Deputados dos EUA pedem a Biden que retire sigilo de documentos sobre ditadura brasileira

Carta enviada nesta quinta afirma que governo americano deve aproveitar 60 anos do golpe para divulgar 13 arquivos

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Washington

Um grupo de 16 congressistas americanos assinou uma carta ao presidente Joe Biden nesta quinta-feira (4) solicitando a retirada de sigilo de 13 documentos confidenciais dos EUA sobre a ditadura militar brasileira.

Os arquivos datam de 30 de março, véspera do golpe, a 9 de abril de 1964, mostra o pedido ao qual a Folha teve acesso antecipado. A seleção foi feita por organizações brasileiras envolvidas em uma campanha desde o ano passado para que Washington libere os documentos.

O presidente americano, Joe Biden, participa de evento em Raleigh, na Carolina do Norte - Elizabeth Frantz - 26.mar.24/Reuters

A carta, enviada também ao secretário de Estado, Antony Blinken, usa duas efemérides para reforçar seu pedido: os 60 anos do golpe, completos no último domingo (31), e os 200 anos de relações diplomáticas entre Brasil e EUA, celebrados no próximo mês.

"A queda da democracia brasileira e a subsequente ditadura foram marcadas por atrocidades e pelo abuso sistemático dos direitos humanos. A transparência sobre o papel dos EUA no golpe e na ditadura é uma parte fundamental do processo de verdade e reconciliação para este período sombrio", diz à Folha a deputada Nydia Velázquez, que capitaneou a iniciativa em conjunto com a colega Susan Wild.

Todos os signatários da carta enviada nesta quinta são do Partido Democrata. Estão na lista Alexandria Ocasio-Cortez, um dos nomes de maior projeção da esquerda dos EUA, Rashida Tlaib, a única palestino-americana do Congresso, e Jim McGovern, co-presidente da Comissão de Direitos Humanos que recentemente barrou uma audiência sobre Brasil com a presença de bolsonaristas.

Completam a lista os deputados Jamaal Bowman, Cori Bush, Greg Casar, Joaquin Castro, Chuy García, Raúl Grijalva, Hank Johnson, Barbara Lee, Janice Schakowsky, Juan Vargas e Jamie Raskin.

Na carta, os congressistas apontam que, no aniversário de 50 anos do golpe no Chile, no ano passado, os EUA retiraram o sigilo de documentos relacionados ao início da ditadura de Augusto Pinochet.

"Acreditamos que um esforço comparável relacionado ao Brasil é tão oportuno quanto necessário. A desclassificação de documentos relacionados ao período da ditadura brasileira não só enriquecerá o conhecimento histórico, mas também fortalecerá o compromisso dos EUA com os valores democráticos e os direitos humanos", escrevem.

Em julho de 2023, um grupo formado por 14 organizações brasileiras e 2 americanas enviou um pedido semelhante a Biden, sem sucesso. Entre as entidades estão Artigo 19, Comissão Arns, Instituto Vladimir Herzog e Washington Brazil Office (WBO).

Velázquez promoveu, em parceria com o WBO, uma audiência virtual no Congresso americano sobre a desclassificação dos documentos em dezembro passado.

Procurado pela Folha na época, o Departamento de Estado afirmou que a desclassificação de documentos é um processo complexo e que envolve diversas agências, "durante o qual nós devemos considerar muitos fatores relacionados a segurança nacional, proteção de fontes e métodos, e outros riscos e benefícios de divulgar informações específicas".

A participação dos EUA já foi documentada por historiadores. O embaixador dos EUA no Brasil em 1964, Lincoln Gordon, propôs o envio de uma força naval para a costa brasileira para ajudar as tropas que derrubariam João Goulart (1961-1964), na Operação Brother Sam. A ação foi aprovada pelo governo Lyndon Johnson, mas Goulart caiu antes que os navios chegassem.

Também está registrado o conhecimento dos EUA das violações de direitos pelo regime. Arquivos da embaixada americana de 1975-1976 publicadas pelo WikiLeaks apontaram que a Casa Branca sabia das violações de direitos humanos, mas minimizavam como exceções para justificar a continuidade do apoio e de treinamento militar das forças brasileiras. Os Estados Unidos também deram apoio à Operação Condor, que criou uma rede para operações coordenadas de repressão nas ditaduras do Cone Sul.


Veja os documentos listados na carta para que o sigilo seja retirado:

Título Assunto
São Paulo 212 Withdrawal Março 30, 1964, "From São Paulo"
Rio 2114 withdrawal Março 30, 1964, "National Security Info"
Rio 2121 withdrawal Março 31, 64, "National Security Info"
Brasília 131 Withdrawal Abril 1, 64, "National Security Info"
Rio 2143 withdrawal Abril 1, 64, "National Security Info"
Rio 2128 withdrawal Abril 3, 64, "National Security Info
Systematic review withdrawal card no. POL35-6 Abril 4, 1964, "National Security Info"
Golpe Withdrawal Abril 4, 64, "National Security Info"
Systematic review withdrawal card no. POL35-5 Abril 6, 64, "National Security Info"
Systematic review withdrawal card no. POL35-4 Abril 8, 64, "National Security Info"
Systematic review withdrawal card no. POL35-4 Abril 8, 64, "National Security Info"
Systematic review withdrawal card no. POL35-3 Abril 8, 64, "National Security Info"
Rio 2223 withdrawal notice Abril 9, 1964, From Rio
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