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Congresso Nacional

Lira amplia força com ato antibaixaria na Câmara, mas vê barrada proposta de superpoder

Texto original dava à Mesa atribuição de afastar deputados; resolução aprovada condiciona ato a aval do Conselho de Ética

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Brasília

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), ampliou sua força com a aprovação nesta quarta-feira (12) de resolução que visa coibir episódios de baixaria na Casa, mas reação de parlamentares e partidos barrou a proposta original, que concedia à Mesa da Casa, comandada por ele, o poder de afastar sumariamente deputados do mandato por até seis meses.

Apesar da amenização do texto, a proposta aprovada cria um inédito rito sumário de punição a deputados.

Havia um consenso entre parlamentares de que era preciso dar um basta, mas a solução original encontrada por Lira encontrou resistência em partidos de esquerda, centro e direita.

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O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL) no Conselho Nacional de Justiça - Gabriela Biló/Gabriela Biló - 30.ago.22/Folhapress

A situação atual decorre de décadas de leniência e corporativismo com os mais variados desvios de condutas, o que deixou parlamentares à vontade até para ameaçarem se estapear uns aos outros diante das câmeras.

A Corregedoria da Mesa e, principalmente, o Conselho de Ética da Casa têm funcionado basicamente como unidades cartoriais de arquivamentos, posição que vem sendo referendada por Lira e os presidentes que o antecederam.

O último parlamentar que teve o mandato cassado em decorrência de um parecer do Conselho de Ética foi Flordelis (então no PSD-RJ), em 2021, mas por um crime de sangue —no ano seguinte ela foi condenada como mandante da morte do marido, o pastor Anderson do Carmo.

Apesar de plenário e comissões não raro serem palco de trocas de insultos, ataques, gritarias e ameaças de agressão, o Conselho de Ética tem arquivado praticamente todos os casos.

Na última semana, André Janones (Avante-MG) e Nikolas Ferreira (PL-MG) chegaram a percorrer corredores da Câmara tentando se atracar e sendo contidos por policiais legislativos.

O primeiro havia sido absolvido pelo conselho da suspeita de promover "rachadinha" em seu gabinete, e o segundo liderou uma tropa bolsonarista que compareceu à sessão para espinafrar o adversário político —apesar de a família Bolsonaro estar envolvida em vários escândalos de "rachadinha".

Também na última semana, Luiza Erundina (PSOL-SP), que tem 89 anos, passou mal e chegou a ser internada quando relatava proposta que institui a responsabilidade do Estado em identificar publicamente lugares usados pela repressão na ditadura —o projeto havia sido atacado por bolsonaristas momentos antes.

O projeto bancado por Lira alterou o regimento da Câmara. Por isso, entrou em vigor já na sessão desta quarta, sem necessidade de análise do Senado ou de sanção e veto presidencial.

O texto original dava poder à Mesa de suspender cautelarmente o mandato de deputados alvos de processo por quebra de decoro apresentado pela própria Mesa.

Lira argumentou na sessão que não estava legislando em poder próprio, já que a Mesa é composta de outros seis deputados e a decisão precisava ser por maioria. Na prática, porém, o presidente da Câmara tem ampla influência nesse colegiado, que quase sempre segue suas determinações.

A decisão seria analisada em até 15 dias pelo Conselho de Ética —órgão composto por 21 deputados indicados pelos partidos e eleitos para mandato de dois anos— e, depois, pela maioria absoluta dos 513 deputados, no plenário.

Além do superpoder conferido ao presidente da Casa, não havia critérios sobre quais condutas acarretariam a suspensão cautelar.

A grita ocorrida na terça foi patrocinada por deputados da esquerda, como Glauber Braga (PSOL-RJ) —que chamou a medida de "AI-5 de Lira", em referência ao ato institucional mais duro da ditadura brasileira—, da centro-direita, como Mendonça Filho (União Brasil-PE), e da direita, como integrantes do PL e do Novo.

Os opositores da medida pregavam como alternativa o óbvio, a existência de um Conselho de Ética de verdade, autônomo e rigoroso com eventuais quebras de decoro. Quem acompanha o Legislativo há algum tempo, porém, sabe que essa é uma solução que está longe de ser implantada pelo Congresso.

Após a reação, a proposta de acordo aprovada nesta quarta por 400 votos a 29 deixou à Mesa a atribuição de sugerir a suspensão ao Conselho de Ética, que será nesses casos obrigado a decidir em até três dias se aceita ou não a recomendação.

Situação bastante diversa da atual, em que eventual suspensão só ocorre após um longo processo no conselho, que tem o poder apenas de sugerir ao plenário da Casa, responsável pela palavra final, a punição —o que raramente faz.

Agora, o conselho poderá sancionar parlamentares em um rito sumaríssimo, bastando para isso manifestação da Mesa da Câmara nesse sentido.

Amplia-se com isso o poder de Lira e de quem vier a sucedê-lo —seu mandato termina em janeiro—, já que uma recomendação chancelada pelo presidente da Câmara tem um peso político mais robusto.

Além disso, continuam inexistindo critérios sobre em quais casos e por quais razões a Mesa deverá sugerir suspensão de mandato, o que dá margem para decisões baseadas apenas em conveniências políticas.

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