Cidade abriga clubes de strip e 'Vaticano' dos ortodoxos gregos
De um lado da rua, mulheres de burca. Do outro, o lugar mais sagrado para os cristãos ortodoxos gregos, onde mora seu líder espiritual. No meio-fio da calçada, uma biboca onde é vendida a "köfte" (cafta) mais famosa da cidade.
Isso é Fener, bairro conservador a menos de 15 minutos de táxi de Sultanahmet, epicentro turístico de Istambul, mas distante do roteiro (turístico e noveleiro) da autora Gloria Perez.
É irônica a ausência da igreja de São Jorge na novela. É lá que Bartolomeu 1º, patriarca dos cristãos ortodoxos gregos, que se reuniu com o papa Francisco no mês passado, realiza missas aos domingos. Durante o resto da semana, o templo, com suas paredes de mosaicos de ouro, é aberto ao público.
A igreja fica num complexo de nove prédios, considerado o lugar mais importante para essa vertente da fé ortodoxa, maioria na Grécia, mas cerca de 1% na Turquia. "Nossa religião considera esta cidade nosso local sagrado. Nunca sairemos daqui", disse Bartolomeu 1º à Folha no ano passado.
Enquanto isso, andando em frente ao "Vaticano" dos ortodoxos, é possível ver quem realmente ocupa hoje o bairro. Famílias com mulheres de cabeça coberta e pais levando terços muçulmanos aonde quer que vão.
Andando alguns quarteirões pela mesma rua, a Mürselpasa Caddesi, está o Arnavut, restaurante que venceu o concurso de melhor "köfte" do site Istanbul Eats.
As almôndegas temperadas e feitas na chapa vêm quase cruas e pedem acompanhamento de "ayran", bebida salgada de iogurte, até porque é difícil achar álcool à venda no bairro religioso.
MADEIRA E FERRO
Depois de ver no roteiro básico mesquitas como a Azul, vale a pena visitar a igreja Santo Estevão dos Búlgaros, conhecida como o templo de ferro. O apelido faz jus: não há tijolo nem pedaço de madeira na nave, toda de metal, fundida em Viena e trazida desmontada em cem barcas para Istambul em 1871.
O resto do bairro não tem nada de ferro. A arquitetura dos sobrados, de madeira, é considerada patrimônio da humanidade. Muitos dos casarões de madeira foram restaurados pela Unesco.
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A escola Phanar, cujo prédio vermelho lembra Hogwarts, de Harry Potter, não teve tanta sorte. O colégio grego, fundado em 1454, tem hoje poucos alunos no enorme castelo, considerado o quinto maior da Europa pela comunidade local. Vale deixar para o fim da visita, por motivo de melancolia.
O PECADO MORA AO LADO
Se o profano atrai mais que o sagrado, Tarlabasi é seu lugar. Do outro lado do Chifre de Ouro, a quarteirões de distância de Istiklal, via restrita a pedestres, o bairro esconde inferninhos e uma vida noturna nada "halal" (pura).
As ladeiras de cortiços, construídos por gregos e curdos depois do terremoto de 1894, têm no térreo boates de "má fama", onde mulheres fazem striptease. Há bons clubes de música eletrônica, como o Privé (Tarlabasi Bulvari, 28). Mas entrar é difícil: porteiros impedem a entrada de homens desacompanhados e uma viela ou outra é fechada por carros da polícia.
Seria lá o cenário mais provável para a boate onde terminam as brasileiras traficadas da novela, ainda que a maioria das trabalhadoras venha da Europa Oriental.
Mas, parecido com o que acontece com a rua Augusta, em São Paulo, o bairro passa por um processo de tombamento -no sentido demolidor do termo. Casarões vêm abaixo para modernos prédios subirem. Corra para ver, antes que não haja mais na cidade lugar para ambientar a protagonista Morena.
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