É editora de 'Mundo' e foi correspondente em Nova York, Genebra e Washington. Escreve às sextas sobre séries de TV.
'Stranger Things' acerta com nostalgia e Winona Ryder, mas falta surpresa
Nostalgia parece ser a nova aposta do Netflix, hoje bem estabelecida como produtora e distribuidora multiplataformas de conteúdo em vídeo graças a sua ousadia em apostar em um modelo novo de televisão e em enredos audaciosos como os de "House of Cards" e "Orange Is the New Black".
É como se, após tanta inovação, o espectador precisasse descansar, trocando o provocativo e instigante pelo conforto do que lhe é familiar.
Há dois jeitos de fazer isso.
Divulgação | ||
A atriz Winona Ryder é uma das protagonistas de "Stranger Things", da Netflix |
O primeiro, mais óbvio, é ressuscitando séries queridas —"Arrested Development", "Full House" ("Fuller House", na nova versão) e, em breve, "Gilmore Girls", todos revividos pelo serviço on-line com variados graus de sucesso.
O outro é recriar a atmosfera de outra década em uma série original.
É esse o coração de "Stranger Things", uma série em oito episódios que mistura elementos centrais dos filmes dos anos 80 (o terror de apelo sobrenatural e o drama sobre o fim da infância e a chegada da adolescência) e resgata do imaginário de quem cresceu naquela década ou no início da seguinte dois nomes que andavam meio perdidos: Winona Ryder e Matthew Modine.
A série, que estreia nesta sexta (15) já com todos os episódios disponíveis, explora os fenômenos sobrenaturais que envolvem o desaparecimento do garoto Will Bayers em uma cidadezinha de Indiana, Estado do miolo dos EUA, em 1983.
O sumiço de Will vai repercutir tanto em sua família —na mãe, Joyce (Ryder) e no irmão, Jonathan (Charlie Heaton)— quanto em seus amigos próximos, ansiosos por uma boa aventura.
Não só a reconstituição de época em cena é fiel como o modo de conduzir a história, que alterna situações "Goonies" (1985) a momentos "Poltergeist" (1982), emula um tipo específico de narrativa e estética que parece já não ter lugar entre produções sofisticadas e pretensiosas que competem semanalmente pela atenção do espectador e pelo título de melhor coisa na TV (ou on-line).
Essa ingenuidade é bem-vinda, mas por si só não consegue segurar a produção. Após um encantamento inicial, a história parece conhecida e previsível, como visitar um lugar querido da infância e descobrir que, na verdade, ele é bem menor e desenxabido do que aquilo que a memória guardava.
O que a princípio parece acanhamento se revela uma tremenda ambição, inatingível para os criadores da série, que imodestamente assinam como "irmãos Duffer" -Matt e Ross- embora seu currículo se resuma a alguns curtas e o roteiro da decepcionante "Wayward Pines" (há muito em comum entre as duas, talvez demais). Nada que remeta a Coens, Dardennes, Wachowskis e nem mesmo Wayans.
Winona Ryder está bem, Matthew Modine também, e o numeroso elenco infantil merece aplausos. Talvez as crianças de hoje, porém, já não se entretenham com esse tipo de história, e os adultos mereçam mais.
*'Stranger Things*' estará disponível na Netflix dia 15
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