Governos e empresas sustentam sistema de saúde na América Latina

Países adotam modelos híbridos, com variações no valor investido por cada setor

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Eduardo Carvalho
Rio de Janeiro

A maioria dos países da América Latina tem sistemas de saúde híbridos, com atendimento oferecido pelo governo e por empresas privadas. Mas há diferenças entre a quantidade de investimento de cada parte e os formatos de cobertura dos planos, alguns com cobranças feitas a toda a população.

Fabio Mesquita, médico brasileiro que atua na OMS (Organização Mundial da Saúde) explica que a preocupação com a universalidade da saúde começou na segunda metade do século 20, quando os governos perceberam que, para haver avanço econômico, era preciso pensar no bem-estar. 

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Foi quando a América Latina se debruçou sobre o desenvolvimento de modelos de gestão inspirados no Reino Unido —100% público, mantido com tributos— e nos Estados Unidos, onde a população precisa pagar por planos ou pelo atendimento prestado. 

“Cada vez fico mais convencido de que o sistema misto é o ideal, principalmente para países em desenvolvimento como o Brasil. Mas o investimento na parte pública precisa ser prioridade, já que a população ainda lida com problemas básicos como educação, transporte e alimentação”, explica Mesquita.

Dados da OMS sobre gastos com saúde nos países aponta que 9% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro é destinado ao setor, índice que é a soma de investimentos públicos (42%) e privados (55%, divididos entre aquisição de convênio médico e o pagamento de consultas ou compra de medicamentos). 

Para Lígia Bahia, especialista em saúde pública e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mesmo tendo um dos piores índices públicos com esse tipo de gasto, o Brasil ainda faz muito com pouco. 

“Nosso Sistema Único de Saúde é eficiente. Fazemos transplante e compramos medicamentos caros. Já visto como modelo por Uruguai e Bolívia, é estudado por outros países. Mas parece que estamos indo na contramão ao tentar privatizar tudo.” 

Diferentemente de Cuba e Costa Rica, onde o Estado gere integralmente o setor, Argentina, Chile, Uruguai, Bolívia e Colômbia têm uma somatória de gastos privados menor do que a pública. Mas cada um tem seu jeito de gerir planos de saúde. 

Na Argentina, sindicatos de trabalhadores cobram uma taxa mensal de empregados e a repassam aos planos. A população pode ainda pagar diretamente a grupos privados, e os mais carentes têm acesso a serviços básicos. 

Na Colômbia, uma reforma no início dos anos 2000 tornou o país o único da América Latina com sistema universal baseado no seguro privado, onde o governo paga empresas para atenderem os mais pobres.

No Chile, o sistema de saúde já foi universal, mas passou a ser privado no governo Pinochet (1973-1990). 

Segundo a pesquisadora argentina Maria José Luzuriaga, da Universidade Nacional de Lanús, desde 1981 os chilenos precisam optar pelo pagamento de um seguro público ou de planos privados para receber atendimento clínico/hospitalar. 

O não acesso dos mais pobres e o alto custo de outros sistemas que também foram privatizados no país, como o da previdência, foram os principais motivos de manifestações recentes da população contra o governo

“A lógica empresarial tem prejudicado os chilenos. O setor privado tem direito a não aceitar possíveis clientes por doenças crônicas, e houve casos de não cobertura do pacote de serviços oferecidos. As pessoas estão endividadas”, diz Maria, autora do livro “Privados de la Salud”, que explica modelos de gestão em saúde na Argentina, Brasil, Chile e Colômbia. 

Para o médico Josier Marques Vilar, presidente do Fórum Inovação Saúde, não é possível terceirizar toda a assistência ao mercado, que não regula as questões sociais. 

O governo precisa desenvolver modelos que levem o setor privado a uma atuação ética. Outra alternativa apresentada por ele para evitar prejuízos é investir em tecnologias que integrem dados sobre a saúde da população dos sistemas público e privado. Com uma gestão integral da saúde, seria possível prevenir doenças e custos progressivos que oneram os governos. 

“Quando você muda de plano, seu histórico se perde e começa uma investigação toda do zero. Ao integrarmos, evita-se o desperdício”, explica Vilar.

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