Pacheco vê estímulo de Bolsonaro em ataques e diz que sua candidatura representa democracia

Presidente do Senado, em busca da reeleição na quarta (1º), afirma que houve 'a preparação de uma ruptura institucional'

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Brasília

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirma que o conjunto de ações antidemocráticas, que teve como ápice o ato golpista de 8 de janeiro e a descoberta de uma minuta para decretar estado de defesa, mostra que houve preparação para uma ruptura institucional.

"Eu considero que essa posição firme do Senado em defesa da democracia é o grande legado que o Senado deixa para essa quadra histórica e triste do Brasil, em que houve a pretensão concreta da ruptura institucional e da implantação de uma ditadura", afirma em entrevista à Folha.

O presidente do Congresso, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), durante entrevista à Folha na residência oficial da presidência do Senado - Gabriela Biló/Folhapress

O senador diz não querer ser leviano de fazer acusações concretas contra Jair Bolsonaro (PL), mas diz que o ex-presidente estimulou a divisão da sociedade brasileira em diversos momentos e foi, no mínimo, incapaz de conter o extremismo de seus apoiadores.

"Foram comportamentos evitáveis para um presidente da República e que podem ter sim estimulado essa divisão no Brasil, a ponto de se ter o extremismo que culminou no ato de 8 de janeiro."

Candidato para mais dois anos na presidência do Senado contra o bolsonarista Rogério Marinho (PL-RN), Pacheco evita associar o adversário aos atos golpistas, mas afirma que é sua candidatura à reeleição que "representa a defesa do Estado de Direito e da democracia".

Como o sr. soube o que estava acontecendo naquele 8 de janeiro e em que momento teve dimensão da gravidade? Eu estava em viagem de férias, já estava atento e monitorando, em razão do trabalho da Polícia Legislativa, que anteviu uma manifestação e algumas afirmações de que poderia haver invasão. No domingo, eu recebi um comunicado do nosso diretor-geral [da polícia] dizendo que estavam na iminência de invadir o prédio. Imediatamente telefonei para o governador Ibaneis Rocha indagando providências. Ele disse que estava buscando fazer a reação devida e com todas as tropas nas ruas.

Eu então organizei imediatamente meu retorno ao Brasil porque, desde o primeiro momento, quando recebi as primeiras imagens, já vi a gravidade do fato. No dia anterior, eu encaminhei uma mensagem ao governador dizendo da nossa preocupação. E ele me respondeu que todas as tropas estariam nas ruas, que ficaria tudo sob controle, para que eu ficasse tranquilo. Por isso a minha convicção de que o governador, nesse episódio todo, pode ter sido induzido a erro.

Nesse momento, o sr. achava que era um movimento de arruaça ou um golpe? Ambos. Evidentemente que, além da arruaça, da depredação, da invasão, do atentado ao prédio físico e à moral dos Poderes, era um atentado à nação brasileira. E evidentemente os desdobramentos daquilo que nunca antes tinha sido visto poderiam ser inimagináveis. Naquele instante nós não afastamos nenhuma possibilidade.

O sr. sempre evitou confrontar Bolsonaro por suas falas antidemocráticas, dizendo que preferia combater o discurso ao personagem. Agora que conhecemos na prática o impacto da retórica do ex-presidente, acha que errou? Numa atuação, qualquer que seja, e no meu caso como presidente do Senado, há erros e acertos. Mas o que eu afirmo sempre é que todas as minhas ações, acertadas ou não, foram pautadas na boa intenção. Eu sempre preguei a pacificação, o equilíbrio entre os Poderes. E a minha postura sempre reativa ao discurso e a ideias antidemocráticas foi no sentido de não permitir que elas se disseminassem no Brasil.

No caso de um chefe de Poder, cuja obrigação é se relacionar bem com os demais chefes de Poderes, considero que temos que nos posicionar em relação às ideias e às ações, e não levar para um campo de críticas pessoais. Isso poderia descambar para coisas piores, inclusive agravar a situação de animosidade que já existia.

E havia, de fato, e se comprova hoje isso, um sentimento muito verdadeiro, concreto, real, que não estava no campo das bravatas em relação a atos antidemocráticos e à perspectiva de uma ruptura institucional no Brasil. Tanto que até uma minuta de golpe de Estado foi encontrada. Isso é revelador de que, para além da cogitação, houve de algum modo a preparação para uma ruptura institucional.

E qual é o papel do ex-presidente nisso? Jair Bolsonaro, presidente da República, líder de um segmento de direita, e infelizmente não foi capaz de conter o extremismo desse movimento dele, [que foi] capaz de fazer coisas como [as que] aconteceram no dia 8 de janeiro. Eu não vou ter a leviandade de afirmar alguma responsabilidade direta sobre os atos, porque isso depende de uma apuração.

Mas, em termos de movimento político, o presidente Jair Bolsonaro foi incapaz de conter o radicalismo, o extremismo daqueles que o admiram. E esse era o papel de um grande líder político que se impunha: conter espírito antidemocrático, conter ações antidemocráticas e esse radicalismo que se vê hoje, raivoso, com bastante ódio, desrespeito às instituições e às pessoas.

O sr. fala em não conter o radicalismo, o que passa a ideia de passividade, e não de ação. Acha que ele não influenciou o movimento que resultou em 8 de janeiro? Eu considero que o presidente Jair Bolsonaro não foi capaz de conter a exaltação, o radicalismo, o extremismo de grupos, de adeptos seus. E, em alguns momentos, o comportamento dele na Presidência da República estimulou a divisão e a separação da sociedade brasileira, quando, por exemplo, agrediu o Supremo Tribunal Federal, os seus ministros.

Então foram comportamentos evitáveis para um presidente da República e que podem ter sim estimulado essa divisão no Brasil, a ponto de se ter o extremismo que culminou no ato de 8 de janeiro.

O sr. vai disputar a presidência do Senado com um ex-ministro do governo Bolsonaro. Que papel teve Rogério Marinho nesse contexto de radicalização e extremismo? Eu prefiro falar da minha imagem, do meu propósito. A minha candidatura é a que representa a defesa do Estado de Direito e o fortalecimento da democracia no país. É a candidatura que acredita nas urnas eletrônicas, na ciência, que respeita os pares, que busca a união do país, que busca respeitar as demais instituições, que busca estabelecer limites através da legislação e não do revanchismo, da retaliação a outro Poder.

E esses personagens da política que foram criados nos últimos anos a partir desse extremismo de direita, que são personagens sem compromisso com resultados, com solução, e só querem angariar likes em rede social, encontrarão seguramente o seu caminho: vão ser desmascarados, alguns até presos, porque atacam a democracia e o Estado de Direito.

No calor do 8 de janeiro, governistas conseguiram assinaturas para uma CPI, mas agora se deram conta de que pode atrapalhar o início do governo Lula. O que o sr. vai fazer? Se há um fato que justificaria uma CPI é esse atentado contra a democracia para se identificar quem financiou, colaborou, agiu diretamente ou indiretamente. Eu considero que há fato determinado, que é um fato robusto, de grande magnitude, que justificaria uma CPI, de modo que, havendo número de assinaturas suficientes, há absolutamente a pertinência da comissão.

Se, sob o ponto de vista político, houver a conclusão de que uma CPI no início de um governo talvez não seja um bom caminho, essa é uma construção política que terá que ser feita não pelo presidente do Senado, mas por todos os líderes.

Ou seja, se o governo quiser matar a CPI, ele que retire assinaturas e que não dependa do sr. para segurar a instalação. Ou retirem as assinaturas ou, eventualmente lido [o requerimento], não haja indicação de membros para a comissão. E aí há a opção de não se instalar, que é uma opção política, legítima e que já aconteceu diversas vezes. Mas eu considero que, da forma como está, não há o que eu possa fazer. Não cabe ao presidente do Senado fazer esse juízo de se evitar a CPI.

O que considera a principal marca da gestão do sr.? A maior obra do Senado nesses últimos dois anos foi a defesa da democracia, das instituições brasileiras, de o Senado não ter se permitido aderir a um discurso de questionamento da Justiça Eleitoral, das urnas eletrônicas. De termos afirmado a todo instante que o resultado da urna seria respeitado e que, no dia 1º de janeiro, o presidente eleito, quem fosse, seria empossado.

Eu considero que essa posição firme do Senado em defesa da democracia é o grande legado que o Senado deixa para essa quadra histórica e triste do Brasil, em que houve a pretensão concreta da ruptura institucional e da implantação de uma ditadura no Brasil. Inclusive com ação concreta, que foi a aprovação da Lei do Estado de Direito, em substituição à Lei de Segurança Nacional, que permite que hoje esses criminosos que invadiram o Congresso não sejam enquadrados apenas em crime de dano ou coisa que o valha.

Como será a relação do Senado com o governo, considerando que o PSD é da base e um dos principais aliados do sr. em MG, Alexandre Silveira, é ministro? Eu espero que seja uma relação de harmonia, de respeito, mas de independência entre os Poderes. O presidente buscará ter a base necessária no Senado para aprovação das matérias e, dentro dessa base, nós vamos construir as soluções para o país. Mas algo que é do meu perfil, que é do meu temperamento, que é o respeito a todos.

Então evidentemente que, assim como foi nessa legislatura, eu respeitarei muito também a oposição. Haverá tratamento uniforme a todos os senadores. O papel do presidente do Senado não pode ser o de base de governo ou de líder de governo. Tampouco pode ser de líder de oposição. Eu devo arbitrar e ser o magistrado das soluções do país. Então, tudo aquilo que vier do Executivo como algo possível e provável para a melhora da qualidade de vida das pessoas, nós vamos fazer de bom grado.

Essa arbitragem e essa diplomacia muitas vezes foram confundidas com falta de posicionamento, ficar em cima do muro? Eu acho que, em todos os temas, eu tive posições. Às vezes não eram as posições esperadas. Ou com a forma que se esperava que fosse. Mas aí eu não posso fazer [nada], é impossível agradar a todo mundo. Mas eu sempre tive as minhas posições, e elas sempre foram norteadas na defesa do Poder Legislativo e na defesa do Senado. Nós vamos manter nossas posições.

E esse jeito, que alguns dizem que é o jeito mineiro, você está dizendo que é um jeito diplomático, esse jeito vai continuar porque esse é o meu perfil, esse é o meu temperamento, esse é o meu jeito. E não é em cima do muro. Às vezes a gente tem que estar acima do muro e buscar a solução, e não jogar gasolina na fogueira, jogar água na fervura é melhor.

O sr. chegou a anunciar um plano para aprovar a reforma tributária em seis meses, o que não ocorreu. Por que a situação agora é diferente? Porque agora nós temos uma manifestação concreta do governo federal de que quer fazer a reforma tributária. As PECs do Congresso nunca tiveram apoio explícito no governo anterior. E é fundamental em reforma tributária se ter o apoio explícito e a clareza do que se quer por parte do Executivo, que é o Poder responsável pela arrecadação. O Poder Legislativo é obviamente quem decide, mas isso precisa ser feito a quatro mãos com o Poder Executivo.

RAIO-X

Rodrigo Pacheco, 46
Nascido em Porto Velho (RO), mas criado em Passos (MG), Rodrigo Pacheco (PSD) é o atual presidente do Senado e busca a reeleição em 1º de fevereiro. Advogado criminalista, foi eleito deputado federal em 2014 e presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara. Foi eleito em 2018 para o Senado, onde se tornou líder da bancada do DEM, seu antigo partido

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