Descrição de chapéu Congresso Nacional

Congresso turbina emendas e pode controlar quase R$ 50 bi no ano eleitoral de 2024

Reserva de R$ 37,6 bi no Orçamento deve aumentar com carimbo de R$ 11,3 bi para comissões e blindagem contra cortes

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Brasília

Um artigo incluído na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2024 carimba R$ 11,3 bilhões para emendas de comissão e amplia ainda mais o poder do Congresso Nacional sobre o Orçamento do ano que vem.

O texto foi admitido pelo relator da LDO, deputado Danilo Forte (União Brasil-CE), em acordo entre integrantes da cúpula da Câmara e do Senado para se estabelecer um novo modelo de distribuição das emendas a partir do próximo ano.

A medida ainda precisa ser votada pelos parlamentares. Uma vez aprovada, pode elevar o montante total das emendas para um valor recorde, próximo a R$ 50 bilhões.

Hoje, a proposta orçamentária de 2024 já contempla uma reserva de R$ 37,6 bilhões para emendas individuais e de bancada, que são obrigatórias pela Constituição Federal.

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O deputado federal Danilo Forte, relator da LDO - Pedro Ladeira- 8.ago.23/Folhapress

As emendas são uma forma com que deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais e, com isso, ampliar o capital político. Como mostrou a Folha, a prioridade do Congresso é atender seus redutos eleitorais, e não as de maior demanda do país.

Há três tipos de emenda: as individuais (que todo deputado e senador têm direito), as de bancada (parlamentares de cada estado definem prioridades para a região) e as de comissão (definida por integrantes dos colegiados do Congresso).

O parecer do deputado Forte diz que o Orçamento deve reservar pelo menos 0,9% da RCL (receita corrente líquida) de 2022 para programações indicadas por comissões permanentes do Congresso. Dois terços do valor serão designados pelos colegiados da Câmara, e o restante, pelas comissões do Senado.

Ao carimbar esse dinheiro para emendas, o governo poderá perder verba para o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e para o Ministério da Saúde. O PAC é a principal vitrine de Lula na área de infraestrutura.

Além disso, o relator previu que, em caso de frustração de receitas, as emendas de comissão só poderão ser bloqueadas na mesma proporção do corte aplicado sobre as despesas não obrigatórias do Poder Executivo.

As emendas de comissão não são impositivas como as indicações parlamentares individuais ou de bancada estadual. Carimbar um valor mínimo na LDO e limitar o contingenciamento para esses recursos é uma forma de protegê-los contra cortes ou remanejamentos. Na prática, trata-se de uma blindagem.

Técnicos ouvidos pela Folha lembram que a impositividade das emendas individuais e de bancada, garantida por diferentes emendas constitucionais aprovadas a partir de 2015, teve origem em dispositivo semelhante incluído na LDO de 2014.

Hoje, a Constituição reserva 2% da RCL para emendas individuais e 1% para emendas de bancada estadual.

A ideia, segundo líderes do Congresso, é que as emendas de comissão preencham o lugar deixado pelas extintas emendas de relator, principal moeda de troca nas negociações políticas entre o governo Jair Bolsonaro (PL) e os parlamentares.

As emendas de relator foram extintas pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que declarou sua inconstitucionalidade há cerca de um ano.

Ao turbinar as emendas de comissão, os integrantes da cúpula da Câmara e do Senado passam a ter poder sobre essa verba bilionária e podem dividir o montante com base em critérios políticos.

Articuladores políticos do Palácio do Planalto temem que esse novo modelo crie um descontrole e rachas internos no Congresso, já que a disputa por cargos de comando nas comissões tende a se ampliar.

Esse é outro fator que fortalece as cúpulas das duas Casas, pois o acordo de divisão das comissões entre os partidos é costurado pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

O plano dos líderes do Congresso é que as emendas de comissão não sejam repartidas igualmente entre cada colegiado. Segundo pessoas envolvidas nas negociações ouvidas pela Folha, comissões como de infraestrutura, de saúde e de educação vão receber fatias maiores do que outras.

O Congresso chegou a discutir até mesmo um novo tipo de emenda (as de liderança), mas acabou optando por turbinar as de comissão, que já existem desde o governo Bolsonaro. No entanto, até 2022, essas emendas eram inferiores a R$ 1 bilhão por ano.

Com o fim das emendas de relator, os parlamentares passaram a ampliar o uso das emendas de comissão.

O governo ainda tem que lidar com um impasse na reta final do ano sobre emendas distribuídas pelo Congresso na gestão Bolsonaro e que ainda não foram quitadas. Quando o parlamentar indica uma emenda, é comum que alguns contratos só venham a ser finalizados meses ou até anos após a autorização da obra ou projeto.

Há um saldo de quase R$ 15 bilhões em emendas de 2019, 2020 e 2021 cuja execução ainda não foi concluída. Nesse período, o Congresso assumiu o controle de uma fatia até então recorde dos recursos do Orçamento, inclusive por meio das emendas de relator.

Um decreto do governo Lula colocou em risco esse saldo. Pelas regras do decreto, as emendas que não foram totalmente quitadas serão canceladas pelo Tesouro Nacional ao longo de 2024, ano eleitoral. Para as verbas indicadas em 2019 e 2020, o prazo limite será 31 de março. Para os valores de 2021, o limite será 30 de junho do próximo ano.

O Congresso reagiu e Danilo Forte incluiu um dispositivo para prorrogar o prazo até o fim de 2024. O adiamento tem apoio da articulação política do Planalto. Portanto, é esperado que o presidente não vete essa medida, se ela for aprovada pelos parlamentares.

O impasse sobre as emendas de anos anteriores virou uma pedra a mais no caminho do governo Lula, que já enfrenta dificuldades na organização da base aliada no Congresso. Na reta final do ano, em especial, há uma concentração de medidas de interesse do ministro Fernando Haddad (Fazenda) para ampliar a arrecadação na tentativa de reequilibrar as contas públicas.

Com o dispositivo para manter as emendas herdadas do governo Bolsonaro até o fim de 2024, o governo espera acalmar a base aliada no Congresso.


Entenda as emendas parlamentares e seu uso

O que são emendas?
Emenda é a forma que deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais e, com isso, ampliar o capital político

Quais os tipos de emendas?
Hoje existem três tipos: as individuais (que todo deputado e senador têm direito), as de bancada (parlamentares de cada estado definem prioridades para a região) e as de comissão (definida por integrantes dos colegiados do Congresso)

Veja a cronologia das emendas parlamentares

Antes de 2015

  • A execução das emendas parlamentares era uma decisão política do governo, que poderia ignorar a destinação apresentada pelos congressistas.

2015

  • A emenda constitucional 86/2015 estabeleceu a execução obrigatória das emendas individuais, o chamado orçamento impositivo, com algumas regras.

2019

  • O Congresso ampliou o orçamento impositivo ao aprovar a emenda constitucional 100, que tornou obrigatórias também as emendas de bancadas estaduais
  • O Congresso emplacou um valor expressivo para as emendas feitas pelo relator-geral do Orçamento, R$ 30 bilhões para o ano seguinte
  • Jair Bolsonaro vetou a medida e o Congresso só não derrubou o veto mediante acordo que manteve R$ 20 bilhões nas mãos do relator-geral
  • Bolsonaro também deu uma autonomia completa para a cúpula do Congresso decidir para onde todo esse montante seria destinado

2020

  • Com o acordo de 2019, feito por Bolsonaro para manter uma base de apoio no Congresso, o valor destinado às emendas deu um salto e chegou a R$ 44 bilhões.

2022

  • O STF (Supremo Tribunal Federal) declarou inconstitucional a emenda de relator. A verba foi rebatizada e transferida ao orçamento dos ministérios, mas o governo Lula driblou a decisão e manteve o uso político dos recursos —há, em 2023, R$ 9,8 bilhões reservados para esse tipo de negociação

2023

  • Cada deputado teve R$ 32 milhões em emendas individuais (senadores, R$ 59 milhões), valores que têm execução obrigatória e que em alguns casos podem mais que dobrar em decorrência das emendas de bancadas e das "emendas extras"
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