Lula titula 11 comunidades em 2023, mas quilombolas cobram mais

Número é maior que a média anual dos governos anteriores, com exceção da gestão Temer

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São Paulo

O governo Lula (PT) titulou 11 comunidades quilombolas ao longo de 2023, primeiro ano de sua terceira gestão. O número é maior que a média anual de titulações ocorridas nos governos anteriores, com exceção da administração de Michel Temer (MDB), que teve um volume maior de emissões do documento.

Os dados se referem somente aos títulos emitidos pelo governo federal, através do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária). Órgãos de terra estaduais e municipais também podem realizar a emissão.

Quilombo de Boa Vista, o primeiro quilombo no Brasil a ter terras tituladas em uma posse coletiva - Rubens Cavallari/Folhapress

"Não foi possível um número mais alto. São processos que não iniciam ou reiniciam e concluem-se no mesmo ano. [Essas titulações] nesses anos, muito provavelmente, foram processadas ao longo de dois, três ou mais anos antes. Realmente, o ano de 2023 a gente já sabia que daria poucas respostas", afirma o secretário de Políticas para Quilombolas do governo Lula, Ronaldo dos Santos.

O governo com a melhor média de titulação de terras quilombolas é o Temer (2016 a 2018), com 19,5 emissões anuais. Ele assumiu a Presidência por dois anos e meio, após o impeachment de Dilma Rousseff (PT).

O governo Dilma (2011 a 2016) aparece com média de 10,1 titulações por ano. O governo Jair Bolsonaro (2019 a 2022) tem média de 5,75 titulações por ano. Os primeiros governos de Lula (2003 a 2010) têm média de 2,3 titulações por ano e a gestão Fernando Henrique (1995 a 2002) 1,75 título emitido por ano.

Apesar de considerar que 2023 foi um ano reconstrução de políticas quilombolas abandonadas na gestão Bolsonaro, os quilombolas esperam que a partir deste ano o processo de titulação dos territórios seja acelerado.

"Essa questão da regularização fundiária, eu não tenho muita simpatia em discutir quantitativamente. Eu sempre acho que por mais que o governo regularize territórios, é sempre pouco. Por que o déficit é muito grande", diz a socióloga Givânia Silva, uma das diretoras da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos).

Cerca de 5% das mais de 6.000 comunidades existentes no país são tituladas. Só no Incra existem 1.802 processos abertos sobre regularização de territórios quilombolas à espera de uma conclusão.

Givânia afirma que acelerar as etapas anteriores à emissão do título também é importante. Em geral, a tramitação demora muitos meses. Em alguns casos, a solicitação está em aberto há 20 anos.

A líder quilombola cita o reconhecimento da comunidade, a delimitação do território e a desintrusão como outras etapas importantes.

"Onze títulos parece muita coisa, mas não é. É pouco. Mas diante da burocracia também não é possível desconsiderar, se olharmos os passos anteriores até chegar nessa titulação. Mas é óbvio que eu quero que o governo titule 300, 400 [comunidades] esse ano. Ou 500. O máximo que puder", diz.

O secretário Ronaldo dos Santos reconhece que as ações destinadas a essa população ainda foram insuficientes. Isso porque, segundo ele, em 2023 os projetos tiveram início ou reinício, após um período de desmonte das políticas sociais, em referência aos governos anteriores.

Ele avalia que as ações terão resultados melhores ao longo do governo e que o trabalho realizado até aqui, nesta área, apresenta os sinais do que o governo Lula 3 terá como prioridade.

"O ano de 2023 foi muito complexo. Pela própria natureza de ser o primeiro ano de um governo em uma situação excepcional, não dá para a gente não falar sobre isso", diz.

"Apesar disso, foi um ano de construção, de alicerçar a agenda política para o movimento quilombola. E o que a gente acha de mais relevante foi a criação do programa Aquilomba Brasil, que na verdade é a volta do Programa Brasil Quilombola, que existia desde 2004, foi extinto e a gente retoma."

De acordo com Ronaldo Santos, o programa Aquilomba Brasil traz duas previsões que o governo considera que irão impulsionar as ações nessa área.

A primeira é a criação de uma política nacional de gestão territorial e ambiental quilombola. Segundo ele, é a primeira vez que o Estado brasileiro pensa um conjunto de políticas públicas diversas e articuladas, para além das questões da terra previstas na Constituição de 1988.

E a segunda previsão é a Agenda Nacional de Titulação, que pretende organizar as informações, monitorar e articular medidas para acelerar o ritmo processual.

A primeira titulação de um território quilombola no Brasil ocorreu em 1995, no quilombo Boa Vista, em Oriximiná, no Pará. O documento garante a posse da comunidade em relação ao terreno. O direito é assegurado pelo artigo 68 da Constituição.

Dividido em várias etapas, o processo de regularização fundiária se inicia com a autoidentificação de uma comunidade. Depois, é submetido às fases de certificação, delimitação, demarcação e, em alguns casos, desapropriação de terrenos.

Quem emite a certificação das comunidades é a Fundação Cultural Palmares, vinculada ao Ministério da Cultura. Já as demais etapas são de responsabilidade justamente do Incra ou dos institutos de terras estaduais e municipais.

O projeto Quilombos do Brasil é uma parceria com a Fundação Ford

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