Produção nacional de biofármaco contra câncer vai baratear terapias

Drogas são consideradas uma das maiores inovações que surgiram para o tratamento da doença

Andrea Vialli
São Paulo

Os medicamentos biológicos à base de anticorpos monoclonais são considerados uma das maiores inovações que surgiram para o tratamento do câncer. 

Enquanto a quimioterapia ataca tanto células tumorais quanto sadias, as novas drogas são consideradas terapias-alvo, porque agem no causador da doença, provocando uma resposta no sistema imunológico e fazendo com que o organismo passe a combater células não benéficas.

Já existem drogas biológicas contra alguns tipos de linfoma, melanoma, câncer de mama, pulmão, bexiga, rins, colorretal e de cabeça e pescoço. Os remédios podem ser aliados a terapias tradicionais para aumentar as chances de controle da doença.

Escultura de Herman Tacasey inspirada na estrutura molecular de remédio biológico e feita com matéria orgânica
Escultura de Herman Tacasey inspirada na estrutura molecular de remédio biológico e feita com matéria orgânica

Segundo Raquel Riechelman, líder do departamento de oncologia clínica do hospital A. C. Camargo, os benefícios desse tratamento —também conhecido como imunoterapia— incluem menos efeitos colaterais, como enjoos e queda de cabelo. 

No Brasil, um dos biofármacos mais utilizados é o trastuzumabe, aprovado pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em 1999. A droga é indicada para combater o câncer de mama do tipo HER2+, um tumor agressivo que responde por um quinto dos casos. 

A terapia é oferecida pelo SUS desde 2013 para pacientes em estágio inicial da doença. Em agosto de 2017, foi aprovada também para casos avançados, com metástase.

“A droga diminui em 35% o risco relativo de a paciente morrer”, diz Franklin Pimentel, mastologista do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto.

NOVO MERCADO

A aprovação pela Anvisa do biossimilar do trastuzumabe, em dezembro de 2017, abre o caminho para a chegada de novos remédios dessa mesma categoria.

O laboratório Libbs, que lança a droga em março com a marca Zedora, está submetendo à agência estudos para começar a produzir no Brasil outros dois biossimilares: o rituximabe, para o tratamento de alguns tipos de linfoma e leucemia, e o bevacizumabe, indicado para pacientes com metástasesde câncer colorretal, de pulmão ou de células renais.

A expectativa da empresa é que a produção local do rituximabe comece ainda em 2018. No caso do bevacizumabe, cujos estudos clínicos já começaram a ser realizados, a Libbs estima que o país assuma a produção até 2019.

“A produção local deve resultar em uma queda nos preços de até 50% em cinco anos”, diz Marcia Bueno, diretora de relações institucionais da Libbs. Hoje, cada dose de 150 mg do trastuzumabe custa R$ 3.945,84.

Para Renata D’Alpino, oncologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, a chegada dos biossimilares vai causar um grande impacto no tratamento do câncer. “Teremos novas drogas à medida que as patentes forem quebradas”, diz.

Segundo o Ministério da Saúde, as perspectivas para incorporação de “biológicos inovadores” (a pasta não usa o termo “biossimilar”) são positivas em razão de parcerias público-privadas para produção desses remédios. 

Já foram firmadas 80 parcerias com 18 laboratórios públicos e 43 privados para o desenvolvimento de 49 medicamentos e seis vacinas, que devem substituir parte dos 26 biofármacos que são oferecidos hoje no SUS, mas que não são produzidos no Brasil. 

Em troca da transferência de tecnologia para o governo, as empresas obtêm a garantia da demanda pelo medicamento enquanto a parceria for vigente. 

ESCLEROSE E HEMOFILIA

Dois novos medicamentos biológicos chegam ao mercado nacional ainda neste ano: um para esclerose múltipla e outro para hemofilia.

As drogas, ambas do laboratório Roche, prometem frear a progressão dessas doenças crônicas e surgem como o primeiro tratamento para casos mais agudos.

Conhecida como uma doença debilitante, a esclerose múltipla em sua forma mais grave, a progressiva, atinge pessoas jovens e produtivas, entre os 20 e 40 anos. 

No Brasil, existem 35 mil portadores, segundo a Associação Brasileira de Esclerose Múltipla. Nos casos mais agudos, que afetam 15% dos pacientes, muitos deles acabam precisando de cadeiras de rodas.
Como o nome indica, a esclerose múltipla progressiva ataca sem descanso ou remissão, inflamando o sistema nervoso, levando à morte de células nervosas no cérebro e na medula espinhal. O objetivo do novo medicamento, ocrelizumabe, é justamente bloquear sua progressão.

A hemofilia é uma doença hereditária que causa hemorragias. A causa é a ausência, no sangue, do chamado fator 8, uma complexa glicoproteína essencial para a coagulação. Hoje, o fator 8 é produzido em laboratório. 

Mas alguns pacientes hemofílicos desenvolvem inibidores para a terapia de reposição dessa glicoproteína. É então que entra o novo medicamento, o emicizumabe.

A aprovação dessa droga “representa importante avanço para as pessoas que têm hemofilia do tipo A e lutam para controlar seus sangramentos, que não contavam com um novo medicamento em quase 20 anos”, diz Sandra Horning, diretora médica e de desenvolvimento de produtos da Roche

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