Aliados de Rodrigo e Tarcísio articulam salário 50% maior para governador com efeito cascata

Medida impacta outras carreiras e tem apoio de parte da oposição na Assembleia; pressão de policiais está por trás da iniciativa

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São Paulo

A base do atual Rodrigo Garcia (PSDB) e do futuro governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) na Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) articula, com apoio de parte da oposição, um aumento de salário de 50% para o titular do Palácio dos Bandeirantes no ano que vem com o objetivo de beneficiar categorias de servidores que ganham o teto.

O lobby vem principalmente de policiais, auditores fiscais e outras carreiras que atingem o topo do funcionalismo. Eles alegam que os salários estão sem reajuste desde 2019 devido ao congelamento do teto —o salário do governador representa o limite.

Embora nenhum estudo tenha sido apresentado, parlamentares falam em um impacto de R$ 1,8 bilhão ao ano para os cofres do estado.

Com a mudança, o salário do governador passaria de R$ 23 mil para R$ 34,6 mil; o de vice-governador sairia de R$ 21,9 mil para R$ 32,9 mil; e o dos secretários, de R$ 20,7 mil para R$ 31,1 mil. A medida tem efeito cascata sobre o salário dos servidores.

Parlamentares durante sessão da Alesp
Parlamentares durante sessão da Alesp - Divulgação-19.out.21/Alesp

Como mostrou a Folha, Tarcísio terá uma base confortável na Casa —63 das 94 cadeiras. Rodrigo, que declarou apoio incondicional no segundo turno a Tarcísio e a Jair Bolsonaro (PL), também tem maioria.

O projeto ainda teve apoio de deputados do PT, mas esbarrou na oposição de parlamentares do PSOL e do Novo, e não conseguiu quórum para avançar em duas tentativas de votação, na terça (8) e quarta (9).

Os deputados devem tentar votar o aumento em nova sessão após o feriado da Proclamação da República. Para aprová-lo, é preciso do aval de ao menos 48 deputados.

A proposta para aumentar o salário do governador é algo que cabe exclusivamente à Assembleia —não pode ser uma iniciativa do Executivo. O projeto em tramitação foi sugerido pelos deputados que compõem a mesa diretora da Casa no dia 19 de outubro, entre o primeiro e o segundo turno da eleição.

De acordo com deputados envolvidos nos trâmites, a ideia tem o aval de Rodrigo e também de Tarcísio —o funcionalismo da segurança pública é parte importante da base eleitoral do novo governador.

Já auxiliares do novo governador afirmam que a existência e a votação desse projeto não estavam no radar de Tarcísio, que tirou férias e só dará início à transição no dia 16 de novembro.

Questionada pela reportagem sobre a proposta, a assessoria de Rodrigo afirmou que não comentaria. A equipe de Tarcísio afirmou que a decisão cabe aos deputados e que acatará o que for definido pela Assembleia.

Nas duas tentativas de aprovação do projeto nesta semana, houve mais votos favoráveis de deputados de partidos ligados a Tarcísio (Republicanos, PL e PP) do que de partidos ligados a Rodrigo (PSDB e União Brasil). A bancada da bala votou sim em peso, mas não foi suficiente.

Segundo parlamentares ouvidos pela Folha, o projeto já serve para medir a articulação política do novo governador na Casa, mas eles negam que a não aprovação nesta semana signifique que Tarcísio ou Rodrigo não tenham uma base coesa e majoritária.

Aliados de Tarcísio na Assembleia dizem que a votação não deve ser considerada seu primeiro teste, já que ele não constituiu sua base nem indicou qual deputado deve ser seu líder de governo. Além disso, 39 dos 94 deputados serão novos na próxima legislatura, que começa em 15 de março. Ou seja, o plenário para Tarcísio será outro.

Os deputados dizem ainda que o fato de vários colegas não terem sido reeleitos e estarem no fim de mandato ou mesmo ausentes contribuiu para que a base de Rodrigo, que também está em suas semanas finais, tampouco se fizesse presente na votação.

Há reclamação, contudo, de que o novo governador ainda não fez acenos para os deputados eleitos e não buscou designar um canal de interlocução com a Casa. Mesmo as alterações que Tarcísio pretende fazer no Orçamento só chegarão à Assembleia depois do dia 16.

Além dos autores do projeto de aumento —Carlão Pignatari (PSDB), Luiz Fernando (PT) e Rogério Nogueira (PSDB), membros do comando da Casa—, também apoiaram a proposta os líderes de Republicanos, PL, PT, MDB, PP e PSDB. Foi uma forma de garantir a aprovação e de compartilhar entre as maiores bancadas eventuais créditos ou desgastes.

Por isso, a falta de quórum em duas sessões seguidas pegou os deputados das bases de Rodrigo e Tarcísio de surpresa —não esperavam que houvesse obstrução, o que obriga o comparecimento de mais deputados.

"É uma iniciativa da Alesp, um consenso, para atender várias categorias [que recebem o teto]. Mas tem deputados contra, pleiteando aumento para outras categorias também. Rodrigo e Tarcísio estavam sabendo e apoiam", disse Gilmaci Santos, líder do Republicanos.

"Não é só para consertar o salário do governador, mas de oficiais da PM e outras categorias, como auditores fiscais, que batem no teto do governador e não podem ter reajuste. É a forma de permitir que o salário desses servidores tenha reajuste", afirma Alex de Madureira (PL), para quem o projeto é um consenso entre deputados na Casa.

Delegado Olim (PP) diz que o aumento dado aos policiais não se refletiu aos delegados. "Nada mais justo que esse teto seja aprovado."

"É uma demanda de policiais militares, mas não só. É de todo o funcionalismo", afirma Major Mecca (PL), membro da bancada da bala.

Mônica Seixas, do PSOL, porém, rebate afirmando que não se pode votar o reajuste do teto antes de saber se os demais servidores estão incluídos nos reajustes previstos no orçamento.

"Num estado que não tem proposta para reajuste do salário mínimo, que o orçamento não prevê reposição salarial ou de pessoal de servidores públicos essenciais como na saúde, educação e segurança pública, é de assustar a chegada na iminência de um novo governo e em regime de urgência sem qualquer debate um aumento no montante de 50% do salário do governador e do teto do estado de São Paulo", afirmou a deputada Mônica Seixas.

Ricardo Mellão, do Novo, segue na mesma linha, afirmando que o aumento na direção contrária da perda de renda da população.

"Fora que está ainda muito acima da inflação do período, de cerca de 18%. Pior ainda tentarem aprovar isso às pressas, sem apresentar um único estudo de impacto do efeito em cascata que o aumento gerará ao beneficiar diversos servidores que já ganham o teto", disse.

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