Bolsonaro ignora orientação de aliados e participa de ato esvaziado contra STF em Brasília

Presidente cumprimenta apoiadores que participam de manifestação na Esplanada dos Ministérios

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Manifestante se ajoelha pra rezar em ato bolsonarista em Brasília

Manifestante se ajoelha pra rezar em ato bolsonarista em Brasília Antonio Molina/Folhapress

Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (PL) foi neste domingo (1º) a ato em Brasília com ataques ao STF (Supremo Tribunal Federal) e em desagravo ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado pela corte.

A manifestação foi esvaziada, enchendo menos de uma quadra da Esplanada. O presidente chegou ao local por volta das 11h30, onde ficou por cerca de dez minutos, cumprimentando apoiadores. Pouco depois, manifestantes começaram a deixar o local.

"[Vim] cumprimentar o pessoal que está aqui na manifestação pacífica em defesa da Constituição, da democracia, e da liberdade. Então parabéns a todos de Brasília, bem como todos brasileiros que hoje estarão nas ruas", disse em live aberta em suas redes sociais.

Aliados do presidente defendiam que ele não participasse dos atos neste domingo, por temor de discursos radicalizados que possam acentuar a crise entre os Poderes. Mesmo sem discurso, Bolsonaro marcou presença em um ato incentivado por ele e que tem objetivo atacar um outro Poder.

Já integrantes do Legislativo e do Judiciário, com ou sem a presença do chefe do Executivo, temiam que as manifestações possam reeditar os atos de raiz golpista de 7 de Setembro do ano passado. Em Brasília, havia cartazes com pedidos para destituição de todos os ministros do Supremo.

Um dia antes, Bolsonaro usou um evento oficial em Uberaba (MG) para convocar seus aliados a participarem dos atos convocados para este domingo, 1º de Maio.

Em recado direto ao STF, o presidente disse: "[Aqueles] que, porventura, irão às ruas amanhã, não para protestar, mas para dizer que o Brasil está no caminho certo. Que o Brasil quer que todos joguem dentro das quatro linhas da Constituição. E dizer que não abrimos mão da nossa liberdade."

"Amanhã [domingo] não será dia de protestos. Será dia de união do nosso povo para um futuro cada vez melhor pra todos nós", completou, na Expozebu, maior evento da pecuária no país. O evento consta da agenda oficial do presidente e teve transmissão ao vivo pela TV Brasil, do governo federal.

O presidente Jair Bolsonaro em ato contra o Supremo na Esplanada
O presidente Jair Bolsonaro em ato contra o Supremo na Esplanada - Antonio Molina/Folhapress

Neste domingo, o presidente não fez discurso no ato em Brasília. A previsão é que participe, por vídeo, da manifestação prevista para esta tarde em São Paulo, na avenida Paulista.

O único ministro que acompanhou Bolsonaro em Brasília foi o general Augusto Heleno, chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional).

A ex-ministra Damares Alves, candidata ao Senado pelo DF, era esperada para discursos, mas chegou ao final do evento, por volta de 12h30. Ela não falou no carro de som, mas conversou e tirou fotos com manifestantes.

Apoiadores do presidente Bolsonaro reunidos próximo ao Congresso Nacional, em Brasília, neste domingo (1º)
Apoiadores do presidente Bolsonaro reunidos próximo ao Congresso Nacional, em Brasília, neste domingo (1º) - Reprodução/GloboNews

Em um dos trios elétricos, havia uma faixa estendida pedindo a criminalização do comunismo e a destituição dos 11 ministros do Supremo.

"Senhores senadores! Nas urnas, iremos nos lembrar das vossas omissões frente a membros do STF", dizia outra, pela qual Bolsonaro passou quando esteve no local.

O Senado é responsável por analisar pedidos de impeachment de ministros do STF, defendidos por bolsonaristas, mas que nunca vingaram no Parlamento. Outro manifestante carregava cartaz contra "a ditadura da toga".

Os discursos nos carros de som na Esplanada criticaram o STF e o Judiciário de forma geral, atribuindo à corte supostos ataques ao demais Poderes e à Constituição.

Diferentemente das manifestações de setembro, desta vez, as críticas citavam menos nomes de ministros, ainda que o de Alexandre de Moraes tenha surgido.

Relator dos inquéritos que tem Bolsonaro e seus aliados como alvos, foi citado como alguém que "desrespeita as liberdades". Ele também foi responsável pelo caso de Silveira na corte.

O deputado federal Sanderson (PL-RS) chegou a dizer que ministros envergonham o STF e citou nominalmente Moraes.

"Hoje esses ministros [do STF] têm envergonhado demais a Suprema Corte. Por isso, nós não aceitamos Alexandre de Moraes ou qualquer outro ministro atacando a liberdade de expressão. Não aceitaremos jamais ataques contra o poder Legislativo e Executivo seja de quem for".

Os manifestantes diziam ser "covardia" a condenação de Silveira, que foi tratado como "símbolo de luta pela liberdade", nas palavras da deputada federal Bia Kicis (PL-DF).

A parlamentar e candidata à reeleição disse que Bolsonaro é a "última barreira contra o comunismo". Ela pediu ainda que os jovens tirassem título de eleitor para votar em outubro.

Apesar de o foco dos atos ter sido atacar o Judiciário, muitos discursos também tinham a esquerda e Lula como alvo, e ressaltavam a chamada pauta de costumes, como aborto e drogas.

Organizadores pediram a pastores e padres que se aproximassem e subissem no carro para puxar rezas. Após o Pai Nosso, um pastor discursou contra o aborto e pregou que a autoridade de Deus é maior que a de qualquer juiz.

Apesar da passagem relâmpago de Bolsonaro no ato, o aposentado Sidney, 59, diz não ter ficado surpreso pela ausência de discurso. Segundo ele, o ato poderia ser interpretado como propaganda eleitoral antecipada.

"Infelizmente temos vários segmentos da politica que são ‘esquerdopatas’. Um Supremo que tira liberdade de expressão. E hoje é um grito de liberdade", afirmou.

Na mesma linha, Cristiana, 42, disse que a liberdade está "ameaçada" pela esquerda. Para ela, o tamanho do ato, que não chegou a preencher um quadrante inteiro da Esplanada, foi "maravilhoso".

Apoiadores do presidente organizaram neste domingo, em desagravo ao deputado Daniel Silveira (PTB-RJ), em ao menos quatro capitais, além de Brasília: Salvador (BA), Curitiba (PR), Rio de Janeiro (RJ) e São Paulo (SP). O ato na capital foi antecedido por uma motociata, da qual Bolsonaro não participou.

Um dos organizadores do protesto da Esplanada João Salas disse à Folha ter combinado com os demais que ninguém pedisse a "destituição dos 11 ministros do STF" na presença de Bolsonaro, caso Bolsonaro comparecesse ao ato.

"Se alguém tem que falar, algo a respeito da instituição ou de alguma pessoa, direcionado a alguém, é o presidente."

É justamente este tipo de discurso, presente em manifestações anteriores de apoio ao presidente, que o entorno do chefe do Executivo teme, em especial neste momento em que ele está lucrando politicamente após embate com o STF.

O receio é que ele se exceda e que uma postura autoritária acabe por se sobrepor ao lucro que ele teve com a base ao dar o indulto a Daniel Silveira.

A avaliação de aliados do presidente, como mostrou a Folha, é a de que o indulto concedido ao deputado teve efeito positivo sobre a base que já é cativa de Bolsonaro. Mas a campanha do presidente constatou divisão em outra parcela do eleitorado, mais moderada.

Silveira foi condenado a 8 anos e 9 meses de prisão pelo Supremo por atacar integrantes da instituição. Mas, no dia seguinte, recebeu indultou do presidente, anulando sua pena.

Bolsonaristas defendem que este é um caso de liberdade de expressão, mas o entendimento do Judiciário tem sido outro.

Além de xingar os ministros do Supremo e fazer acusações como de compra de sentença, incitou violência contra o ministro Edson Fachin: "Quantas vezes eu imaginei você, na rua, levando uma surra".

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