Descrição de chapéu Legislativo Paulista Folhajus

Presidente da Assembleia de SP negociou com condenado por desvios, mostram grampos

Deputado Carlão Pignatari, aliado de Doria, diz que telefonemas foram antes de assumir cargo no Legislativo

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São Paulo

Ligações telefônicas interceptadas pela Polícia Civil de São Paulo e reveladas pelo jornal O Estado de S. Paulo mostram que o presidente da Assembleia de São Paulo, Carlão Pignatari (PSDB), negocia a entrega da administração de dois hospitais para o médico Cleudson Garcia Montali, condenado pelo desvio de R$ 500 milhões em recursos de saúde por meio de organizações sociais ligadas a ele.

Pignatari é aliado do governador João Doria (PSDB) e integra o núcleo duro da campanha do tucano à Presidência da República. O deputado não é investigado no inquérito da polícia sobre o caso.

Já Montali é apontado como líder da organização criminosa investigada pela Operação Raio-X, desencadeada em setembro de 2020 e que mirou o ex-governador Márcio França (PSB) em sua fase mais recente. O pré-candidato ao Governo de São Paulo foi alvo de busca e apreensão.

As conversas teriam ocorrido em 2019, portanto antes da operação da polícia e do deputado assumir o comando do Legislativo paulista. Em nota, ele diz que não é investigado nessa operação policial, informação confirmada pela polícia.

O presidente da Alesp, Carlão Pignatari, do PSDB
O presidente da Alesp, Carlão Pignatari, do PSDB - Alesp

O esquema estendia-se a cidades paulistas e de outros estados como Paraná, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e Pará. Nesse estado, o próprio governador Helder Barbalho (MDB) estava entre os investigados e foi um dos alvos de operação desencadeada pela Polícia Federal em 2020.

Até agora, 48 pessoas foram denunciadas pelo Ministério Público e, dessas, 19 foram condenadas pela Justiça.

Tido como líder do esquema inicial, Montali, de Birigui (SP), foi condenado a 104 anos de prisão por uma série de irregularidades nos contratos com equipamentos de saúde de 27 cidades, incluindo Santas Casas. Ele também foi condenado a ressarcir os cofres públicos em R$ 947 mil.

Em nota, Pignatari afirma que as conversas são de 2019, antes das suspeitas contra Montali virem à tona e que ele não ocupava a presidência da Assembleia na ocasião –o tucano era líder do governo Doria à época. O deputado diz ainda não ser investigado na Operação Raio-X.

"Não houve qualquer ilegalidade em sua conduta e jamais teve interferência em qualquer processo de contratação", afirma a assessoria do deputado em nota.

O deputado, por meio de nota, declarou repudiar "a tentativa eleitoreira de associá-lo a condenáveis desvios de recursos da saúde pública, que tem o único objetivo de tumultuar as investigações em andamento, a qual sabe-se quem é o verdadeiro foco —e não é o deputado".

A nota faz referência à França. Nos bastidores, porém, tucanos próximos a Doria admitem um desgaste para a campanha com os grampos.

Uma das conversas entre o médico e Pignatari ocorreu em 22 de maio de 2019. Pignatari sugere que alguma organização social ligada à Montali assuma a administração de um hospital em Santa Fé do Sul (SP).

Em junho daquele ano, em nova conversa, Pignatari se propõe a apresentar a Montali um deputado para intermediar a negociação do médico para administrar o Hospital Regional de Ferraz de Vasconcelos. Em novas ligações naquele mês, Montali dá satisfações a Pignatari sobre ambos os negócios.

Segundo a reportagem, Pignatari e Montali também conversam, em 27 de junho, sobre o Ambulatório Médico de Especialidades (AME) de Carapicuíba. O presidente da Assembleia informa ao médico que "amanhã sai a publicação no Diário Oficial", e Montali agradece.

No dia 29 de junho, sai publicado o contrato para a administração do AME por organização social ligada ao médico. Dias antes, o grupo de Montali havia sido declarado vencedor da concorrência pela secretaria estadual de Saúde.

Em 2018, Montali foi ouvido na Assembleia pela CPI das Organizações Sociais da Saúde a respeito de investigações envolvendo a Santa Casa de Birigui e negou que houvesse irregularidades. Pignatari era suplente na comissão.

"O inquérito principal da operação inclusive já foi encerrado, resultando em mais de 160 novos inquéritos, sendo que o parlamentar não é investigado em nenhum deles. Não possui, portanto, qualquer relação com o caso", afirma a assessoria do tucano em nota.

A nota afirma ainda que o presidente da Assembleia "apoia a irrestrita investigação da Operação Raio-X e reitera sua correta conduta em sua trajetória parlamentar".

A Folha também teve acesso a dados da Operação Raio-X referente a Márcio França, em investigação na qual a polícia vê elo entre o ex-governador e Montali.

Entre os pontos citados pela polícia na apuração está a presença de França em um almoço no qual compareceu também Montali, em março de 2020, em Belém (PA). A polícia avalia que o encontro em Belém poderia ter ligação com o financiamento da campanha de França a prefeito de São Paulo.

"[...] entrou no nosso radar que a orcrim [organização criminosa] bancaria, pelo menos em parte, a campanha eleitoral de Márcio França à prefeitura de São Paulo, tendo como fonte dinheiro público desviado da área da saúde, que inclusive levou o próprio França a se reunir com a cúpula da Orcrim em Belém, e, posteriormente, em São Paulo", diz relatório da investigação.

Procurado pela Folha, França admitiu ter participado de um almoço no qual Montali estava presente, mas disse que não tem relações ou proximidade com ele.

"Eu fui ao Maranhão, às minhas custas, em avião de carreira, num encontro partidário como dirigente e, de lá, fui ao Pará, também em voo comercial, para almoço com várias pessoas do Governo do Estado do Pará. Nesse almoço, estava Cleudson", afirmou à Folha, em nota.

França disse que a investigação é uma ação política.

"‘Pode ser, supostas conversas... Teria sido’. O que se vê no relatório de 212 páginas vazado para a imprensa é um festival de absurdos, suposições e insinuações, sem nenhuma prova para me incluir em uma operação que, na verdade, contra mim, só teve cunho político eleitoral", diz em nota.

O ex-governador diz que são milhares de minutos de escutas "sem que uma única vez apareça a minha voz ou meu telefone". "São três anos de investigação de um delegado 'Dalagnol 2', querendo incluir um político conhecido, numa apuração sem vínculo algum para sustentar tal intento", afirmou, em nota.

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