Proposta de mudança na legislação de plano de saúde recebe críticas em debate

Operadoras defendem venda de planos mais acessíveis; especialistas apontam risco de retrocesso e judicialização

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São Paulo

A criação de novas modalidades de planos de saúde, com coberturas menores que as atuais, é a proposta apresentada pelas operadoras de saúde que mais vem despertando críticas.

Na avaliação de agentes do mercado, os chamados planos segmentados podem implicar retrocessos dos direitos conquistados pelos consumidores e aumento de ações judiciais. O tema foi debatido na mesa de abertura do 3º Seminário Saúde Suplementar, realizado pela Folha na terça-feira (26) em São Paulo.

Vera Valente, diretora-executiva da FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar), defendeu que as propostas de mudança na lei visam ampliar o acesso à saúde no país e desafogar o SUS.

Paulo Roberto de Oliveira Webster (esq.), diretor de Regulação, Monitoramento e Serviços da Unimed, Paulo Furquim de Azevedo, coordenador do Centro de Estudos em Negócios do Insper, Vera Valente, diretora-executiva da FenaSaúde, Alessandro Acayaba, presidente da Anab (Associação Nacional das Administradoras de Benefícios), e Marcos Pimenta, assessor da presidência da APM (Associação Paulista de Medicina) e presidente da Rede Mário Gatti, em Campinas (SP)
Paulo Roberto de Oliveira Webster (esq.), diretor de Regulação, Monitoramento e Serviços da Unimed, Paulo Furquim de Azevedo, coordenador do Centro de Estudos em Negócios do Insper, Vera Valente, diretora-executiva da FenaSaúde, Alessandro Acayaba, presidente da Anab (Associação Nacional das Administradoras de Benefícios), e Marcos Pimenta, assessor da presidência da APM (Associação Paulista de Medicina) e presidente da Rede Mário Gatti, em Campinas (SP) - Reinaldo Canato/Folhapress

Segundo ela, mudanças na estrutura etária da população brasileira e no perfil epidemiológico, além da rápida incorporação de novas tecnologias na medicina, causaram aumento exponencial dos custos do setor desde a aprovação do marco legal da saúde suplementar, em 1998.

Valente afirmou que o princípio de segmentação já está presente na lei vigente e que a proposta da associação é dar mais liberdade de escolha a quem não tem acesso hoje aos planos de saúde.

Atualmente, a lei permite vender cinco tipos de plano: ambulatorial, hospitalar com ou sem obstetrícia, referência e cobertura odontológica. Para cada um deles, empresas de saúde são obrigadas a oferecer uma lista de procedimentos obrigatórios, definida pela ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar).

"A nossa proposta não muda nada para quem já tem plano. É para quem hoje não está no sistema e tem que pagar consulta individual ou ficar na fila do SUS", afirmou.

Alessandro Acayaba, presidente da Anab (Associação Nacional das Administradoras de Benefícios), discorda da proposta da FenaSaúde. Para ele, o plano acentuará a sensação de consumidores de que a legislação não os protege.

Pesquisa Datafolha, feita com patrocínio da Qualicorp neste mês com moradores da cidade de São Paulo que têm plano de saúde, mostra que 68% consideram que a legislação atual beneficia mais as empresas que os usuários. A avaliação negativa sobre as normas do setor é maior entre pessoas com maior escolaridade e renda familiar.

"Entendo que deva ser feita uma atualização na legislação, mas o consumidor não pode ser penalizado com a retirada de direitos e garantias", afirmou Acayaba.

Para Paulo Furquim de Azevedo, coordenador do Centro de Estudos em Negócios do Insper, a diversificação das modalidades de contratos é uma solução com fundamentos sólidos do ponto de vista teórico, mas, na prática, a proposta enfrentará barreiras nos tribunais.

"A tendência do Judiciário será interpretar que o grau de cobertura deve ser igual para todos. A gente vai abrir uma judicialização muito grande no caso desse tipo de diferenciação contratual", prevê.

Para ele, contratos com franquias e coparticipação dos usuários são mais bem aceitos pela Justiça e podem ser um caminho alternativo de diversificação dos planos de saúde.

Marcos Pimenta, assessor da presidência da APM (Associação Paulista de Medicina) e presidente da Rede Mário Gatti, em Campinas (SP), afirmou se preocupar com a falta de conhecimento técnico do leigo para escolher planos em um cenário de aumento das modalidades ofertadas. 

"O rol de procedimentos de cobertura obrigatória é um avanço que deve ser preservado para que todos os usuários possam saber o que estão contratando. A classe médica trabalha com o princípio de cobertura universal", disse.

Cerca de 30 organizações médicas, jurídicas e de defesa do consumidor, como o Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) e o CFM (Conselho Federal de Medicina), lançaram em outubro um manifesto contrário às propostas das operadoras de saúde. 

Os palestrantes concordaram que há espaço considerável para otimizar a gestão dos planos sem mudanças na legislação e defenderam o fortalecimento da atenção primária, com o acompanhamento de médicos de família, por exemplo. "A solução para alguns problemas esbarra em ações de gestão. A atenção integral não depende de legislação. Há uma cultura que dificulta a passagem para outro modelo", disse Paulo Roberto de Oliveira Webster, diretor de Regulação, Monitoramento e Serviços da Unimed.

A revisão do modelo atual de remuneração de prestadores de serviços, que privilegia o pagamento por procedimento realizado, foi defendida no debate, mediado pela repórter especial e colunista da Folha Cláudia Collucci.

O seminário teve patrocínio da Qualicorp e da Unimed, e apoio da Anab e da FenaSaúde.

Plano de saúde é, depois da casa própria, o bem mais valorizado

De acordo com pesquisa do Instituto Datafolha realizada neste ano, 25% dos brasileiros consideram que planos de saúde são o bem mais importante em suas vidas. O item só fica atrás da casa própria, opção lembrada por 50% da população como o elemento mais valorizado. Em seguida, aparecem no levantamento ensino superior, com 17%, e viagens, com 7%.

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