Maia dita ritmo e já indica 2020 com parlamentarismo branco fortalecido na Câmara

Em apenas duas semanas, presidente da Câmara mostra que manterá protagonismo sobre pauta econômica

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Brasília

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), iniciou o segundo ano legislativo sem dar trégua para o governo Jair Bolsonaro, demonstrando que a toada de 2020 deve ser de fortalecimento do parlamentarismo branco que marcou o ano passado.

Em apenas duas semanas, o deputado mostrou que manterá o protagonismo sobre a pauta econômica, capitaneando as discussões sobre as reformas tributária e administrativa.

Maia também vem deixando claro que tem poder para dificultar a vida do governo em algumas situações. 

É o caso da desavença com o ministro Abraham Weintraub (Educação), que resultou na perda de validade da medida provisória que trata da carteirinha digital estudantil, com a qual o governo gastou R$ 2,5 milhões em publicidade.

As alfinetadas de Maia ao governo começaram já no discurso durante a sessão solene de abertura dos trabalhos. Nele, Maia frisou a independência do Parlamento. "O Congresso está passando a ocupar um lugar que é seu por direito, como epicentro do debate e da negociação", disse.

O presidente da Câmara também reafirmou a importância do Orçamento impositivo, mudança constitucional aprovada em 2019 que engessou o poder do Executivo sobre os gastos do governo.

"Pela primeira vez, temos um instrumento que garante que as decisões do Congresso nortearão de fato o emprego dos recursos públicos", afirmou.

No Planalto, a avaliação é a de que Bolsonaro ensaiou uma aproximação com Maia. Um desses acenos foi a decisão de colocar Rogério Marinho, ex-secretário especial de Previdência e Trabalho, à frente do Ministério do Desenvolvimento Regional.

Mas a movimentação pode ter perdido força com a nomeação de mais um militar sem traquejo político para um posto de articulação no Planalto, como é a Casa Civil.

A escolha de Walter Braga Netto incomodou os parlamentares, que estão ameaçando travar pautas de interesse do governo como retaliação. 

Para eles, a sinalização que o governo passa é que "nenhum político presta". Em resposta, eles cogitam bloquear as propostas do Planalto para lembrar que o Executivo precisa do Legislativo para governar. 

Além disso, a pauta econômica, a que mais avançou no ano passado e que tem dois pilares importantes a serem votados neste ano --as reformas tributária e administrativa ---, deve ficar prejudicada em razão das declarações controversas do ministro Paulo Guedes (Economia) na última semana.

Em sete dias, o ministro conseguiu provocar reações inflamadas ao chamar funcionários públicos de parasitas e ao dizer que o dólar alto é bom porque “[era] todo mundo indo para a Disneylândia, empregada doméstica indo para a Disneylândia, uma festa danada”.

Depois do desgaste, dizem os parlamentares, a chance de uma reforma administrativa ser aprovada só existe se o texto for costurado por Maia. 

O presidente da Câmara vem demonstrando irritação com a imobilidade do governo em relação às duas reformas. "Não tenho culpa se o governo ainda não mandou a reforma administrativa", disse em 30 de janeiro, quando questionado sobre as prioridades do ano.

Na quarta-feira (12), ele voltou a ironizar o Executivo. Quando uma repórter o indagou sobre o prometido envio pelo governo das regras do funcionalismo público, respondeu: “Disse que ia, né? Estamos aguardando”.

Se, por enquanto, não se pode falar em derrotas concretas do governo na Câmara, um dos movimentos de Maia denota a força que o presidente da Casa assumiu diante do Executivo. 

Ao lidar com as regras da quarentena para possíveis infectados pelo coronavírus, Maia convenceu o governo a enviar um projeto de lei. 

O deputado argumentou que seria mais rápido e mais seguro do que uma medida provisória. O pano de fundo da decisão, porém, é que Maia é um notório crítico do uso das MPs, vistas pelos parlamentares como um mecanismo do Planalto para passar por cima do Legislativo.

O presidente da Câmara também vem distribuindo patadas pela Esplanada nas primeiras semanas do ano. 

O alvo preferencial é o ministro da Educação, com quem Maia está irritado desde que Weintraub demitiu, sem qualquer comunicação prévia, o presidente do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação). 

Rodrigo Sérgio Dias, exonerado em dezembro, era indicado do presidente da Câmara —que, segundo aliados, só foi avisado por meio do Diário Oficial.

Desde então, Maia já declarou que Weintraub atrapalha o país, que representa a “bandeira do ódio” e que o fato de ele ser ministro demonstra uma falha de construção.

"Nosso país não tem futuro, né? Não tem futuro. Parece um passado ruim, porque conseguiu fazer de um cara desse o ministro da Educação... Que construção que nós tivemos", afirmou.

O ministro já teve sua primeira mostra de que ter a força de Maia no Parlamento trabalhando contra si dificulta a vida. 

Os deputados deixaram caducar a medida provisória que mudava a carteirinha estudantil. 

O texto perdeu a validade neste domingo (16), sem nem sequer ter sido instalada a comissão especial, primeira fase para a análise de uma MP.

Na avaliação do Legislativo, o tema poderia ser tratado por um decreto do Executivo, e não haveria a necessidade de uma lei para regulamentar o assunto.

Na mira do presidente da Câmara também está o recém-enviado projeto que autoriza mineração e geração de energia elétrica em terras indígenas. 

Para a atividade de garimpo, as comunidades indígenas terão poder de veto. Para a exploração energética, como a construção de hidrelétricas ou termoelétricas, elas serão apenas consultadas previamente.

Maia criou uma comissão especial para analisar o texto, o que permitirá que controle o cronograma de apreciação da matéria. 

Em novembro, quando Bolsonaro falou que enviaria o projeto, o presidente da Câmara afirmou que arquivaria a proposta e disse que não é porque existe garimpo ilegal que "a gente vai tratar de legalizar o garimpo".

Maia vem se consolidando como um primeiro-ministro informal desde 2019, segundo seus pares no Congresso. O deputado foi o principal responsável pela articulação política da reforma da Previdência, a grande vitória da gestão Bolsonaro em seu primeiro ano. 

Maia virou ‘primeiro-ministro’ informal

  • Bandeira   Presidente da Câmara assumiu protagonismo desde a votação e aprovação da reforma da Previdência, cara à gestão Bolsonaro
  • Anteparo   Maia criticou integrantes do governo por medidas que considerou antidemocráticas e autoritárias, o que causou desgastes com o presidente
  • Rusga    Demissão de indicado seu na Educação sem consulta prévia azedou de vez relação com ministro Abraham Weintraub
  • Base   Deputados têm sinalizado apoio ao líder da Casa, sobretudo quando veem em gestos de Bolsonaro sinais de desprestígio ao meio político e de tentativa de descolamento do Congresso
  • 2020   Maia deixou clara a intenção de capitanear as discussões sobre as reformas tributária e administrativa, consideradas prioritárias pela equipe econômica
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