que citam supostos pagamentos de propina sobre contratos do Rodoanel que seriam destinados às campanhas dos tucanos José Serra à Presidência e Aloysio Nunes Ferreira ao Senado —ambos sempre negaram ter cometido qualquer irregularidade.

O segundo inquérito é relativo a pagamento de propina pela empreiteira Andrade Gutierrez.

O promotor justifica os pedidos de quebra de sigilo e bloqueio porque, segundo ele, a empresa criada por Paulo Preto e sua ex-mulher teria como objetivo dificultar a recuperação dos recursos desviados pelo ex-diretor.

Também diz que precisa ter acesso às operações financeiras da família de Paulo Preto para “verificação da possibilidade de terem sido usadas como meio para desvio de recursos públicos ou recebimento de vantagens ilícitas”.

Ao negar o bloqueio, o desembargador Reis também disse que não havia elementos seguros para acolher o pedido feito pelo promotor. Segundo o magistrado, não foram mensurados eventuais prejuízos ao erário ou o suposto enriquecimento ilícito das pessoas citadas. 

Além disso, o desembargador afirma que o bloqueio atingiria pessoas que não são investigadas em inquéritos civis —no caso, os familiares de Paulo Vieira de Souza.

Paulo Preto está preso no Paraná preventivamente (sem tempo definido) desde fevereiro, quando foi deflagrada a 60ª fase da Lava Jato. A Procuradoria o acusa de ter operado propina para a Odebrecht e de ter movimentado ao menos R$ 130 milhões em contas na Suíça, de 2007 a 2017.

Ele é condenado criminalmente, em primeira instância, em duas ações da Lava Jato na Justiça Federal de São Paulo. Em fevereiro, foi condenado a 27 anos por fraude. No início de março, a 145 anos, por formação de quadrilha, peculato (desvio de dinheiro público) e inserção de dados falsos em sistema público de informação. Paulo Preto tem dito que não cometeu irregularidades.

Bens da empresa formada pela família já foram bloqueados em outra decisão, da Justiça Federal, de junho deste ano. Nela, o juiz federal Diego Paes Moreira afirmou que há indícios de que a sociedade "tenha sido constituída pelo réu para blindar seu patrimônio”.

A defesa das filhas e ex-mulher de Paulo, representada pela advogada Nara Nishizawa, diz que o Ministério Público de São Paulo não encontrou elementos que comprovassem recursos recebidos pelo ex-diretor e criou uma “fantasiosa tese", sem "qualquer prova ou até mesmo indício” de que sua família tivesse aderido às supostas condutas dele.

Também diz que o fato de elas terem algum tipo de relação com o investigado não pode servir de fundamento para quebra de sigilo bancário ou bloqueio de bens.

A defesa de Paulo Vieira de Souza em processos cíveis não foi localizada.

 
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.