Crise tornou mais forte elo entre academia e a sociedade

Universidade deve aproveitar abertura criada durante a pandemia, dizem especialistas

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São Paulo

Em decorrência da crise sanitária, a universidade abriu uma importante via de contato com a população, conduzindo pesquisas com resultados importantes no combate à Covid-19, que deve ser aproveitada.

A maior proximidade com a sociedade foi apontada por especialistas como um importante caminho para o ensino superior manter-se relevante. A constatação foi uma das conclusões da 2ª edição do seminário Universidade do Futuro, promovido pela Folha na segunda (4) e terça-feira (5), com o patrocínio da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).

Repórter da folha, Erica Fraga, aparece sentada em uma cadeira no Auditório Folha. Ao lado, uma tela mostra a participação online de três convidados do debate
Seminário Universidade do Futuro, com patrocínio da PUC-SP, aconteceu no Auditório Folha, na Redação, na tarde de segunda-feira. Evento ao vivo debateu desafios do ensino superior antes e durante a pandemia. Mediadora: Érica Fraga (repórter especial da Folha) - Mathilde Missioneiro/Folhapres

“O grande desafio da universidade é continuar se comunicando com a população e transformar o conhecimento que produz em benefícios para quem está na ponta”, afirma o epidemiologista Pedro Hallal, professor na Universidade Federal de Pelotas, e colunista da Folha.

Renato Janine, ex-ministro da Educação e atual presidente da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), considera que existe uma distância “relativa” entre academia e população em geral. “Quando você tem uma sociedade que é pouco conhecedora da ciência, torna-se necessário agir. Admiro muito o que a medicina faz. Drauzio Varella, por exemplo, há décadas, explica de maneira muito acessível coisas básicas da área.”

Na tecnologia, acontece a mesma coisa, diz Silvana Bahia, coordenadora da PretaLab, iniciativa de estímulo às mulheres negras na tecnologia. “É necessário discutir como aproximar a linguagem técnica do leigo porque ele sente os efeitos da transformação digital que vivemos. Como a gente explica o que é algoritmo e como ele funciona?”

A reitora da PUC-SP, Maria Amália Pie Abib Andery, afirma que o compromisso que a universidade tem com o ensino deve chegar até a educação básica, com a produção de tecnologias que possam enriquecer as práticas do ensino fundamental e médio. “O produto da ciência é a solução de problemas e o desenvolvimento de tecnologias para toda a sociedade”, afirma.

Diversidade na graduação melhora qualidade de ensino

A diversidade é elemento fundamental nesse debate. Programas de acesso ao ensino superior, como a Lei de Cotas e o Prouni (Programa Universidade para Todos), garantem mais pluralidade na graduação, o que impacta positivamente a qualidade do ensino, diz o sociólogo Giorgio Romano Schutte, professor da Universidade Federal do ABC (UFABC).

Segundo o Censo da Educação Superior do Inep, o Brasil tinha 3,5 milhões de estudantes de graduação no último ano do governo Fernando Henrique Cardoso (2002).

O número —que inclui estudantes de universidades federais, estaduais, municipais e particulares— saltou para 8 milhões em 2015, no governo Dilma Rousseff.

Em 2022, a lei de cotas passará por revisão. Em sua primeira versão, o Executivo era o responsável por rever os critérios das cotas, mas em 2017, o então presidente Michel Temer tirou a responsabilidade do Planalto e deixou em aberto quem teria a função de avaliar a lei.

Para o ex-ministro Renato Janine Ribeiro, “a determinação legal de uma revisão no ano que vem não quer dizer que a lei perca sua validade caso não seja revista”. “Ela está no ordenamento jurídico nacional, mas temos que ficar atentos com o atual governo [Bolsonaro]”, diz.


Veja, abaixo, a transmissão do seminário


Além de garantir o acesso à universidade, é preciso levar essa diversidade para o corpo docente e para o conteúdo, complementa Silvana Bahia, da PretaLab. “Sou a primeira pessoa da minha família a frequentar a universidade pública, mas essa é a história de mulheres da minha geração.”

Para Schutte, da UFABC, o Brasil abriu as portas da universidade, mas não garantiu que essas pessoas consigam permanecer.

Angela Machado Rocha, professora do Instituto de Ciência e Saúde da Universidade Federal da Bahia, defende uma revisão das políticas de financiamento. “Pesquisa não se faz com redução de investimento”, afirma a engenheira.

As universidades públicas concentram grande parte parte da produção científica. De acordo com a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), agência ligada ao Ministério da Educação, em 2019, 81% dos 4.570 programas de pós-graduação oferecidos no país eram de universidades públicas.

Ao longo do governo Jair Bolsonaro (sem partido), as universidades têm sofrido cortes no orçamento.
Em 2020, o orçamento discricionário das universidades, verba que inclui serviços de manutenção e assistência estudantil, foi de R$ 5,54 bilhões, o que representa uma redução de 8,64% em relação a 2019.

O ano de 2021 teve uma nova redução na proposta de orçamento, que foi para R$ 4,36 bilhões. Os dados foram divulgados pela Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior), com base no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) 2021, apresentado ao Congresso Nacional.

“A universidade é uma força disruptiva, é por isso que ela incomoda, que ela é barulhenta”, afirma Andery, reitora da PUC-SP.

O evento foi mediado por Erica Fraga, repórter especial da Folha. O conteúdo completo está disponível em: folha.com/universidadedofuturo

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