Fala de Pacheco a Lula sobre Congresso progressista contraria números e histórico

Bancada que assume em fevereiro mantém inclinação à direita; posição do governo tem forte poder de influência

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Brasília

Apesar de o perfil de deputados e senadores que tomam posse em fevereiro se assemelhar ao atual, de maioria conservadora, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou neste domingo (1º), em seu discurso na posse de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que o petista se relacionará com um Congresso progressista e reformista.

"Senhor presidente, sou testemunha de que o senhor encontrará um parlamento progressista e reformista, que defende mulheres, combate o racismo, demonstra preocupação com as causas ambientais", discursou o senador, ao lado de Lula.

Presidente da Câmara e líder do conservador centrão, Arthur Lira (PP-AL) também estava na mesa e indicou concordar com o diagnóstico de Pacheco, balançando a cabeça afirmativamente no momento da fala do senador.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), na cerimônia de posse do petista, no Congresso - Mauro Pimentel-1.jan.23/AFP

A fala de Pacheco sobre o reformismo encontra algum amparo no perfil do Congresso, em especial nos temas da agenda liberal. Em 2019, deputados e senadores aprovaram a maior alteração das regras previdenciárias da história. Agora, prometem novamente discutir a reforma tributária a partir deste ano.

Em sua fala neste domingo, Pacheco citou, na parte do reformismo, os marcos legais do câmbio, do saneamento, das ferrovias e da cabotagem, entre outros.

Já a menção à inclinação progressista contraria os números e o histórico do Congresso, embora tradicionalmente o Executivo tenha forte influência sobre a agenda do Legislativo.

Três das principais bancadas do Congresso —a ruralista, a evangélica e a da bala— são pautadas por diretrizes conservadoras, sendo algumas delas claramente retrógradas. Foi preciso, por exemplo, que o Judiciário decidisse tornar crime a homofobia em 2019, diante da omissão de décadas de deputados e senadores.

Na Câmara e no Senado, a esquerda, que defende as pautas reunidas no rótulo "progressista", como maior proteção ao meio ambiente, aos indígenas, às minorias e aos direitos humanos, entre outras, não controla mais do que um terço das cadeiras. Ou seja, número insuficiente para que esses temas avancem.

Essa divisão tende a se repetir na legislatura que se inicia em fevereiro, com reforço da ala ultrarretrógrada do bolsonarismo.

O PL de Bolsonaro elegeu as maiores bancadas na Câmara e no Senado, com nomes bastante afinados ao ex-presidente da República e às suas ideias, como Damares Alves (DF) no Senado e Nikolas Ferreira (MG) na Câmara.

Sob Bolsonaro, não houve nem tentativa de aprovação de projetos da chamada pauta progressista. Pelo contrário, parlamentares críticos de Bolsonaro atuaram para resistir à agenda de costumes ou a projetos liberais na economia.

Nesse sentido, a Câmara de Lira se mostrou muito mais alinhada ao bolsonarismo —o próprio presidente da Casa foi aliado próximo a Bolsonaro, embora tenha agora se inclinado para o lado de Lula.

A agenda conservadora só não teve sucesso relevante porque vários dos projetos foram barrados pelo Senado.

Pacheco adotou uma linha mais independente do que Lira em relação ao governo e não colocou para andar temas de apreço do bolsonarismo, como o afrouxamento de regras ambientais e fundiárias, facilitação de mineração em terras indígenas e a educação domiciliar.

O presidente do Senado foi um importante defensor das instituições e do Judiciário contra os ataques autoritários de Bolsonaro e de bolsonaristas. Embora não tenha declarado abertamente, integrou o grupo político que, na eleição presidencial, se inclinou para o lado de Lula.

Ainda na campanha, manifestou publicamente o compromisso de que o resultado das eleições seria respeitado e que o eleito tomaria posse.

Embora a fala de Pacheco sobre um Congresso progressista possa soar hoje como ilusão, é tradição que o Executivo tenha certa influência sobre o Congresso. Ou seja, com Lula e a esquerda no poder, pode haver uma inclinação do Congresso mais para esse campo.

Isso se dá porque boa parte dos partidos de centro e centro-direita movem suas atuações muito mais por interesses fisiológicos e eleitorais do que ideológicos.

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