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Tecnologia em escritórios de advocacia avança na pandemia e requer nova mentalidade

Uso de ferramentas demanda capacidade analítica de advogados e interação com equipes multidisciplinares no trabalho com dados

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Mogi das Cruzes (SP)

O distanciamento imposto pela pandemia da Covid foi determinante para impulsionar a utilização de recursos tecnológicos em escritórios de advocacia. A demanda por sistemas para videoconferências, gestão inteligente e digitalização de arquivos cresceu, e novas metodologias com dados têm, aos poucos, ganhado espaço.

A percepção é compartilhada por empresas que atuam na oferta de soluções para departamentos jurídicos e escritórios ouvidos pela Folha.

Carlos Manino, sócio-diretor da TOTVS juriTIs, no mercado há mais de 25 anos, diz que a procura por sistemas aumentou drasticamente e que alguns tabus foram quebrados, citando como exemplo a substituição das viagens por videoconferências e o êxito do trabalho remoto, que deve continuar num modelo híbrido.

“A tecnologia chega aqui e lá fora ao mesmo tempo, mas o nível de adoção era muito diferente antes da pandemia. Agora se tornou muito mais acelerada”, diz.

Na empresa, a demanda maior tem sido pelo serviço de gerenciamento eletrônico de documentos, especialmente para atender regras de compliance da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados).

“A pandemia forçou a virada de chave da inclusão efetiva da tecnologia no dia a dia”, acrescenta Simone Salomão, diretora de consultoria da TOTVS juriTIs.

Uma mulher branca e de óculos vermelhos sentada diante de um notebook
A advogada Maria Juliana do Prado Barbosa, diretora da feira jurídica Fenalaw - Divulgação

A empresa de softwares Benner, que atua em departamentos jurídicos, pretende chegar nos próximos meses aos escritórios de advocacia com o BPO Jurídico, serviço de terceirização com recursos de automação e algoritmos para análise preditiva (mensurar a probabilidade de um determinado resultado, no caso, em decisões judiciais).

“A proposta é deixar o advogado focado naquilo que ele deve fazer”, diz o gerente de BPO da empresa, Magno Alves.

O advogado Gustavo Biagioli, diretor jurídico e de compliance do escritório Trench Rossi Watanabe, conta que, há cerca de três anos, a banca tem investido no uso de novas tecnologias, em parceria com profissionais das áreas da ciência de dados e estatística.

Além de acelerar o processo de digitalização, ele reforça que a pandemia também trouxe a preocupação com a melhoria dos processos de captura e armazenamento de dados. Já o uso da inteligência artificial ainda enfrenta resistências no meio.

“Um dos medos de todos os profissionais —inclusive os do direito—, de ser substituído por um robô, não é algo que está próximo de acontecer. Na verdade, os escritórios estão investindo na automatização de atividades repetitivas, liberando o corpo jurídico de atividades que não exijam capacidade de tomada de decisão”, diz.

Softwares que preenchem petições, organizam informações e trazem análises preditivas dos resultados são alguns exemplos de tecnologias que têm impactado decisões de clientes, exemplifica ele.

Vanessa Louzada, diretora da Deep Legal Analytics, lawtech que trabalha com a análise preditiva de dados, afirma que esse processo de incorporação tecnológica foi intensificado nos últimos cinco anos, com a melhora da capacidade de processamento de computadores, digitalização de processos e surgimentos das lawtechs e legaltechs (startups que atuam na área do direito).

Nesse novo contexto, ela afirma que ainda existe muita confusão por parte dos advogados sobre como aplicar tais recursos, o que requer uma transformação de mentalidade.

“O advogado sai da faculdade treinado para ver exceção e, no momento em que se depara com dados, ele tem aquilo que chamamos de paralisia da análise. Primeiro, ele não sabe o que fazer, por onde começar com aquela quantidade de informação. Depois só começa a ver a exceção, mas não as possibilidades”, diz.

Uma mulher branca e de óculos ao lado de telas de computador
A advogada Vanessa Louzada, diretora da lawtech Deep Legal Analytics - Divulgação
Na mesma linha, Maria Juliana do Prado Barbosa, diretora geral da Fenalaw Digital Week —feira jurídica realizada na última semana de forma virtual—, afirma que é preciso que a mudança ocorra em toda a equipe de trabalho.

“A primeira coisa que tem que fazer para se preparar para o futuro tecnológico é exigir uma mudança comportamental, dos sócios até toda a equipe, porque se todos não estiverem preparados para incorporar aquilo, não adianta. Você vai ter a ferramenta e vai continuar a usar o Excel.”

O mesmo aspecto é destacado por Biagioli, do Trench Rossi Watanabe. “Não há mais como um advogado ser completo se ele não dispuser de recursos e conhecimento na área de tecnologia que vai ajudá-lo. O dado sozinho é como o petróleo cru: se não souber como refinar, não vai ser de grande serventia”, diz o advogado.

Para quem quer começar esse processo de trabalho com dados, Maria Juliana afirma que primeiro é preciso organizar as informações internas e entender qual o melhor sistema de acordo com as necessidades existentes e com o orçamento disponível.

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Vanessa, da Deep Legal Analytics, diz ainda que o fundamental nesse processo é que o profissional esteja aberto para a mudança e para o pensamento crítico, para que consiga trabalhar com as informações ou com equipes multidisciplinares, presentes em equipes de Legal Operations, Controladoria Jurídica e Eficiência Jurídica.

“Junto com a tecnologia estão surgindo essas novas equipes, que são direcionadas a dados, tecnologia e têm muita metodologia, que é algo que acho bárbaro, como legal design e outras estruturas que o direito está emprestando de outras áreas.”

Fellipe Branco, responsável pela área de visual law e legal design do escritório Lima E Feigelson, afirma que ser designer de formação tem ajudado a quebrar alguns tabus sobre a aplicação dos conceitos.

“Legal design não é design de documentos jurídicos. É uma área nova dentro do direito em que os conceitos podem ser usados para o desenvolvimento de softwares, programas, processos e leis”, diz.

Branco acrescenta que a junção com o design que ocorre de forma mais recente no meio jurídico é observada há décadas em outras áreas, como na administração. Para além do formato, ele reforça que o essencial é pensar na mensagem que será passada.

“Eu vejo muita gente falar que o visual law é aquela coisa 'não entendeu, desenhe'. Não tanto por aí, mas, sim: estou me comunicando com alguém. Eu estou conseguindo me fazer entender? Essa preocupação é que vai fazer diferença no final”, diz.

A advogada Ellen Gonçalves Pires, sócia-fundadora do escritório PG Advogados, define o legal design como a aplicação de conceitos do design com foco nas pessoas e em tornar os serviços jurídicos mais humanos.

“Os recursos visuais viraram quase uma obrigação. Pensar de maneira mais simples e pensar no usuário. Acredito muito que essa abordagem interdisciplinar consegue trabalhar na prevenção e conseguir resolver de maneira simples problemas complexos”, diz.

Ela destaca que o escritório foi pioneiro no desenvolvimento de tecnologia própria, com programadores e tecnólogos e hoje também analistas de dados na equipe. Para oferecer serviços de gestão de processos para departamentos jurídicos, criaram o Brain Law, uma startup independente que usa recursos de inteligência artificial e automação.

Inteligência artificial, jurimetria, predição são ferramentas que cada vez mais estarão mais presentes, porque a gente quer usufruir da análise dos dados para nos dar um caminho de maior segurança”, diz.

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