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Eleições 2020

Potencial de abstenção na eleição deve preocupar candidatos

Ao se cruzar a intenção de voto com os segmentos mais pré-dispostos a deixarem de votar com medo do coronavírus, Russomanno seria o mais prejudicado

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Alessandro Janoni

Diretor de Pesquisas do Datafolha

O principal resultado da pesquisa sobre a eleição municipal divulgada pela Folha não se limita à intenção de voto. Outras perguntas feitas pelo Datafolha chamam a atenção pelas elevadas taxas de desinteresse em relação ao pleito e por apontar tendência de aumento na taxa de abstenção.

O índice de paulistanos que afirma ter nenhum interesse na eleição para prefeito —33%— é recorde: na última vez que o instituto incluiu a variável em levantamento na capital, em 2012, ele correspondia a 25%.

Fora a crise de representação que marca o cenário político brasileiro há alguns anos, o desinteresse atual também tem correlação com a insegurança que os paulistanos demonstram para comparecerem às urnas em razão da pandemia do novo coronavírus.

A grande maioria (66%) dos que cogitam a possibilidade de se absterem no próximo dia 15 de novembro por conta da doença dizem que não se sentem seguros para irem aos locais de votação.

No total, 21% se pré-dispõem a deixar de votar. A taxa é equivalente ao recorde de abstenções observadas na última eleição para o cargo –um índice que costumava ficar próximo a 16% até 2008, chegou a quase 19% em 2012 e a 22% em 2016.

Como o número oficial reflete também a desatualização do cadastramento eleitoral, a intenção atual de faltar ao pleito por causa da pandemia projeta uma taxa mais elevada de abstenção.

Mais importante até do que o percentual em si é o perfil dos que pretendem se abster –se concentrado em segmentos da população com tendência de apoio a determinado candidato, o fenômeno pode fazer a diferença em uma disputa que eventualmente se desenhe acirrada.

Cogitam a possibilidade de faltarem ao pleito principalmente os que têm até 44 anos de idade, os que estudaram até o fundamental ou ensino médio e os que possuem renda familiar de até cinco salários mínimos.

Ao se cruzar a intenção de voto por essa variável, percebe-se que Celso Russomanno (Republicanos) seria hoje o candidato mais prejudicado.

Entre os que afirmam que deixariam de comparecer às urnas, a distância do líder para o prefeito Bruno Covas (PSDB) é de 14 pontos percentuais, cinco a mais do que no total da amostra. Pouco mais de um terço dos eleitores do deputado tendem à abstenção em função da pandemia.

Considerando-se a vantagem atual de Russomanno, o impacto seria insuficiente para alterar o quadro de maneira significativa, mas dado o histórico do candidato em processos eleitorais para prefeito, a abstenção pode se tornar um adversário extra para suas pretensões.

Tanto em 2012 quanto em 2016, nesse mesmo período, a dois meses da eleição, e antes do início da propaganda em rádio e TV, o deputado aparecia na frente da corrida para sucessão municipal em patamares próximos a 30% das intenções de voto.

Há oito anos, desidratou aos poucos à medida que Fernando Haddad (PT) passou a ser identificado como candidato petista em período de alta popularidade do partido e ficou de fora do segundo turno, disputado por Haddad e José Serra (PSDB) depois de um empate técnico triplo na véspera da eleição.

Em 2016, também perdeu apoio à medida que João Doria (PSDB) ia se tornando mais conhecido do eleitorado e, apesar de chegar muito próximo da segunda colocação de Haddad nas urnas, foi mais um derrotado logo em primeiro turno pela onda antipetista que varreu a eleição, após o impeachment de Dilma Rousseff (PT), que se consumou em agosto daquele ano.

Como em anos anteriores, alguns candidatos ainda são pouco conhecidos dos eleitores, o que sugere mudanças ao longo do processo e, dependendo do perfil de uma eventual migração de votos, reflexos do vetor abstenção podem recair sobre outros nomes.

Guilherme Boulos (PSOL), por exemplo, é o candidato do espectro esquerdista com melhor colocação na pesquisa. Ainda desconhecido pela maioria dos eleitores, ele guarda esperanças de atrair parte dos simpatizantes do PT, grupo onde já tem o dobro do que consegue na média, mas antes precisa convencê-los a irem votar –os que se dizem petistas são os que mais cogitam a possibilidade de faltarem à eleição e são os que sentem-se mais inseguros.

Bruno Covas, por enquanto, seria o menos prejudicado. Entre os que se classificam muito seguros para comparecerem no dia do pleito, o prefeito chega a empatar tecnicamente com Russomanno na liderança da disputa. Entre seus apoiadores, 81% descartam a possibilidade de faltarem.

Os dados, no geral, revelam a necessidade de comunicação adequada por parte de autoridades sanitárias e eleitorais para que a população se convença de que protocolos serão de fato adotados para reduzir as chances de contágio.

Caso contrário, a hipótese mais provável é a de que o universo de eleitores em boa parte das cidades do país será reduzido ao de “likely voters”, conceito usado nas eleições americanas (onde o voto é facultativo), que considera a pré-disposição do indivíduo em participar do pleito.

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