Cadê a turminha da carta pela democracia?, diz Bolsonaro sobre ordem do STF contra empresários

'Somos ainda um país livre. E eu pergunto a vocês: o que aconteceu no tocante aos empresários agora?'

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Porto Alegre e Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (PL) cobrou nesta quarta-feira (24) os responsáveis pelas cartas pela democracia a se manifestarem sobre a controversa operação que, um dia antes, teve como alvo empresários bolsonaristas.

"Somos ainda um país livre. E eu pergunto a vocês: O que aconteceu no tocante aos empresários agora? Esses oito empresários. Eu tenho contato com dois deles. Luciano Hang e o Meyer Nigri. Cadê aquela turminha da carta pela democracia?", disse em fala a prefeitos e líderes evangélicos em Betim (MG).

O presidente Jair Bolsonaro em solenidade no Palácio do Planalto - Gabriela Biló-23.ago.22/Folhapress

"A gente sabe que em época de campanha continuam lobos em pele de cordeiro. Acreditar que eles são democratas e nós não somos? Cadê a turminha da carta pela democracia?", completou, em referência aos atos de 11 de agosto, que reuniram milhares de pessoas para a leitura de duas cartas de apoio à democracia na Faculdade de Direito da USP.

Na ocasião, a primeira carta foi endossada por entidades como a Fiesp e centrais sindicais. Já a segunda, inspirada na Carta aos Brasileiros de 1977, ultrapassou 1 milhão de assinaturas.

A manifestação de Bolsonaro nesta quarta foi a primeira feita publicamente por ele sobre a operação realizada pela Polícia Federal com aval do STF (Supremo Tribunal Federal) e que foi criticada por bolsonaristas. No dia anterior, ele havia criticado a ação em uma conversa restrita com um grupo de empresários.

Após a fala em Betim, Bolsonaro participou de comício em Belo Horizonte em que, sem mencionar a operação, reforçou chamamentos a apoiadores para os atos do 7 de Setembro e voltou a acenar a policiais.

Ele disse que, caso seja reeleito, defenderá a aprovação do excludente de ilicitude para a categoria —uma lei para abrandar penas a agentes de segurança que cometerem excessos na atuação policial.

A decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), de autorizar buscas contra empresários bolsonaristas gerou novos atritos entre o Planalto e o Judiciário a pouco mais de um mês das eleições.

Os alvos da operação pedida pela Polícia Federal e autorizada por Moraes foram empresários de grupo de WhatsApp em que se defendeu golpe de Estado caso Lula vença Bolsonaro nas eleições presidenciais de outubro.

No discurso em Belo Horizonte, Bolsonaro fez ataques a Lula e defendeu que a população possa comprar armas de fogo, além do aceno aos policiais.

"Dizer a vocês policiais militares que tem aqui, hoje nós temos um governo que acredita e valoriza vocês. Um governo que, se Deus quiser, com um novo Parlamento, vai conseguir o excludente de ilicitude para que vocês bem possam trabalhar", disse.

No início do governo, quando Sergio Moro ainda estava no governo como ministro da Justiça, o Executivo apresentou um projeto intitulado pacote anticrime que propunha diversas mudanças legais para combater a criminalidade.

Um dos pontos abria brecha para livrar policiais de excessos por "medo, surpresa ou violenta emoção". Esse trecho do projeto, entretanto, não foi aprovado pelo Congresso.

Sobre a mobilização relativa ao feriado do 7 de Setembro, Bolsonaro pediu para que as pessoas presentes "compareçam a esse movimento de verde e amarelo para dar um respaldo para aqueles que querem realmente continuar dizendo que o Brasil é de vocês".

O chefe do Executivo também procurou se aproximar do público mineiro. "Eu também sou mineiro, uai. É uma honra retornar ao estado onde eu renasci", afirmou, logo no início de sua fala, em referência à facada que levou nas eleições de 2018 em evento em Juiz de Fora (MG).

Em Belo Horizonte, Bolsonaro chegou a cair durante caminhada com apoiadores. O vídeo do tombo viralizou nas redes sociais.

No discurso na Praça da Liberdade, o presidente também disse que Lula apoia o presidente da Nicarágua, Daniel Ortega. O país vive uma crise, principalmente com a Igreja Católica, que já culminou, inclusive, na prisão do bispo de Matagalpa, Rolando Álvarez, que era um crítico contumaz do ditador.

"País que não tem mais liberdade, fecha rádios de católicos, prende padres. Esse é o país que Lula da Silva defende lá fora", disse.

Mais cedo, em Betim, Bolsonaro deu voz a um imigrante venezuelano, que contou as agruras da sua entrada no país por Roraima após uma caminhada de cinco dias. Depois de atacar o governo Nicolás Maduro e relacioná-lo à esquerda brasileira, Bolsonaro questionou a veracidade das pesquisas eleitorais que apontam vantagem do petista. "O único lugar em que o Lula ganha é no Datafolha", disse.

Em relação à operação da PF na terça (23), além das buscas, Moraes determinou que os empresários alvo da ação fossem ouvidos pela PF e tivessem bloqueadas suas respectivas redes sociais. A decisão irritou o procurador-geral da República, Augusto Aras, e gerou questionamentos de advogados.

Entre os alvos estiveram Luciano Hang, da Havan, José Isaac Peres, da rede de shopping Multiplan, Ivan Wrobel, da Construtora W3, José Koury, do Barra World Shopping, André Tissot, do Grupo Sierra, Meyer Nigri, da Tecnisa, Marco Aurélio Raymundo, da Mormaii, e Afrânio Barreira, do Grupo Coco Bambu.

As conversas entre os empresários foram reveladas pelo site Metrópoles. Após a divulgação das mensagens, participantes do grupo negaram intenção golpista.

Advogados consultados pela Folha viram com ressalvas a operação realizada. O problema, dizem esses advogados, é saber se a ação foi baseada apenas nas conversas de WhatsApp ou se há outras circunstâncias ainda desconhecidas do público.

A depender dessas outras circunstâncias, caso elas existam, as medidas adotadas podem ser consideradas apropriadas. Até este momento, contudo, não foram divulgados os fundamentos da iniciativa policial.

Bolsonaro tem feito neste ano seguidos ataques ao sistema eleitoral e aos ministros do STF para acusar uma suposta fraude caso não vença as eleições. Também na fala em Betim nesta quarta, Bolsonaro declarou que "perder uma eleição na democracia é natural, faz parte da regra", mas não se comprometeu em respeitar o resultado em caso de derrota.

O sistema eletrônico de votação, porém, foi exaltado e ovacionado diante de Bolsonaro na posse do ministro Alexandre de Moraes como presidente do TSE, na semana passada.

A retórica golpista do presidente inclui ainda o flerte com as Forças Armadas, que participam de uma comissão de transparência eleitoral e, na prática, têm sido uma das linhas de frente do questionamento do presidente às urnas.

O ataque mais grave às urnas ocorreu em 18 de julho, quando ele chamou embaixadores estrangeiros para expor suas mentiras acerca das urnas e do processo eleitoral, repetindo argumentos já descartados após sua exposição em uma live no ano passado.

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