Descrição de chapéu Folhajus forças armadas

Presidente de tribunal militar recebe diárias para fins de semana sem agenda no Rio

Ministro também teve 5 diárias com assessora para palestra de 1 dia e evento na Colômbia; STM fala em economicidade

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Brasília

O presidente do STM (Superior Tribunal Militar), general Luis Carlos Gomes Mattos, mantém intensa agenda de viagens bancadas com diárias, o que incluiu fins de semana sem compromissos oficiais no Rio de Janeiro e cinco dias em Cartagena (Colômbia) para uma palestra e participação em um evento.

As informações integram relatórios de gastos com diárias e passagens aéreas tornados públicos pelo STM, em atendimento ao que determina o CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

As viagens de Mattos foram acompanhadas quase sempre por assessores, que também recebem diárias.

O general Luis Carlos Gomes Mattos, durante sabatina na CCJ do Senado, na época de sua indicação ao STM - Alan Marques-17.ago.2011/Folhapress

Essas viagens foram feitas em ano de pandemia e boa parte delas teve como objetivo a participação em eventos burocráticos, como trocas de comandos do Exército.

O general viajou para acompanhar 12 solenidades militares, embora participe de julgamentos envolvendo fardados suspeitos de crimes.

Mattos não torna pública sua agenda diária, ao contrário do que fazem os outros presidentes de tribunais superiores, como STF (Supremo Tribunal Federal), STJ (Superior Tribunal de Justiça), TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e TST (Tribunal Superior do Trabalho).

Os gastos com diárias e passagens aéreas do presidente do STM e de assessores que o acompanham somaram R$ 235 mil em um ano, segundo os dados dos relatórios de transparência do tribunal. Ao todo, foram feitas 22 viagens –uma média de 1 deslocamento a cada 17 dias.

Em nota, o STM afirmou que é "natural" o deslocamento do presidente pelo país, em razão das visitas de inspeção às auditorias e da representação do tribunal nas relações com outros Poderes e autoridades.

"Privilegiando o princípio da economicidade, o presidente do STM aproveita participação em solenidades militares para visitar as diversas auditorias militares e estabelecer contato com autoridades, em diversas unidades da federação", disse.

"O presidente recebe as diárias computadas para os dias em que participa de atividades previstas em sua agenda."

O STM não deu explicações para as viagens que incluíram fins de semana, para a extensão de viagens, para a presença de assessores, para os valores totais gastos com diárias e passagens e para a ausência de publicidade da agenda diária do presidente.

Três viagens incluíram fins de semana no Rio sem agenda oficial por parte do general.

Em maio, o ministro visitou auditorias da 1ª e 2ª CJM (Circunscrição Judiciária Militar), além de "autoridades locais", como consta na explicação para o pagamento das diárias.

Para a viagem a São Paulo e Rio, o ministro recebeu 5,5 diárias, incluídos o sábado e o domingo, no valor de R$ 3.700. Dois assessores estiveram na viagem, o que gerou pagamentos de mais R$ 6.000 em diárias.

No mês seguinte, o general visitou a cúpula da PM no Rio, em uma quarta-feira. Mais uma vez, houve pagamentos de diárias até domingo, no valor de R$ 3.000, segundo os dados públicos do STM.

A oficial de gabinete que o acompanhou também recebeu 4,5 diárias, no valor de R$ 2.500. Os dados de transparência do tribunal não informam o motivo da viagem (o campo está em branco).

Em outubro, o general foi ao Rio para uma visita ao Bope (Batalhão de Operações Policiais Especiais) da PM do estado e para uma palestra num simpósio sobre Justiça Militar, em dia de semana.

Ao todo, recebeu 5,5 diárias no valor de R$ 3.700, incluído o fim de semana. A mesma assessora o acompanhou na viagem, com 5,5 diárias de R$ 3.700.

O presidente do STM e sua assessora estiveram ainda, no mês seguinte, na solenidade de entrega de espadas aos novos aspirantes da Aman (Academia Militar das Agulhas Negras).

A viagem durou de quinta-feira (25) a domingo (28); a solenidade ocorreu no sábado (27). As diárias aos dois somaram R$ 4.700.

No dia 18 de novembro, o general deu uma palestra no VIII Fórum Interamericano de Justiça Militar, em Cartagena, na Colômbia. A viagem durou, ao todo, cinco dias.

Os documentos sobre o pagamento de diárias, tornados públicos pelo STM, registram que a finalidade da viagem foi "participar e ministrar palestra" no fórum na Colômbia. No caso da assessora que acompanhou o presidente do tribunal, a finalidade foi "assessorar o ministro na palestra", conforme os mesmos documentos.

As cinco diárias foram pagas em dólares: US$ 4.485 aos dois, ou R$ 25,9 mil, pela cotação do dólar na ocasião. Já as passagens aéreas saíram por R$ 39,7 mil, valor bem acima do praticado no mercado em caso de compra com antecedência.

"A palestra proferida pelo presidente do STM ocorreu no dia 18, entretanto o presidente permaneceu durante todo o evento", disse o tribunal.

O pagamento de diárias, em tese, deve cobrir gastos com alimentação, hospedagem e transporte. O valor da diária em deslocamento dentro do país equivale a 1/30 do subsídio pago ao ministro, ou R$ 1.309. A lei que orienta a execução do orçamento, porém, limita esse gasto a R$ 700.

A diária paga ao presidente do STM oscilou entre R$ 658,57 e R$ 683,45. Já a diária internacional é de US$ 579, que foi o valor pago em razão da viagem a Cartagena.

Pelos dados tornados públicos pelo STM, Mattos esteve ainda em aniversário de batalhão de Infantaria; em cerimônias na Aman; em visita institucional a militares na Amazônia; em transmissão de cargo de diretor da Marinha; em passagem de comando de parque regional de manutenção; e nas trocas dos comandos militares do Norte, Nordeste e Amazônia.

Oficiais generais têm foro especial junto ao STM. Eventuais crimes militares são julgados pelo plenário do tribunal, composto por dez oficiais generais —Mattos entre eles— e cinco civis.

O STM afirmou em nota que a lei que organiza a Justiça Militar da União, de 1992, prevê que militares nomeados ministros no tribunal permanecem na ativa, em quadros especiais das Forças Armadas.

"Pelo fato de fazerem parte de quadros especiais, permanecendo na ativa, os ministros militares, com frequência, são convidados a prestigiar eventos nas mais diversas organizações militares espalhadas pelo país", disse o tribunal.

"O fato de que os militares são os principais jurisdicionados da Justiça Militar da União não impede que os magistrados participem de solenidades militares."

Reportagens publicadas pela Folha revelaram que a regra no STM é o arquivamento de acusações contra generais do Exército e almirantes e brigadeiros de Marinha e Aeronáutica.

Em julho de 2021, uma reportagem mostrou que apenas um oficial general havia sido punido pelo STM em dez anos.

Um contra-almirante foi condenado a dois meses de detenção, a menor pena prevista em lei para o crime apontado —lesão corporal culposa. A sentença previu a possibilidade de suspensão da execução da pena e permitiu que o militar recorresse em liberdade.

De uma década para outra, dobrou a quantidade de IPMs (inquéritos policiais militares) que investigaram generais, brigadeiros e almirantes e que acabaram arquivados pelo STM, como mostrou reportagem publicada também em julho.

Em uma sessão plenária no último dia 19, o presidente do STM ironizou a divulgação de áudios que apontam a prática de tortura durante a ditadura militar instaurada com o golpe de 1964.

Segundo ele, a divulgação dos áudios de sessões do STM durante a ditadura é uma "notícia tendenciosa".

"Não temos resposta nenhuma para dar. Simplesmente ignoramos uma notícia tendenciosa, que nós sabemos o motivo. Aconteceu durante a Páscoa. Garanto que não estragou a Páscoa de ninguém. A minha não estragou", disse o ministro.

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