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Guerra da Ucrânia Eleições 2022

Lula amplia repertório de erros ao falar sobre Guerra da Ucrânia

Depois de aborto, militares e policiais, salto alto de petista agora contamina imagem externa

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São Paulo

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva parece decidido a testar todos os limites de seu repertório de erros políticos nesta pré-campanha para tentar voltar ao Palácio do Planalto.

O salto alto do petista, líder cada vez mais contestado da corrida eleitoral, agora o expôs naquilo em que usualmente surfa: a imagem externa. Lula resolveu falar o que pensa sobre a Guerra da Ucrânia e, como em episódios recentes, perdeu uma oportunidade de no mínimo modular sua expressão.

Lula, em seu primeiro mandato, visita Putin, então no começo de seu segundo termo à frente do Kremlin
Lula, em seu primeiro mandato, visita Putin, então no começo de seu segundo termo à frente do Kremlin - Eduardo Knapp - 22.nov.2004/Folhapress

Em entrevista à revista americana Time, o ex-presidente disse que o ucraniano Volodimir Zelenski é tão culpado quanto Vladimir Putin pela invasão de seu país pela Rússia. Mais: o Ocidente "fica estimulando o cara e ele fica se achando o máximo, fica se achando o rei da cocada", em relação ao apoio ao presidente em Kiev.

Com a devida boa vontade e tirando a referência derrogatória e paternalista sobre o fato de Zelenski ser "um bom comediante", Lula não está de todo errado. Ele defende que os lados deveriam ter sentado para conversar antes da guerra, dado que ambos tinham suas demandas. De fato, o ucraniano foi altamente inábil sobre a questão até a invasão.

O problema é que quem disparou os mísseis em 24 de fevereiro foi Putin, não Zelenski. Lula até diz condenar a invasão, mas o estrago da acusação que sofrerá de falsa equivalência, ópio dos críticos de rede social, está feito. Ainda mais falando para uma audiência internacional.

De brinde e inadvertidamente porque a entrevista foi feita em março, a crítica à inutilidade das Nações Unidas, correta no conteúdo, vem poucos dias depois de Lula e o PT celebrarem a mesma ONU por um relatório de comitê dizendo que ele foi vítima de perseguição judicial.

Mesmo durante os anos do escrutínio da corrupção em seu governo e do embate com a Operação Lava Jato, Lula passou relativamente incólume no tribunal externo. Houve a citação nas memórias de Barack Obama a suas agruras, relativizando a fama de "o cara", mas a ojeriza global ao governo Jair Bolsonaro (PL) e as vitórias judiciais do petista recolocaram a mitologia do "presidente mais popular da história" de pé novamente.

A edição da Time é a primeira prova disso, e Lula conseguiu jogar carne podre no cozido. Para desespero de seus apoiadores, não é a primeira, nem a segunda vez. "Se o @LulaOficial continuar com essa incontinência verbal, e se não investir em comunidades sociais de maneira inteligente e profissional, vai permitir que o atual inquilino do Planalto tenha sérias chances de reeleição", tuitou em 1º de maio o escritor Paulo Coelho.

Nas últimas semanas, Lula sugeriu que militantes de esquerda cercassem casas de deputados para pressioná-los caso ganhe a eleição. Também fez defesa, correta como argumento mas politicamente fora de hora, do direito ao aborto. Primeiro, a prática não foi liberalizada em seu governo; segundo, Lula conhece o país onde vive e sabe que é dar munição a um adversário que vive imerso numa agenda extremista nos costumes.

Também tinha falado em demitir os militares agregados ao governo, algo que sempre existiu e é necessário em pastas como a Defesa. Novamente, faltaram modulação e ponderação institucional, já que na crispação atual tudo vira briga de cachorro grande —como a fala do ministro Luís Roberto Barroso sobre as Forças Armadas na eleição provou.

No domingo em que Coelho escreveu, Lula subiu ao palco de uma manifestação esvaziada para esbravejar como o sindicalista dos anos 1970, não sem antes tentar consertar uma gafe em que sugeriu que policiais não eram seres humanos.

Como dizem seus aliados, Lula já tem o voto da centro-esquerda hoje. Seu desafio é ampliar a faixa centrista, algo que a figura anódina do ex-tucano Geraldo Alckmin em sua chapa como vice não parece nem de longe garantir.

Uma argumentação petista é de que o voto dos mais pobres é o mais importante. É verdade em parte, por ignorar que, se ideologia conta pouco para quem tem problema financeiros ou fome, este é um segmento altamente conservador. Logo, vulnerável duplamente a Bolsonaro, por políticas de transferência de renda e discurso.

E, principalmente, por não entender o poder de mobilização da classe média a partir de 2013, com o ápice na campanha pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016.

Em favor de Lula no episódio Ucrânia da Time, do ponto de vista de impacto negativo, há algo que não é falsa equivalência: ele pensa exatamente como o governo Bolsonaro, que condenou a invasão, mas também as sanções contra a Rússia e não aderiu a nenhum tipo de punição internacional a Putin.

O atual presidente esteve em Moscou prestando "solidariedade à Rússia" uma semana antes da guerra, e nada indica que Lula faria diferente na cadeira, a julgar por sua avaliação à revista americana.

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