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Descrição de chapéu Fies Enem

Urge estabelecer processos de escuta permanente de estudantes e professores

Com o fim da consulta pública sobre o Novo Ensino Médio, a sociedade espera um compromisso democrático com uma escola que faça sentido para seus atores

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Andrea Margit

Jornalista e líder de comunicação e novos paradigmas da Ashoka

Helena Singer

Socióloga e líder da estratégia de juventude da Ashoka

São Paulo (SP)

Foi encerrada no início de julho a consulta pública promovida pelo Ministério da Educação (MEC) acerca da reestruturação da Política Nacional de Ensino Médio. Foram recebidas 150 mil contribuições de entidades do setor educacional, acadêmicos, técnicos, gestores escolares, professores e estudantes. Nas próximas semanas, a Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino deve apresentar um relatório final contendo a análise das propostas. Esse deve ser o ponto de partida e não o fim da história.

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SÃO PAULO, SP, 15.03.2023 - Estudantes protestam contra o novo ensino médio na avenida Paulista, em São Paulo. (Foto: Bruno Santos/Folhapress) - Folhapress

A educação é a nossa ferramenta mais poderosa de combate às desigualdades. Por isso, o processo de escuta de toda a comunidade escolar, principalmente, dos estudantes, precisa ser contínuo. É hora de virar o jogo.

Historicamente, as escolas brasileiras têm sido meras receptoras das políticas definidas em gabinetes, o que vai no sentido contrário do que a sociedade deseja: escolas capazes de promover inclusão e justiça social, com autonomia para construir currículos orientados à diversidade cultural e ambiental do Brasil, preparando indivíduos para um mundo cada vez mais incerto. Uma escola que contribui para o coletivo e o bem-estar de todos.

Por todo o Brasil, há escolas que inovam nesse sentido, com autonomia pedagógica. A Escola Estadual de Educação Profissional Alan Pinho Tabosa, localizada em Pentecoste (CE), é uma delas. Voltada à educação profissional integrada ao Ensino Médio, a escola cria células cooperativas de aprendizagem, onde compartilhar o que se aprende e retribuir o que se recebe são atitudes orgânicas. Por exemplo, a pessoa que tem a oportunidade de participar de um evento, uma viagem, uma pesquisa ou um empreendimento assume o compromisso ético de voltar à escola e oferecer os resultados dessa aprendizagem ao outro.

A vivência desses princípios tem transformado o perfil da juventude da região. O diretor da escola, Elton Luz, conta que na década de 1980, antes dessa abordagem pedagógica, os jovens migravam para as periferias de Fortaleza à procura de trabalho, e acabavam no subemprego. Hoje, eles estão ampliando a visão e retornando às suas cidades para melhorá-las.

O Campus São Roque do Instituto Federal de São Paulo (IFSP) também operou uma mudança curricular disruptiva quando professores e gestores perceberam problemas estruturais do ensino médio. A escola redesenhou a metodologia de ensino, dando mais autonomia e protagonismo aos estudantes e professores. Os estudantes propõem atividades, liderando festivais de teatro, de dança, clube do livro. E, em paralelo, os professores e técnicos propõem projetos de ensino, pesquisa e extensão que se integram.

Estudante do 3° ano do Técnico em Meio Ambiente na instituição, Fernanda Furquim, conta que "os projetos são sempre muito voltados à comunidade e os alunos colocam a mão na massa para realizar a pesquisa".

Outras possibilidades de reformar a educação são ainda mais abundantes no ensino fundamental e infantil, como na Escola Pluricultural Odé Kayodê localizada na cidade histórica de Goiás (GO). Nesse lugar que é símbolo dos conflitos territoriais entre indígenas, portugueses, e africanos, o círculo é uma experiência cotidiana.

Eles acontecem tanto nas aulas realizadas em espaços diversos, quanto na roda do bom dia, onde todos os estudantes se encontram e falam sobre como foi o dia anterior e o que aprenderam de novo. A escola literalmente transformou um depósito de lixo, que ocupava o local até 1990, em um espaço de difusão de culturas, valorizando os povos originários e marginalizados.

A concepção de educação que prevalece na Odé Kayodê é a de que a aprendizagem se dá pelo encantamento com a vida, a cultura, o território, com a valorização da ancestralidade.

O professor Fernando Cássio Serafim explica que a escola não considera o conhecimento como algo dado com a finalidade de se fazer uma prova que avalia a sua aquisição. Pelo contrário, o conhecimento é uma busca constante, de construção do mundo e de nós mesmos.

A Alan Pinho Tabosa, o IFSP, a Odé Kayodê e outras centenas de escolas no Brasil atuam como laboratórios de inovação e integram um programa global, chamado Escolas2030. Por meio dessa iniciativa, elas desenvolvem novos parâmetros de avaliação da aprendizagem com base na educação integral e na participação ativa da comunidade escolar.

O relatório do MEC deve marcar uma ruptura com um modo de fazer política que pressupõe que a população não está preparada para opinar e, então, dita como as escolas devem se organizar.

Ao se buscar inovação na educação, é crucial olhar para as experiências que já existem, pois muitas das respostas estão nelas. A construção de novas políticas educacionais deve ser feita em colaboração. A escola deve ser esse lugar onde se aprende a participar, tomar decisões, responsabilizar-se por elas, pensando no bem comum e no país. Este Governo, em particular, deve ter atenção especial a isso.

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