Lula lembrava de derrotas e Rosa não escondia indignação em 9 de janeiro

Presidente reuniu representantes dos três Poderes e governadores e teve encontro com chefes das Forças Armadas

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Brasília

No dia seguinte aos ataques de 8 de janeiro, o presidente Lula (PT) repetia a ministros, auxiliares e aos presidentes dos outros Poderes que havia perdido as eleições muitas vezes e que não entendia por que os que haviam sido derrotados em outubro não aceitavam o resultado.

Na manhã do dia 9 de janeiro, Lula reuniu a cúpula dos três Poderes no Palácio do Planalto, em uma resposta articulada ainda no dia 8, como forma de mostrar união entre as instituições.

Lula durante caminhada até o STF com ministros, parlamentares e governadores em 9 de janeiro - Mauro Pimentel-9.jan.2023/AFP

"Ele dizia: eu fui derrotado, entendi que fui derrotado e parti para outras disputas. Ele dizia isso muito. Nós vencemos. E por que os que foram derrotados não compreendem isso e não esperam o passar do tempo para depois disputar?", relata o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB), que estava como presidente interino do Senado na ausência de Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Veneziano afirma que a presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Rosa Weber, não escondia sua indignação. A ministra, segundo ele, estava firme, mas "emocionalmente abalada e chocada".

"[Imagine] a presidente da Suprema Corte, perto de se aposentar, se depara com aquilo que [há] de mais aterrorizante. O prédio só ficou em pé pelas estruturas de pedra, cal e mármore. O resto foi tudo acabado lá dentro. Isso choca. É o patrimônio, a instituição, a violência, o deboche, a agressão do nada por nada."

O relato é reforçado pelo atual presidente do STF, Luís Roberto Barroso. O ministro diz que Rosa, assim como as demais autoridades presentes à reunião, estava triste.

"É uma mistura de choque com indignação e também a sensação de que nada disso poderia nos abalar. Que em breve tudo estaria reconstruído e que a Justiça é muito mais do que um prédio, ela tem um valor imaterial que não pode ser atacado fisicamente. Quem acredita na Justiça sabe disso. De modo que [estávamos] indignados, tristes", conta.

O ministro disse à Folha que a reunião com Lula foi permeada por falas defendendo justiça após os ataques.

"Foram as manifestações naturais de indignação e de disposição de punir as pessoas que fizeram isso, financiaram isso e as que foram penosamente negligentes ou cúmplices do que aconteceu. E efetivamente houve prisões de pessoas que estavam na cadeia de comando e tinham o dever de ter atuado e não atuaram."

Ao final daquele encontro, os presidentes dos três Poderes divulgaram nota de repúdio aos atos de vandalismo que ocorreram em Brasília no dia anterior.

"Os Poderes da República, defensores da democracia e da carta Constitucional de 1988, rejeitam os atos terroristas, de vandalismo, criminosos e golpistas que aconteceram na tarde de ontem em Brasília", dizia o texto.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), também assinou o documento, com Lula, Barroso, Rosa e Veneziano.

Além deles, havia outras autoridades na reunião, entre elas o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB). Alckmin avaliou o episódio como grave não só pela destruição dos prédios, mas porque, para ele, houve de fato uma ameaça de golpe no país. "Patriota é quem respeita a democracia. O contrário disso chama-se golpista", disse à Folha.

Segundo o ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), que também estava presente, a avaliação geral das autoridades era a de que o dia anterior havia sido um ataque à democracia.

"Todos, todos, todos compreendiam aquilo ali como um atentado à democracia. Todos, absolutamente todos. Eu vi o rosto de indignação por parte do presidente Arthur Lira, por exemplo, do que tinha acontecido."

Segundo Padilha, o próprio general Júlio Cesar de Arruda, comandante do Exército, reconheceu a gravidade dos ataques no dia 9 de manhã.

"Ele tinha a percepção de que tinha ultrapassado a linha só do protesto e passava a ter uma atitude, de fato, de atacar a democracia. De um desejo golpista de desmontar e destruir as instituições", conta Padilha.

Naquele dia 9, além da reunião pela manhã, Lula se reuniu com os ministros da Defesa, José Múcio Monteiro, da Justiça, Flávio Dino, e os três comandantes das Forças Armadas: Arruda, o almirante Marcos Sampaio Olsen, comandante da Marinha; o brigadeiro Marcelo Damasceno, comandante da Aeronáutica. O encontro durou cerca de uma hora.

Depois, o presidente recebeu governadores para uma reunião no Palácio do Planalto em mais um sinal de unidade, e promoveu uma caminhada do Palácio do Planalto ao STF —que tinha sido o prédio mais vandalizado na véspera.

Embora tenha atuado para adiar a prisão de manifestantes que estavam acampados no quartel-general do Exército no dia 8 de janeiro, Arruda admitiu surpresa com o ocorrido, segundo Padilha.

O ministro diz que ouviu o relato de que até então Arruda avaliava as manifestações em frente aos quartéis como pacíficas e não imaginava que elas evoluíssem para os ataques.

"Então, na minha opinião, o dia 8 também é uma virada de página de várias pessoas individualmente, com níveis diferentes de direção, de atores políticos institucionais, de compreender o risco de fato que existia de ficar passando pano ou de não conter da forma mais veemente possível aquele planejamento golpista", avalia Padilha.

Ainda no dia 9 de janeiro, à noite, Lula reuniu os governadores ou representantes dos 26 estados e do Distrito Federal no Palácio do Planalto e os chefes do STF, da Câmara e do Senado.

No encontro, Lula afirmou que os manifestantes queriam um "golpe e golpe não vai ter".

Depois da reunião, o presidente e as autoridades caminharam pela praça dos Três Poderes até as instalações destruídas do Supremo.

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