PEC que interfere no STF é adiada no Senado por receio de derrota

Parlamentares reclamam de falta de quórum, e oposição diz que houve pressão de ministros do Supremo

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Brasília

O Senado adiou nesta terça-feira (21) a votação da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que restringe as decisões monocráticas do STF (Supremo Tribunal Federal). O texto pode ser votado nesta quarta (22).

Nos bastidores, senadores ouvidos pela Folha afirmam que o quórum baixo no plenário deixou em risco a a quantidade de votos necessária para a proposta ser aprovada —e, por isso, eles decidiram não deliberá-la no momento.

Membros da oposição dizem, também sob reserva, que há pressão de membros do STF contra a PEC. Já nomes do governo Lula afirmam que a falta de mobilização é que provocou a mudança de planos.

Imagem mostra dois homens conversando; um está sentado e outro de pé
Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, sentado, em conversa com o líder do governo, Jaques Wagner, durante votação da Reforma Tributária - Roque de Sá - 11.out.2023/Agência Senado

Até a manhã desta terça, senadores se diziam confiantes na aprovação da proposta.

São necessários 49 votos para aprovação de uma PEC. Oposicionistas afirmam que seria preciso um quórum de cerca de 75 senadores, de um total de 81, para garantir resultado favorável à proposta.

Os parlamentares debateram nesta terça a possibilidade de realizar a votação do primeiro e do segundo turno no mesmo dia, o que foi aprovado por 48 votos —suficiente para esse tipo de decisão, mas menos do que seria necessário para o mérito do texto.

"Em sendo aprovado [o regime de duas votações em um mesmo dia], nós então proporíamos ao plenário a votação na data de amanhã [quarta], com melhor quórum do Senado, com senadores que ainda não chegaram a Brasília e têm previsão de chegar", sugeriu o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Ele é um dos fiadores da ofensiva do Congresso contra o Supremo. Sua ideia foi acatada, o calendário, aprovado, e a deliberação da PEC, adiada.

Na votação da tramitação especial, o quórum do plenário foi de 70 senadores. A liderança do governo não orientou a bancada sobre se posicionar favorável ou contrariamente à medida, o que também deve ser a tendência no debate do mérito, segundo membros da base.

O líder do governo, Jaques Wagner (PT-BA), se absteve. Já o partido orientou contra, o que também é possível que aconteça nesta quarta. O PSD, partido de Pacheco, e o MDB, também da base lulista, tiveram a mesma posição.

A proposta integra uma agenda contra o STF por parte de bolsonaristas e impulsionada por Pacheco.

Muitos veem na atuação dele, junto com Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), uma forma de se aproximar de nomes bolsonaristas e da oposição, visando tanto as eleições para a presidência do Senado quanto para os municípios, ambos em 2024.

Ele nega. "Isso é uma questão muito mais ampla que qualquer interesse eleitoral, meu ou de qualquer outro", afirmou, após ser questionado pela Folha.

Alcolumbre é um dos possíveis candidatos para a presidência do Senado em 2025.

Caso a PEC contra as decisões monocráticas seja aprovada, ministros do Supremo e aliados de Lula dizem acreditar que o texto terá tramitação mais lenta na Câmara.

Deputados próximos do presidente da Casa, o deputado Arthur Lira (PP-AL), não veem o tema como uma das prioridades dele no momento. E o próprio deputado sinalizou a magistrados do Supremo que não daria celeridade à proposta.

Parlamentares, porém, admitem que a ala da oposição deve fazer forte pressão para que a proposta avance e temem que o presidente da Câmara ceda.

Durante os debates, ainda pode ser retirado o trecho que versava sobre o tempo de pedidos de vista dos julgamentos (instrumento que muitas vezes causava longos adiamentos nas decisões), mas em razão do fato de a ex-ministra Rosa Weber já ter alterado o regimento interno do STF para limitar tal dispositivo.

O texto, se aprovado, define que decisões monocráticas não poderiam suspender a eficácia de uma lei ou norma de repercussão geral ou ato dos presidente da República, do Senado ou da Câmara.

A ofensiva contra o STF, que sempre foi uma pauta de senadores aliados a Jair Bolsonaro (PL), ganhou tração justamente a partir de uma articulação entre o Senado e a ala opositora na Câmara, impulsionada pela bancada ruralista, a mais forte da Casa no momento.

A articulação começou quando Pacheco apresentou em setembro uma PEC para criminalizar todo tipo de posse e uso de drogas, de qualquer substância e em qualquer quantidade.

A proposta, que também deve avançar no Senado nesta semana, foi uma reação direta ao julgamento do Supremo, que entendeu que parte da lei das drogas era inconstitucional e determinou que a posse de pequenas quantidades não deveria ser criminalizada.

Como mostrou a Folha, o Senado também passou a preparar outras PECs para se opor a decisões do STF, por exemplo para criminalizar o aborto ou para instituir o marco temporal para demarcar de terras indígenas.

A irritação com o Supremo se juntou, na Câmara, à disposição da bancada ruralista e da oposição, que se mobilizaram para obstruir a pauta e impedir uma série de votações.

Dessa forma, Pacheco abraçou a agenda anti-STF da oposição, colocou em debate temas que incomodam a corte e voltou a defender mandatos fixos para os ministros do tribunal. A reclamação dos parlamentares ocorre por considerarem que há uma intromissão do Judiciário em temas do Congresso Nacional.

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