Descrição de chapéu Folhajus ataque à democracia

Sociedade civil reage em peso contra ação golpista de bolsonaristas

Evento na USP, com representantes de diversas entidades, reuniu mais de 800 pessoas; ato no Masp atraiu multidão

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São Paulo e Rio de Janeiro

Aplaudido de pé no salão nobre da Faculdade de Direito da USP, o reitor da universidade, Carlos Gilberto Carlotti Junior, declarou o que todos no ambiente esperavam ouvir: "Não há nem haverá anistia".

Estava se referindo à necessidade de punir os apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) que, no domingo (8), invadiram o Palácio do Planalto, o Congresso e o STF (Supremo Tribunal Federal), deixando os prédios vandalizados.

Os criminosos, estimulados pela retórica golpista de Bolsonaro, não se conformam com a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que tomou posse no dia 1º de janeiro.

Ato em defesa da democracia na Faculdade de Direito da USP
Ato em defesa da democracia na Faculdade de Direito da USP - Eduardo Knapp/Folhapress

"A depredação só serviu para cobrir nossa pátria de vergonha", sustentou o reitor. "Não podemos, de forma nenhuma, deixar prevalecer a impunidade", continuou.

Mais de 800 pessoas acompanharam suas declarações, num evento em defesa da democracia convocado na véspera. Vez ou outra, suas palavras eram interrompidas por aplausos e gritos da plateia, com o bordão "Sem anistia!", que seria repetido no fim da tarde durante ato em frente ao Masp, na avenida Paulista, também em São Paulo.

O reitor concordava. "Estamos aqui para defender o Estado democrático de Direito. Expressar nosso repúdio aos atos de terrorismo." Falava em nome não apenas da USP mas também das outras duas universidades estaduais paulistas, a Unesp e a Unicamp.

Embora tenha sido organizado de última hora, o ato em defesa da democracia atraiu diversas organizações da sociedade civil e personalidades, homenageadas a figura do padre Júlio Lancellotti.

Carlotti continuou seu discurso duro: "Estamos aqui para exigir, sem meias palavras, que os responsáveis pelos crimes de barbárie sejam, todos eles, seus financiadores e seus agentes, diretos ou indiretos, investigados e punidos na forma da lei".

Padre Julio Lancellotti é homenageado em ato em defesa da democracia, no salão Nobre da Faculdade de Direito da USP; ao lado, Juca Kfouri, colunista da Folha, aplaude - Eduardo Knapp/Folhapress

Relembrando que, no dia 11 de agosto de 2022, milhares de pessoas compareceram ao mesmo local para repudiar um "golpismo que já se ensaiava", disse que o evento realizado ao meio-dia desta segunda-feira (9) tinha o intuito de "barrar atos ainda piores".

Não foi outro o tom de Celso Fernandes Campilongo, diretor da Faculdade de Direito. Definindo a ação dominical bolsonarista como "atos de violência, atos de ódio, crimes de desrespeito à ordem constitucional, ao estado democrático de direito e à cidadania no Brasil", ele também cobrou punição.

"Responsabilização administrativa para aquelas que ocupam funções públicas. Responsabilização civil, indenização aos cofres públicos. E especialmente as penas da lei para aquelas que tentaram o fracassado golpe de estado ontem", disse.

Por inevitável, Campilongo também mencionou o 11 de agosto, mas para olhar adiante. Se há cinco meses se adotou uma medida preventiva, disse o diretor, hoje o mote é outro. "Hoje é a tônica do revigoramento da democracia", afirmou.

Ao lado da vice-diretora da faculdade, Ana Elisa Bechara, Campilongo encerrou seu discurso com outro bordão, repetido em brado pelo auditório lotado: "Não passarão".

Outra oradora do evento na USP, Patricia Vanzolini, presidente da seccional de São Paulo da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), deu a senha para sua categoria: "É importante que toda a comunidade jurídica fale em uníssono: é golpe e é crime. Não é liberdade".

O evento contou ainda com discursos de outras lideranças, entre as quais Ricardo Patah (União Geral dos Trabalhadores), Manuela Morais (Centro Acadêmico XI de Agosto), José Carlos Dias (Comissão Arns), Mário Sarrubo (procurador-geral de Justiça de SP), Cláudio da Silva (ouvidor das polícias de SP) e Oscar Vilhena Vieira, professor de direito da FGV e um dos articuladores de um manifesto que, cinco meses atrás, agregou mais de cem entidades em defesa da democracia.

Vieira também integra o Comitê de Defesa da Democracia, entidade que nesta segunda divulgou nota em que define como crime o protesto de bolsonaristas no domingo.

"A invasão e depredação do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal, por vândalos e com a grave conivência de autoridades do Distrito Federal, configura a tentativa criminosa de abolir, mediante violência, o Estado democrático de Direito", diz o texto.

"A resposta de repúdio da sociedade tem de ser contundente, exigindo que todos que tomaram parte nesta absurda sedição, por ação ou omissão, sem exceção, sejam submetidos aos rigores da lei", continua a nota.

No fim da tarde, no ato em frente ao Masp, o grupo de manifestantes fechou a pista sentido centro da avenida Paulista, na altura da alameda Campinas.

Ao som de músicas do grupo de rap Racionais MCs e de artistas da MPB como Djavan, os manifestantes se misturaram com ambulantes, que vendem toalhas, faixas e bandeiras com o rosto do presidente Lula. Xingamentos dirigidos a Bolsonaro e o bordão "sem anistia" eram as palavras de ordem.

O ato contou não só com movimentos sociais, estudantes e sindicatos mas também torcidas organizadas —a chegada de integrantes da Gaviões da Fiel foi celebrada por parte dos manifestantes. Bandeiras de partidos políticos, como PSOL e UP, também compuseram a paisagem.

Ato contra ataques golpistas na av. Paulista, em São Paulo - Mathilde Missioneiro/Folhapress

No Rio de Janeiro, centenas de cariocas se reuniram na noite desta segunda-feira (9), na Cinelândia, no Centro. A palavra de ordem"sem anistia" foi ouvida no local e se dirigia aos presos em flagrante na noite deste domingo (8) pelos ataques golpistas em Brasília.

Os manifestantes também pediram punição ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), e cobraram punição a supostos financiadores de atos golpistas.

O ato que reuniu populares, professores, entidades estudantis, parlamentares e representantes de frentes sindicais, resistiu à chuva em protesto em frente à Câmara de Vereadores.

Em reação ao golpismo, diversas entidades divulgaram notas de repúdio no próprio domingo. Foram centrais sindicais, organizações da sociedade civil, universidades e entidades empresariais e da comunicação que pediram responsabilização de financiadores e participantes.

A mobilização contra a tentativa de golpe de Estado e o vandalismo atraiu até entidades representativas do agronegócio, com frequência apontadas como simpáticas a Bolsonaro.

Ao longo desta segunda, inúmeras organizações empresariais engrossaram a lista de repúdio à destruição das sedes dos três Poderes, com pedidos de responsabilização dos envolvidos. Entidades como o Instituto Não Aceito Corrupção também divulgou nota.

A própria Faculdade de Direito da USP se manifestou com uma nota assinada por Celso Fernandes Campilongo e Ana Elisa Bechara.

No texto, eles classificaram os atos de domingo como "lamentáveis, criminosos e terroristas", dizendo que foram "praticados por irresponsáveis contra o Estado de Direito e as instituições da República".

Clamando pela "imediata restauração da ordem e rigorosa aplicação da lei contra os infratores e inimigos da democracia", Campilongo e Bechara afirmaram que os atos não podem ser tolerados e devem ser punidos com urgência e rigor.

Eles encerraram o texto com o bordão "Democracia sempre!", que remete à formulação "Estado de Direito sempre", utilizada ao final da carta lida no dia 11 de agosto do ano passado na própria Faculdade de Direito da USP.

Era então uma reação ao discurso golpista de Bolsonaro, que questionava as urnas eletrônicas e ameaçava não reconhecer a eleição.

A expressão "democracia para sempre" também foi usada por Lula em seu discurso de posse na semana passada.

Manifestações a favor da democracia foram registradas nesta segunda-feira em diversas capitais brasileiras.

Em Salvador, manifestantes se concentraram na praça do Campo Grande, centro da cidade, com mensagens de apoio ao presidente Lula e defendendo que os vândalos não sejam anistiados.
Sindicatos, movimentos sociais, estudantes e partidos de esquerda, incluindo o PT, participaram do protesto.

Um boneco representando o ex-presidente Bolsonaro atrás das grades foi levado para o protesto.
Já no Rio de Janeiro, manifestantes pró-democracia também ocuparam, debaixo de chuva, a praça da Cinelândia, no centro, e as escadarias da Câmara. Em cartazes, eles também pediram "não à anistia" de envolvidos na invasão golpista em Brasília e a punição de Bolsonaro.

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