Pauta armamentista de Bolsonaro vira ponto sensível para Lula

Programa de governo do petista ainda não tem consenso, e aliados temem tropeço em área dominada pelo atual presidente

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Brasília e São Paulo

Temas de segurança pública —principalmente a pauta armamentista do presidente Jair Bolsonaro (PL)— se converteram em ponto sensível para a campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tem evitado ou abordado o assunto apenas de forma genérica.

Aliados do petista avaliam que essa é uma seara dominada por eleitores de Bolsonaro e que qualquer tropeço pode dar munição aos opositores.

O receio tem levado Lula a ter cautela até mesmo em pautas amplamente defendidas pela esquerda, como as críticas aos decretos de Bolsonaro que facilitaram o acesso a armas e dificultaram o controle de munições.

O ex-presidente Lula (PT)
O ex-presidente Lula (PT) - Rahel Patrasso/Xinhua

Nesta terça-feira (30), o ex-presidente se reuniu com dois governadores (Rui Costa/BA e Paulo Câmara/PE), três ex-governadores aliados (Renan Filho/AL, Wellington Dias/PI, Jaques Wagner/BA) e seu vice na chapa, Geraldo Alckmin, ex-governador de São Paulo, para debater o tema.

Pessoas próximas dizem que Lula também quer aproveitar a ocasião para medir a temperatura do apoio das Polícias Militares ao bolsonarismo.

O programa de governo da coligação liderada pelo PT, protocolado no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), não trata do assunto. Uma versão preliminar, que foi encaminhada aos partidos aliados em junho, fazia menção ao "controle de armas", mas o trecho acabou retirado.

Após a reunião desta terça, o petista apresentou 13 propostas para a área de segurança. Prometeu a retomada de Estatuto do Desarmamento e a recriação do Ministério da Segurança Pública.

Lula também prometeu a "implantação da patrulha Maria da Penha em cooperação com as Guardas Municipais para combater a violência contra as mulheres". "Os homens que gostam de bater em mulher que se preparem. Vamos ser mais duros com eles."

Atualmente, a campanha discute uma nova versão do programa de governo, com mais detalhes sobre as propostas da chapa de Lula e do candidato a vice, Geraldo Alckmin (PSB).

O texto atualizado foi apresentado na semana passada numa comissão do PT. O plano prevê o "respeito ao Estatuto do Desarmamento" e fala em revogar decretos "ilegais" de Bolsonaro que facilitaram o acesso às armas.

Há também um trecho que trata do enfrentamento ao crime organizado e a delitos ambientais. O documento, no entanto, ainda precisa passar pela análise dos demais partidos que compõem a coligação e por um pente fino de Lula e Alckmin.

Assim como ocorreu no programa registrado no TSE, há pressão entre aliados para que algumas citações sejam suprimidas. Para um dirigente de legenda aliada, a eventual revogação dos decretos num governo Lula não precisa estar necessariamente prevista num plano de governo.

Em seus discursos públicos, Lula tem afirmado querer propagar o amor contra o ódio e dito que o "Brasil precisa de livros em vez de armas", sem detalhar a ideia de revogar os decretos de Bolsonaro.

No primeiro dia da campanha eleitoral, o PT divulgou um vídeo de Lula nas redes sociais com o título "Menos armas, menos violência". Nele, o ex-presidente afirma que "ao invés de falar em distribuir armas, nós vamos distribuir livros".

O vídeo também resgata uma notícia do assassinato do militante petista Marcelo de Arruda, morto a tiros pelo policial penal Jorge Guaranho, apoiador de Bolsonaro. "Hoje, estamos vivendo um Brasil mergulhado na política do ódio e das armas. Um caminho perigoso que faz cada vez mais vítimas", diz um trecho da publicação na voz da narradora.

A pauta armamentista também tem sido evitada por Lula devido à tentativa de aproximação junto a ruralistas e a eleitores ligados ao agronegócio. A avaliação de interlocutores é que a parcela mais radical do setor —que defende o porte de armas irrestrito— já não vota em Lula e que, por isso, o tema não interessa à campanha.

Petistas afirmam que a maioria do partido entende que o porte é necessário em determinadas propriedades rurais. Temem, no entanto, que a posição seja distorcida por opositores e que isso seja usado para dizer que Lula é a favor da liberação das armas.

Para evitar a polêmica, a estratégia da campanha tem sido só falar do assunto quando provocada e dizer que Lula e Alckmin estão dispostos a debater o tema de forma ampla em um eventual governo.

Políticos também têm respondido que a questão ideológica é muito menor neste momento e que o grande desafio do setor agropecuário é reduzir os custos de produção, melhorar o acesso ao crédito e resolver problemas de infraestrutura.

Em entrevista ao Jornal Nacional, o ex-presidente criticou a política armamentista de Bolsonaro. "O Bolsonaro está ganhando alguns fazendeiros porque está liberando arma. Tem gente que acha que é bom ter arma em casa, que acha que é bom matar alguém. Não!"

Em abril, o petista cometeu uma gafe sobre policiais em seu discurso em evento para apoiadores. No momento em que fazia uma série de críticas a Bolsonaro, Lula afirmou que o atual mandatário "não gosta de gente, ele gosta de policial".

No dia seguinte, o ex-presidente se desculpou pela frase durante seu discurso em ato do 1º de Maio em São Paulo. "Quando eu estava fazendo o discurso, eu queria dizer que o Bolsonaro só gosta de milícia, não gosta de gente, e eu falei que ele só gosta de polícia, não gosta de gente", disse.

Bolsonaro sempre incentivou a compra de armas e costuma afirmar que um "povo armado é um povo livre". No ano passado, por exemplo, o presidente defendeu que todas as pessoas pudessem ter um fuzil.

Desde que assumiu o governo, o mandatário editou 19 decretos, 17 portarias, duas resoluções, três instruções normativas e dois projetos de lei que flexibilizam as regras de acesso a armas e munições.

Enquanto ampliam o acesso a armamentos, as medidas enfraquecem os mecanismos de controle e fiscalização de artigos bélicos. Uma das iniciativas, por exemplo, revogou três normas que melhoraram o rastreamento de armas e munições no país.

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