Movimentos da sociedade civil questionaram a indicação de Cristiano Zanin ao STF (Supremo Tribunal Federal), confirmada por Lula (PT) nesta quinta-feira (1º), e reforçaram a cobrança pela nomeação de uma mulher negra na corte.
A organização Mulheres Negras Decidem defende nomes de juristas negras que considera capacitadas. "Hoje, temos grandes nomes validados e impulsionados por dezenas de movimentos, coletivos e organizações. Eis a lista tríplice do povo: Lívia Santana e Sant’Anna Vaz, Adriana Alves dos Santos Cruz e Soraia da Rosa Mendes", diz nota.
Para a entidade, a indicação de um ministro do STF é um ato político, e a presença de juristas negras repararia um dano histórico. "Desde a redemocratização, há 130 anos, não houve uma única jurista negra que tenha exercido o cargo de ministra da Suprema Corte."
Além de histórica, tal indicação contribuiria para a inclusão de um grupo ainda sem representação no STF, expandindo por meio da diversidade a capacidade da Justiça brasileira de garantir direitos e cidadania.
"Uma jurista negra pode viabilizar o começo de uma nova era para nosso país, na qual a valorização da vida e dos direitos constitucionais sejam premissas básicas."
Nota divulgada pela iniciativa, que atua pelo aumento da participação de mulheres na política, diz ainda que a sociedade precisa conhecer as opiniões de quem ocupa o órgão mais importante do Judiciário.
"Preferencialmente, alguém que já tenha produzido literatura, tenha feito sustentações orais, aulas públicas ou de qualquer outra forma tenha estabelecido diálogo com a sociedade sobre suas teses; expondo-se, portanto, ao escrutínio geral e ao contraditório."
O trecho faz referência direta a Zanin, que tornou-se advogado de Lula em 2013 e ficou conhecido por defender o petista nos processos da Lava Jato, tornando-se seu amigo pessoal. Ele se formou em direito pela PUC-SP em 1999 e concluiu especialização em direito processual civil pela mesma universidade, sem ter cursado mestrado ou doutorado em seus anos de atuação profissional.
A aceleradora de mulheres na política Conecta também repudiou a indicação de Lula. "Na história brasileira, dentre 170 ministros, tivemos apenas 3 mulheres e 3 negros no STF, o que é constrangedor", afirma nota.
O texto questiona como pode haver democracia e progresso no país, se grande parte dos grupos sociais que sofrem injustiças históricas, como negros e mulheres, não tem as chances de participar do processo decisório de fazer justiça.
"A Conecta defende e advoga ao lado de movimentos sociais como o Mulheres Negras Decidem, Quero Você Eleita e outros a rápida ampliação da presença de mulheres e negros nos tribunais superiores, por uma questão de Justiça social e eficiência dos processos decisórios", finaliza.
Outra organização que se posicionou contra a nomeação de Zanin foi a Transparência Internacional, que considerou o ato uma afronta ao princípio de impessoalidade, previsto na Constituição, e reiterou a contradição no discurso de inclusão trazido pelo atual presidente na campanha.
O texto ainda diz que fez parte do bolsonarismo a tentativa de transformar o Supremo em "anexo do governo de ocasião", estratégia que, segundo o órgão, "Lula parece repetir a receita".
"A indicação de Zanin ainda contradiz o discurso de inclusão e aprofunda, ainda mais, a dívida brasileira com os segmentos sociais historicamente marginalizados e excluídos dos espaços de poder. Esta exclusão está também na raiz da corrupção sistêmica brasileira", complementou a Transparência Internacional.
A declaração reforça uma pressão exercida por diferentes setores da sociedade desde março, quando entidades jurídicas, ministros do governo Lula e um integrante do próprio Supremo se manifestaram publicamente a favor da indicação inédita de uma ministra negra para o STF.
Já na época, Lula afirmou que "todo mundo compreenderia" caso ele indicasse Zanin —homem e branco. Apesar da cobrança, diversas organizações optaram por não sugerir diretamente nomes de juristas negras para o cargo, com receio do histórico de ofensivas contra mulheres, especialmente as negras, que tentam ocupar postos de poder no país.
Já Frei David Santos, diretor-executivo da Educafro, se mostra otimista com relação às próximas indicações do presidente. De acordo com ele, a instituição apresentou a Lula uma lista de dez afro-brasileiros para cargos de ministros do STF.
"São cinco mulheres afro-brasileiras e cinco homens, todos com personalidade ilibada e alto saber acadêmico. A maioria com pós- doutorado na Europa ou Estados Unidos", diz. "Soubemos e confiamos na escolha do dr. Zanin, na certeza de que as próximas duas vagas sejam para uma mulher afro e a terceira para um homem afro" afirmou.
A ministra Rosa Weber será a próxima a deixar o Supremo, em outubro. Juízes precisam se aposentar compulsoriamente ao completar 75 anos.
Veja as próximas aposentadorias no Supremo
GOVERNO 2023-2026
- Rosa Weber (out.23)
GOVERNO 2027-2030
- Luiz Fux (abr.28)
- Cármen Lúcia (abr.29)
- Gilmar Mendes (dez.30)
GOVERNO 2031-2034
- Edson Fachin (fev.33)
- Luís Roberto Barroso (mar.33)
GOVERNO 2039-2042
- Dias Toffoli (nov.42)
GOVERNO 2043-2046
- Alexandre de Moraes (dez.43)
GOVERNO 2047-2050
- Kassio Nunes Marques (mai.47)
- André Mendonça (dez.47)
- Cristiano Zanin* (nov.50)
*Se aprovado pelo Senado
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