Escola do RS atenua onda de violência com incentivo ao diálogo entre alunos

Instituição no município de Lajeado realiza círculos de paz há sete anos para solucionar conflitos

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Lajeado (RS)

Em 2016, uma briga entre alunos na Escola Estadual de Ensino Fundamental São João Bosco, em Lajeado (RS), envolveu a Polícia Militar e levou à decisão que mudou o rumo da instituição e da comunidade de Conservas.

O bairro, um dos mais vulneráveis da cidade, era palco da disputa entre organizações criminosas e a grande maioria dos estudantes conhecia alguém ou tinha algum familiar que havia sido morto por conflitos do tráfico de drogas.

"A tensão do bairro refletia na escola. A indisciplina era muito alta, passaram cinco professores de português até a última ficar", diz o diretor, Jeferson Eduardo dos Santos.

Quatro alunos estão com as mãos dadas em um círculo
Alunos da Escola Estadual São João Bosco, em Lajeado (RS), participam de círculos de construção de paz - Alencar da Rosa/Folhapress

A chamada justiça restaurativa —processo que reúne ofensores e vítimas numa roda de escuta mútua— e os círculos de construção de paz, cuja base é o diálogo, foram as soluções contra a violência.

A ex-diretora Loiva Crestani foi uma das responsáveis por implementar o projeto. Ela recorda o momento em que, ao verificar os pertences de um aluno do turno integral, encontrou cápsulas de balas no travesseiro levado para o horário de descanso. Depois, a criança contou que o pai havia sido assassinado em casa.

Após uma sequência de episódios, Crestani passou a dialogar com o Poder Judiciário e com o Ministério Público, até que foi convidada a participar de um círculo. Formou-se facilitadora de círculos de paz e levou a prática para a escola.

Luís Antônio de Abreu Johnson, juiz-corregedor e coordenador da Infância e Juventude do TJ-RS (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul), dirigia o Fórum de Lajeado e afirma que a escola era um desafio na comarca. "Só havia aula quando a Polícia Militar dispunha de efetivo porque, do contrário, os professores não iam até o local."

A capacitação de docentes, pais e alunos em círculos de construção de paz foi um embrião para o Pacto Lajeado pela Paz, política de pacificação para escolas municipais e estaduais da cidade, conta ele.

Hoje, as turmas da São João Bosco participam de um pequeno círculo às segundas-feiras e de encontros mais longos durante a semana. Além disso, os alunos buscam escuta atenta na secretaria ou na diretoria quando necessário.

O promotor de Justiça Sérgio Diefenbach acompanha os resultados. "A pacificação é um processo contínuo. O conflito e o sofrimento existem, pois é um ambiente de sofrimento social. A questão é como estão lidando com isso."

O processo também depende do engajamento dos professores e, para que isso ocorra, é preciso protegê-los e acolhê-los, completa Diefenbach.

Em 2019, a escritora norte-americana Kay Pranis, referência em justiça restaurativa, esteve na São João Bosco.

"A diretora Loiva conseguiu engajar membros da comunidade, mesmo envolvidos em violência, na manutenção da escola como refúgio para as crianças, e deu apoio ao cultivo de relacionamentos respeitosos dentro da escola, apesar dos desafios sociais", diz.

Crestani se aposentou, mas ainda facilita círculos de paz em Lajeado. Hoje, 25 escolas municipais de ensino infantil e 18 de ensino fundamental adotaram a prática, além de escolas estaduais e privadas.

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