Conselho da Meta diz que empresa errou ao manter no ar vídeos golpistas no Brasil

Segundo plataforma, falta de pontuação nas frases do vídeo poderia ter levado moderadores a interpretar erroneamente o conteúdo como neutro

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São Paulo

O Conselho de Supervisão da Meta (Oversight Board) afirmou nesta quinta-feira (22) que a plataforma errou ao não remover vídeos que incitavam a invasão e os ataques a Brasília e que não cumpriu suas próprias regras de proibição de incitação à violência.

"[A Meta] não fez o suficiente para combater o potencial abuso de suas plataformas por meio de campanhas coordenadas como as que vimos no Brasil", disse o conselho de supervisão, que analisa decisões sobre moderação de conteúdo no Facebook e Instagram e estabelece precedentes.

O órgão é independente, mas financiado pela Meta. "A remoção deste conteúdo e outros similares é necessária e proporcional para proteger o direito dos brasileiros ao voto e a participar na vida pública."

Congresso é tomado com uma faixa pedindo intervenção - Gabriela Biló - 8.jan,23/Folhapress

A decisão se refere a um vídeo postado no Facebook, no dia 3 de janeiro, em que um general convocava as pessoas a "sitiar" o Congresso como "última alternativa" após a posse do presidente Lula (PT).

Segundo a decisão do conselho, o vídeo mostra um general fazendo um discurso em que conclama as pessoas a "irem às ruas" e "irem ao Congresso e ao Supremo Tribunal Federal".

Ainda segundo o conselho, o vídeo mostra imagens de um incêndio na Praça dos Três Poderes com a legenda "Venha para Brasília! Vamos sitiar os três poderes".

O conteúdo foi assistido mais de 18 mil vezes. O vídeo também questionava o sistema eleitoral, com os dizeres "exigimos o código-fonte", frase usada por apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) para indicar supostas vulnerabilidades das urnas eletrônicas.

Cinco dias depois de o vídeo ser postado no Facebook, em 8 de janeiro, milhares de pessoas invadiram e vandalizaram o Congresso, o STF (Supremo Tribunal Federal) e o Palácio do Planalto em Brasília, contestando o resultado da eleição presidencial e pedindo intervenção militar.

No dia em que o vídeo foi postado, um usuário denunciou o conteúdo por violar as regras de comunidade sobre violência e incitação, que vedam chamados para entrar à força em locais de alto risco. No total, quatro usuários denunciaram o conteúdo sete vezes entre 3 e 4 de janeiro.

Após a primeira denúncia, o conteúdo foi analisado por um moderador, que concluiu que o vídeo não violava as regras da plataforma.

O usuário recorreu da decisão, mas ela foi mantida por um segundo moderador. No dia seguinte, as seis outras denúncias foram analisadas por cinco moderadores diferentes, e todos concluíram que o vídeo não violava as políticas da Meta e, portanto, não seria removido.

Em 9 de janeiro, um dia após os ataques em Brasília, a Meta declarou que a invasão de 8 de janeiro era um "evento violatório" segundo sua política de organizações e indivíduos perigosos, e afirmou que passaria a remover "conteúdo que apoia ou elogia essas ações".

A plataforma também anunciou que tinha designado o Brasil como "local de alto risco temporário" e que "estava removendo conteúdo conclamando pessoas a pegarem em armas ou invadirem à força o Congresso, o palácio presidencial e outros prédios do governo".

Depois que o conselho selecionou esse caso para análise, a Meta afirmou que suas várias decisões de manter online o conteúdo golpista tinham sido um erro. A Meta só removeu o vídeo em 20 de janeiro, mais de duas semanas após ele ser postado.

Procurado, o conselho afirmou que não poderia compartilhar o vídeo por causa das regras de privacidade de usuários.

A Meta, em suas manifestações sobre propostas de regulação de redes sociais no Brasil, afirma que a plataforma já possui ferramentas para moderar de forma eficiente conteúdo que viole suas regras.

"Este caso gera preocupações sobre a eficiência dos esforços de integridade eleitoral da Meta na eleição do Brasil em 2022 e em outros locais", disse o conselho em sua decisão.

O conselho afirmou que a decisão da Meta de manter o conteúdo online em um período de aumento na violência política foi "um claro rompimento de suas próprias regras".

O órgão também manifestou preocupação pela falta de transparência da empresa. Quando o conselho requisitou à Meta informações sobre conteúdo eleitoral na plataforma, "a empresa explicou que não tinha dados sobre a prevalência" dessas postagens.

RECOMENDAÇÕES

Entre as recomendações do conselho, que não são vinculantes, está o desenvolvimento de ferramentas que permitam à Meta medir a eficiência de seus esforços de integridade eleitoral e divulgar as avaliações ao público "para impedir que suas plataformas sejam usadas para promover violência política".

O órgão também sugeriu que a Meta inclua o período pós-eleitoral nesses esforços, para proteger a transição pacífica do poder. O Centro Operacional de Eleições só funcionou em períodos entre setembro e novembro de 2022 no Brasil.

Em esclarecimento, a Meta disse ao conselho que os sete moderadores que não acharam necessário remover o vídeo golpista estavam baseados na Europa, mas eram fluentes em português e tinham conhecimento cultural para analisar conteúdo brasileiro.

Segundo a Meta, a falta de pontuação nas frases do vídeo poderia ter levado os moderadores a interpretarem erroneamente o conteúdo como neutro. A Meta admitiu que muitos moderadores não assistem à íntegra dos vídeos.

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