Descrição de chapéu Polícia Federal

PF investigará permanência de Bolsonaro em embaixada da Hungria logo após operação

NYT revela presença de ex-presidente por 2 dias em missão diplomática, e Itamaraty convoca embaixador; defesa diz que associar caso a plano de fugir de prisão é ficção

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Brasília

A Polícia Federal vai investigar a permanência de Jair Bolsonaro (PL) na embaixada da Hungria, em Brasília, por dois dias após uma operação que apreendeu seu passaporte.

A presença do ex-presidente no local foi revelada nesta segunda-feira (25) pelo The New York Times, que divulgou vídeos do sistema de segurança mostrando Bolsonaro em frente à missão diplomática no dia 12 de fevereiro deste ano.

Bolsonaro e Orbán em encontro em 2022
Bolsonaro e Orbán em encontro em 2022 - Attila Kisbenedek/AFP

Quatro dias antes, a PF havia apreendido o passaporte de Bolsonaro, no âmbito de uma investigação que apura uma trama golpista liderada pelo ex-presidente para mantê-lo no poder apesar da derrota eleitoral para Lula (PT).

Segundo investigadores da PF, é cedo para dizer se houve uma tentativa de fuga, mas é preciso investigar a veracidade e a motivação de o ex-presidente ter ficado na embaixada.

Segundo o jornal americano, Bolsonaro estava acompanhado de dois seguranças e permaneceu no prédio de 12 de fevereiro a 14 de fevereiro. Um funcionário da embaixada da Hungria confirmou o plano de receber Bolsonaro na representação, segundo o NYT.

No local, Bolsonaro não poderia ser alvo de uma ordem de prisão, por se tratar de prédio protegido pelas convenções diplomáticas.

A defesa do ex-presidente afirmou que ele se hospedou na embaixada só para manter contato com autoridades do país amigo. "Frequento embaixadas pelo Brasil, converso com embaixadores", repetiu Bolsonaro.

Os advogados dele afirmaram que qualquer outra interpretação é "obra ficcional" e "fake news", e o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) disse que "beira a insanidade" qualquer associação do caso a um plano de fuga.

O ex-presidente é aliado próximo do líder da Hungria, Viktor Orbán, um dos principais expoentes da extrema direita na Europa. Ele se encontrou com Orbán em Buenos Aires, em dezembro de 2023, durante a posse do presidente da Argentina, Javier Milei.

Um vídeo publicado nas suas redes sociais à época mostra Bolsonaro apresentando o premiê húngaro à comitiva de cerca de 20 políticos. "Estamos longe, Brasil e Hungria, mas gostamos de futebol e de política", falou Orbán em tom descontraído ao grupo que os esperava do lado de fora.

No mesmo dia em que chegou à embaixada da Hungria em Brasília, Bolsonaro divulgou vídeo convocando apoiadores para manifestação na avenida Paulista a seu favor no dia 25 de fevereiro, que reuniu milhares de simpatizantes.

Na reportagem, o jornal americano descreve os momentos em que Bolsonaro aparece no sistema interno de segurança da embaixada. O carro com o ex-presidente chega na missão diplomática por volta das 21h do dia 12 de fevereiro, uma segunda-feira. Os registros indicam que ele teria sido albergado na parte do edifício em que há apartamentos para visitas.

O ex-presidente surge ainda caminhando pelo estacionamento da embaixada no dia seguinte. Ele deixa o complexo no meio da tarde do dia 14.

De acordo com o New York Times, funcionários locais da embaixada não estavam trabalhando por causa do feriado de Carnaval. Eles teriam sido comunicados no dia 14 para permanecerem em casa até o final da semana, ainda segundo a publicação.

O embaixador húngaro no Brasil é Miklós Halmai. A Folha procurou a missão diplomática, mas não obteve resposta.

A notícia gerou irritação entre auxiliares do governo Lula, que viram no gesto do embaixador da Hungria uma tentativa de interferência em assuntos internos do Brasil.

Nesta segunda, o Itamaraty decidiu convocar Halmai para dar explicações na sede da chancelaria.

Nas relações diplomáticas, a convocação de um embaixador para prestar esclarecimentos é uma forma de o país anfitrião mostrar contrariedade.

De acordo com pessoas que acompanham o tema, ele esteve no Itamaraty e ouviu queixas da secretária de Europa e América do Norte do Itamaraty, embaixadora Maria Luisa Escorel de Moraes. Ainda segundo esses interlocutores, ele permaneceu por cerca de 20 minutos no Itamaraty e apenas ouviu a mensagem transmitida por Escorel, sem se manifestar.

O ministro Alexandre Padilha (Secretaria de Relações Institucionais) afirmou, também nesta segunda, que a revelação de que Bolsonaro se hospedou na embaixada da Hungria mostra que o ex-presidente é "fugitivo confesso".

"Que o Bolsonaro é um fugitivo confesso é zero surpresa, mais uma vez ele mostrou os seus planos de fugir. Ele fez isso no final do ano retrasado, depois das eleições, de ter fugido para os Estados Unidos", disse Padilha, após ter acompanhado sessão em homenagem aos 200 anos do Senado Federal.

"Várias vezes disse que tinha a possibilidade, [que] tem contato com chefes de Estado da extrema-direita do mundo, a coalizão da morte, do desrespeito aos direitos humanos. Mais uma vez essas imagens só reforçam que Bolsonaro é um fugitivo confesso".

A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR), usou as redes sociais para fazer um paralelo com a ida de Bolsonaro para os EUA a fim de evitar a passagem de faixa para Lula. "E não é que o Bolsonaro estava querendo fugir outra vez? Primeiro ele se escondeu em Miami e agora ficamos sabendo que foi se hospedar na Embaixada da Hungria, por cortesia do extrema direita Orbán. Medo é tudo que resta para o inelegível", disse.

A Hungria, um país pós-comunista de 10 milhões de habitantes, se tornou referência para conservadores em todo o mundo. Isso não aconteceu por acaso: foi uma política de Estado pensada meticulosamente por Orbán.

Em paralelo ao investimento do governo húngaro na construção de um soft power veio o desmonte da democracia húngara. O primeiro-ministro governa desde 2010 com uma maioria de dois terços do Parlamento, o que permitiu que ele aprovasse uma nova Constituição.

Institutos que medem a qualidade das democracias no mundo, opositores e jornalistas dizem que Orbán minou a independência do Judiciário, tomou conta do mercado de mídia, sufocou ONGs e universidades, aprovou leis contra minorias, como a comunidade LGBTQIA+ e os imigrantes, e redefiniu distritos eleitorais para favorecer o partido dele.

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